O Comando do Policiamento Metropolitano (CPM) da Brigada Militar (BM) instaurou inquérito para apurar se houve a participação de PMs na agressão a dois homens que teriam furtado pacotes de picanha de um supermercado de Canoas em outubro deste ano. A informação é uma possibilidade, mas mesmo assim, a corporação decidiu apurar os fatos para que todo o processo seja transparente.
Já a Polícia Civil da cidade está divulgando imagens e pede para quem tiver alguma informação sobre três suspeitos ainda não identificados entre em contato (veja o telefone divulgado abaixo). A Delegacia de Homicídios não tem prazo para concluir o inquérito, mas informa que já ouviu as duas vítimas e quatro suspeitos: gerente, subgerente do estabelecimento e mais dois seguranças que atuam para uma empresa.
A suspeita é de que algum policial militar estivesse fazendo o chamado "bico" — serviço paralelo. Se confirmado, poderiam ser os três que ainda não foram reconhecidos nas imagens. Os crimes apurados são tortura com finalidade de obtenção de informações e para aplicar castigo pessoal, omissão e ocultação de provas, além de danos — porque quebraram celulares das vítimas — e possível extorsão — já que teriam exigido dinheiro para liberar os dois homens agredidos.
O caso aconteceu no dia 12 de outubro no supermercado Unisuper. Dois homens, um deles negro, conforme imagens, pegaram dois pacotes de picanha, que custam R$ 100 cada, e foram abordados por seguranças.
Eles foram encaminhados para o depósito, onde passaram a ser agredidos e torturados, também conforme vídeo divulgado pela polícia. Eles foram espancados por cerca de 45 minutos, e o fato só foi descoberto porque um dos homens que sofreu as agressões foi encaminhado para o Hospital de Pronto Socorro (HPS) com ferimentos graves e precisou ser colocado em coma induzido. O crime de omissão é refente a esse fato.
Investigação militar
O CPM destaca que o inquérito militar foi instaurado no último sábado (3), após a BM acionar a Polícia Civil sobre a possibilidade de ter algum PM — que poderia estar atuando como segurança particular — envolvido. As primeiras medidas foram tomadas nesta segunda-feira (5) e, como o supermercado é de Canoas, o comando local informou que nenhum dos homens que aparecem no vídeo é do 15º Batalhão, que atua na cidade.
Mesmo assim, o objetivo é analisar mais imagens, acionar as vítimas e a empresa de segurança para depoimentos. No caso dos homens espancados, a ideia é saber se confirmam que um dos seguranças falava em códigos, o que é um procedimento típico de policiais, por exemplo, ao enumerar tipos de ocorrências. Outro objetivo é saber da empresa de segurança se houve a contratação de algum PM.
Por fim, a corporação ainda informa que vai apurar se algum policial fez uma checagem dos antecedentes criminais dos dois homens agredidos no dia do fato, apesar de não ter sido gerado, na época, um boletim de ocorrência. O CPM deixa claro, assim como a Polícia Civil, que o envolvimento de PMs ainda é uma possibilidade, mas, para garantir toda a transparência do processo, um inquérito vai apurar se algum brigadiano de outra cidade da Região Metropolitana atuava como segurança do Unisuper.
Investigação da Polícia Civil
Com o inquérito instaurado, uma equipe da Delegacia de Homicídios de Canoas foi atrás de imagens, mas só conseguiu analisar o material depois que peritos recuperaram o conteúdo que havia sido apagado. Segundo o delegado Robertho Peternelli, o delito de ocultação de provas se refere a este fato. Desta forma, Peternelli já ouviu dois funcionários do Unisuper, o gerente e o subgerente, e mais dois seguranças contratados pela empresa Glock. Outros três seguranças ainda não foram identificados.
Ao final, além de todas as ameaças recebidas, foi-lhes informado que se não pagassem um determinado valor, seriam mortos. Ao receber esta notícia, e verificar que não possuía saldo, uma das vítimas pediu que seu filho lhe mandasse algum dinheiro. Apenas após o pagamento do "resgate" é que foram liberados.
ROBERTHO PETERNELLI
Delegado da Polícia Civil
Além disso, a Delegacia de Homicídios apura danos e possível extorsão. Para o delegado, o fato de colocarem os dois homens no depósito e a suspeita de que eles só foram liberados depois que um parente de um deles enviou dinheiro pode configurar que foram extorquidos mediante sequestro.
— Ao final, além de todas as ameaças recebidas, foi-lhes informado que se não pagassem um determinado valor, seriam mortos. Ao receber esta notícia, e verificar que não possuía saldo, uma das vítimas pediu que seu filho lhe mandasse algum dinheiro. Apenas após o pagamento do "resgate" é que foram liberados — diz Peternelli.
O valor pago seria de R$ 644. O delegado diz que não está divulgando os nomes dos quatro suspeitos identificados e reforça que não é conivente com o furto da carne, mas que o procedimento certo seria acionar a polícia para que todos os protocolos fossem adotados. Os dois homens que foram agredidos não quiseram falar. Segundo a polícia, eles estão muito assustados com o que aconteceu.
Para denunciar
- Qualquer informação sobre os três seguranças que ainda não foram identificados podem ser feitas pelo site da Polícia Civil ou pelo telefone 0800-642-0121.
Contraponto
A rede Unisuper publicou uma nova nota na madrugada desta segunda-feira (5) alegando que demitiu os funcionários e encerrou o contrato com a empresa de segurança:
"Viemos a público nos desculpar pelos fatos ocorridos na loja da Avenida Inconfidência, em Canoas.
Estamos profundamente abalados. As agressões são inaceitáveis e não condizem com a sólida história de 22 anos da Rede UniSuper, que sempre foi marcada pelo respeito ao ser humano, aos seus direitos fundamentais e a valores como transparência, trabalho em equipe e solidariedade.
Diante de uma conduta lamentável e cruel com a qual jamais concordaremos, informamos que encerramos o contrato com a empresa Glock Segurança, desligamos os funcionários envolvidos e iniciamos o trabalho de revisão de todos os nossos protocolos de segurança e de conduta. Não mediremos esforços para construir sólidos procedimentos que garantam que situações como essa jamais voltem a acontecer.
Reafirmamos o nosso compromisso com o respeito à vida e à dignidade da pessoa humana, e nos colocamos, mais uma vez, integralmente à disposição das autoridades".
O que dizem os advogados Ezequiel Vetoretti, Rodrigo Grecellé Vares e Eduardo Vetoretti, responsáveis pela defesa de Jairo Estevan da Veiga e Adriano Luginski Dias
"Na condição de advogados de Jairo Estevan da Veiga e Adriano Luginski Dias, manifestamos o nosso respeito a todas as pessoas e instituições que atuam no presente caso. Por questões éticas e até mesmo em respeito à autoridade policial, nossa manifestação se dará exclusivamente nos autos."
O que diz a empresa de segurança Glock
Em nota, informou que irá se manifestar somente em juízo.