Depoimentos e resultados das perícias são as principais apostas da Polícia Civil no momento para tentar detalhar como aconteceu um crime brutal em Alvorada, na Região Metropolitana. David da Silva Lemos, 28 anos, foi preso pelo assassinato dos quatro filhos. Três meninas e um menino, com idades entre três e 11 anos, foram encontrados mortos dentro da casa dele no fim da tarde da última terça-feira (13), no bairro Piratini.
Quando ouvido informalmente na polícia, o pai disse que usou um chá para fazer os filhos dormirem, depois utilizou um travesseiro para sufocar as crianças e, por fim, ainda desferiu os golpes de faca em três deles. É essa dinâmica que a polícia precisa detalhar se é verdadeira e colher provas disso. O caso segue sendo apurado pela Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Alvorada.
A principal suspeita é de que Lemos tenha cometido o crime porque não aceitava o término do relacionamento com a mãe das crianças, de quem está separado há alguns meses. A mulher tem, inclusive, medida protetiva contra o ex.
Os corpos de Yasmin, 11, Donavan, oito, Giovanna, seis, e Kimberly, três, foram sepultados nesta quinta-feira (15) em Porto Alegre. Os familiares optaram por não conversar com a reportagem.
Confira algumas dúvidas e respostas sobre o caso:
Quando aconteceu o crime?
Com base no relato do pai aos policiais, os quatro assassinatos teriam acontecido na tarde da última segunda-feira (12). Após matar os filhos, Lemos seguiu para Porto Alegre, onde foi preso na madrugada de quarta-feira (14). O crime só foi descoberto após a mãe insistir para ter as crianças de volta e um familiar do suspeito ir até a casa e deparar com as vítimas. O laudo da perícia também deve ajudar a confirmar se o estado em que se encontravam os corpos é compatível com esse período.
Foi premeditado?
Esse é um dos pontos que ainda precisa ser esclarecido pela investigação. Foram recolhidos aparelhos celulares, que serão analisados em busca de pistas, como mensagens ou pesquisas na internet. Dois aparelhos foram recolhidos com o próprio preso, que foi localizado pela Brigada Militar na recepção de um hotel nas proximidades da rodoviária de Porto Alegre.
Um terceiro aparelho celular foi entregue à polícia pelo funcionário de um bar na Orla. O suspeito teria estado no local após o crime, consumido bebida alcoólica, e ao deixar o estabelecimento teria esquecido o telefone e os documentos no local. Esse material foi entregue à polícia. Pessoas próximas já tinham relatado à polícia que Lemos tinha postado em redes sociais fotos da Usina do Gasômetro no início da semana.
As vítimas foram realmente sedadas?
Em seu relato informal aos policiais, o preso afirmou que utilizou um chá para fazer os filhos adormecerem. Essa bebida teria sido administrada ainda durante a manhã. No entanto, segundo a polícia, não foi localizada na casa nenhum chá desse tipo. Uma possibilidade é de que tenha sido adicionado algum medicamento sedativo à bebida.
A perícia toxicológica realizada nos corpos deve apontar se alguma substância desse tipo estava presente no organismo das crianças. Ainda assim, segundo a polícia, alguns pontos coincidem com essa descrição do pai, como nenhum vizinho ter relatado ouvir gritos vindo da casa e não haver lesões de tentativa de defesa nas vítimas.
Há possibilidade de envolvimento de outra pessoa no crime?
Até o momento, nenhum indicativo de possibilidade de que outra pessoa tenha participado do crime foi obtido pela polícia. Informalmente, o homem admitiu aos policiais ter praticado o crime sozinho.
Havia histórico anterior de violência contra as crianças?
Segundo a polícia, não há nenhum registro de violência anterior do pai contra as crianças e nem houve relato por parte das pessoas ouvidas até o momento. Mas a investigação ainda precisa ouvir a mãe das crianças para confirmar essa situação.
Havia medida protetiva vigente?
Sim, a mãe das crianças tinha medida protetiva concedida pelo 2º Juizado da Violência Doméstica do Foro Central de Porto Alegre em 25 de setembro deste ano. A medida permanece válida até 25 de março de 2023. Porém, segundo a polícia, essa medida era direcionada à mãe, mas não aos filhos. Caso houvesse algum relato de risco aos filhos, por exemplo, poderia ser expedida medida que impedisse aproximação do pai.
As crianças conviviam com o pai?
Segundo o que foi apurado até o momento, após a mãe das crianças ser agredida e obter medida protetiva em setembro, por algum tempo os filhos ficaram sem visitar o pai. No entanto, o homem teria insistido com a ex para voltar a ver as crianças e em novembro ela teria permitido a reaproximação.
As visitas teriam sido retomadas recentemente e realizadas aos fins de semana. A polícia ainda precisa esclarecer esse ponto com a mãe. Na segunda-feira, horas antes do crime, vizinhos viram as crianças brincando no pátio da residência. GZH entrou em contato com o Judiciário para saber se havia guarda compartilhada legalizada, no entanto, o retorno obtido até o momento é de que processos desse teor tramitam em segredo de Justiça.
O que motivou o crime?
Quando foi ouvido no Palácio da Polícia, após ser preso, o homem disse informalmente que pretendia atingir a ex-companheira com o crime, como uma forma de vingança. A principal suspeita é de que o crime tenha sido cometido nesse contexto de não aceitação do término do relacionamento. O casal se relacionava havia 12 anos, desde a adolescência, e estava separado há pelo menos dois meses.
Quais provas foram coletadas até o momento?
A perícia esteve no local dos homicídios, uma faca, que teria sido usada no crime foi apreendida, depoimentos foram ouvidos e celulares foram apreendidos. A polícia ainda aguarda resultado de perícias nos corpos das vítimas.
Quais próximos passos da investigação?
A polícia pretende na próxima semana ouvir a mãe das crianças, que ainda não teve condições de falar sobre o caso, devido ao abalo psicológico com a perda dos quatro filhos. O depoimento dela é considerado importante para detalhar, por exemplo, se ela estava sendo ameaçada pelo ex e como era o relacionamento entre eles. Esses relatos até agora só chegaram à polícia por meio de pessoas próximas. Após essa oitiva, o suspeito deve ser interrogado novamente, embora após ser preso ela tenha optado por permanecer em silêncio, só dando relato informal sobre o caso. Lemos, que está preso de forma preventiva, pode novamente optar por ficar em silêncio.
Contraponto
Foi encaminha nota pela Defensoria Pública do Estado sobre o caso. Confira:
"A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul informa que esteve presente na audiência de custódia do acusado, realizada na manhã desta quarta-feira (14), no Núcleo de Gestão Estratégica do Sistema Prisional – NUGESP, para garantir a ampla defesa e o contraditório.
Na ocasião, foi decretada a prisão preventiva.
O homem informou que, em princípio, não constituirá advogado particular. Sendo assim, a partir de agora, a Defensoria Pública seguirá atuando na defesa dele e irá se manifestar somente nos autos do processo."