Ocorreu na tarde desta terça-feira (1º) a oitiva de Anderson da Silva Cavalheiro, 40 anos, pai do jovem Gabriel Marques Cavalheiro, 18 anos, encontrado morto após abordagem da Brigada Militar (BM) em São Gabriel, em agosto. O depoimento ocorreu em Porto Alegre. No processo, são réus os três PMs responsáveis pela ação naquele dia, que estão presos.
A fala de Anderson ocorreu na sala de julgamentos da 1ª auditoria, dentro do prédio do Tribunal de Justiça Militar, na Avenida Praia de Belas. O depoimento começou por volta das 12h e durou cerca de 2h30min. Ele estava acompanhado da advogada da família, Rejane Igisk Lopes.
Para a próxima sexta-feira (4), às 12h30min, está prevista a inquirição de mais cinco testemunhas de acusação, junto ao Salão do Júri no Foro da Comarca de São Gabriel.
Na Justiça Militar, os soldados Raul Veras Pedroso e Cléber Renato Ramos de Lima e o segundo-sargento Arleu Júnior Cardoso Jacobsen respondem por ocultação de cadáver e falsidade ideológica (em razão de informações falsas que teriam sido inseridas no boletim de ocorrência). Em outro processo, que corre na Justiça comum, eles são réus por homicídio doloso triplamente qualificado (motivo fútil, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima). Os três estão presos desde 19 de agosto por determinação da Justiça Militar.
Em nenhuma das esferas há, ainda, previsão de data para o julgamento dos PMs.
Caso terá reconstituição
A reprodução simulada do crime está marcada para o dia 8 de novembro, em São Gabriel. O trabalho do Instituto-Geral de Perícias (IGP) irá reconstituir o ocorrido na ocasião, reproduzindo as mesmas condições, com o objetivo de confrontar as versões trazidas por testemunhas do caso e verificar se elas são plausíveis com a perícia.
A reconstituição, que foi solicitada pela Polícia Civil, deve ser acompanhada pelas partes envolvidas. Por meio de nota, o Ministério Público em São Gabriel afirmou entender que "a reprodução simulada se trata de mais um instrumento que reforçará a convicção da promotoria, que já está convencida de que a prova produzida até o momento é robusta em relação à responsabilidade dos réus".
Conforme o IGP, o trabalho é complexo e minucioso, e depende do estudo de todos os depoimentos e laudos elaborados até agora, que serão confrontados com a reconstituição. O trabalho será feito por duas peritas criminais e um fotógrafo criminalístico do instituto. A equipe fará anotações e fotos ao longo do procedimento. Depois, em um laudo pericial, darão sua análise técnica sobre o material colhido. Esse documento será anexado ao processo que corre na Justiça.
Um boneco, para simular o corpo da vítima, pode ser usado durante a perícia. O IGP também deve solicitar à BM que a viatura usada pelos PMs durante a abordagem seja disponibilizada para a reconstituição. Se não for possível, deve ser usado um veículo da corporação que seja de modelo similar.
Relembre o caso
O corpo de Gabriel foi encontrado na tarde de 19 de agosto em um açude na localidade de Lava Pé, interior do município da Fronteira Oeste. O jovem de 18 anos que sonhava ser militar estava desaparecido havia uma semana, após ser abordado por uma equipe de policiais militares.
O jovem desapareceu na madrugada de 13 de agosto, quando foi visto pela última vez sendo colocado dentro de uma viatura da BM. Ele havia sido abordado pouco antes no bairro Independência. O laudo de necropsia do IGP apontou que Gabriel morreu por hemorragia interna causada por uma agressão na coluna cervical. Ele também tinha um hematoma na cabeça.
Na denúncia do Ministério Público à Justiça comum, a promotora de Justiça Lisiane Villagrande Veríssimo da Fonseca descreve que os policiais militares em serviço, durante patrulhamento ostensivo, abordaram a vítima, "que foi algemada e brutalmente agredida com golpes de cassetete na região cervical". Na sequência, conforme o órgão, os denunciados colocaram o jovem no interior da viatura e se deslocaram até a localidade de Lava Pé, local em que ocultaram o corpo de Gabriel. Essa denúncia foi feita com base no indiciamento da Polícia Civil.
Já a denúncia na Justiça Militar foi feita pelo promotor de Justiça Diego Corrêa de Barros, do MP, que tem atribuições junto a essa esfera. Segundo ele, após a morte da vítima, o trio de policiais ocultou o corpo de Gabriel, levando-o até o interior do município e escondendo-o dentro de um açude.
Além disso, para o MP, os acusados fizeram constar no boletim de ocorrência declaração falsa de que "a guarnição abordou o Sr. Gabriel, que consultado estava sem novidades, sendo então orientado e liberado", quando, na verdade, havia sido agredido, algemado, preso e posto no interior da viatura pelos denunciados, diz a acusação.