Na semana passada, houve a morte violenta de duas crianças no Rio Grande do Sul — uma de seis anos em Imbé, no Litoral Norte, e outra de um ano e 11 meses, na Lomba do Pinheiro, zona leste de Porto Alegre. Os fatos chamam a atenção da comunidade e das autoridades, mas, infelizmente, não são tão raros. Segundo dados fornecidos pela Secretaria de Segurança Pública (SSP), de 2019 até junho deste ano, uma criança foi vítima de assassinato a cada 17 dias no Rio Grande do Sul. Dos 73 homicídios dolosos, ou seja, com intenção, nos últimos três anos e meio, 33 foram de bebês — crianças com menos de dois anos de idade. Nos casos citados, os pequenos não eram alvos dos ataques de que foram vítimas, mas na maior parte dos casos, segundo a Polícia Civil, as mortes têm relação com a violência doméstica.
O ano de 2019 registrou 22 assassinatos em que as vítimas tinham menos de 12 anos de idade no Estado. Em 2020 o total diminuiu para 18 casos e no ano passado voltou a aumentar, com 21 ocorrências. No primeiro semestre de 2022 — ainda sem contar, portanto, os casos da semana passada —, foram 12 homicídios de crianças. No mesmo período de 2021 houve 14 casos.
Se for examinado o ano de 2021, por exemplo, o número de assassinatos de crianças representa 1,3% do total de 1.513 casos registrados no Rio Grande do Sul pela SSP. Nos seis primeiros meses de 2022, dos 747 assassinatos registrados no Estado, 12 tiveram crianças como vítimas — 1,6%.
Mas as autoridades da segurança destacam que a maior preocupação não é a alta dos casos envolvendo crianças em relação ao total de ocorrências de homicídio, mas sim a crueldade das situações em que a própria criança era o alvo. A diretora do Departamento de Homicídios, delegada Vanessa Pitrez, diz que a maioria dos casos investigados nestes últimos três anos e meio tem como autores do assassinato os próprios pais ou parentes próximos das vítimas. Casos como o de Imbé e da Lomba do Pinheiro, na Capital, ocorrem, mas com frequência menor. Estes dois fatos ainda são investigados, mas a apuração preliminar indica que os alvos eram adultos e as crianças acabaram sendo vítimas por engano ou simplesmente porque estavam junto às pessoas na mira de criminosos.
— A maioria é resultado de violência doméstica. A maioria está relacionada a pais, mães, madrastas e padrastos, além de parentes próximos. O que leva, por um lado, a uma rápida elucidação por parte da polícia, comprovando a autoria. Por outro lado, quando a criança não é o alvo do agressor, como ocorreu em Imbé e na Lomba do Pinheiro, na Capital, são casos mais raros, mas que a polícia igualmente reforça todo o trabalho para ter a autoria e prender os responsáveis — explica Vanessa.
O subcomandante-geral da Brigada Militar (BM), tenente-coronel Douglas Soares, ressalta que, nos casos como de Imbé e na Lomba do Pinheiro, há um trabalho para aumentar a presença das forças de segurança nos locais dos crimes, muitas vezes conflagrados pelo tráfico de drogas, mas também há a busca por dar resposta rápida, exatamente como ocorreu semana passada no Litoral Norte. O crime ocorreu no domingo e na quarta-feira as polícias deflagraram uma operação, cumprindo mandados de busca e prendendo, em flagrante, um suspeito de envolvimento.
Nos casos de violência doméstica, Soares diz que a presença do policial militar é crucial, apesar do crime ser de difícil prevenção. Segundo o militar, os casos são informados via telefone 190 e a BM é o primeiro órgão a chegar. Por isso, ele diz que o PM é treinado para apurar todos os fatos iniciais, acionar reforço se necessário, identificar testemunhas e autores, bem como chamar equipes volantes da Polícia Civil.
— É um conjunto de fatos e a Brigada Militar chega no local o mais rápido possível, tem que isolar o local e por vezes os fatos ainda estão ocorrendo, ou seja, suspeito para prender, entre outros fatos. Estamos qualificando esse profissional para ter uma dinâmica dos fatos e realizar o melhor atendimento possível do local de crime porque disso vai resultar uma boa investigação até um processo judicial com um maior número de elementos possíveis para elucidação — diz Douglas.
Dados da SSP sobre homicídios de crianças no RS
- 2019 – 22
- 2020 – 18
- 2021 – 21
- 2022 – 12 (de janeiro a junho)
Lesões corporais
O alerta das autoridades a respeito da violência doméstica contra crianças não se refere apenas a homicídios. Nos últimos três anos e meio, foram registrados 3.985 casos de lesão corporal contra menores de 12 anos no Rio Grande do Sul. De janeiro de 2019 a junho de 2022 a média foi de 94 casos por mês, ou seja, três por dia.
O ano de 2019, com 1.432 fatos, foi o que teve o maior número de registros. Houve queda em 2020, mas o indicador voltou a subir em 2021, desta vez com 1.040 delitos deste tipo contra crianças. No primeiro semestre deste ano, foram 537 registros — mantendo a média aproximada de três casos diários.
Do total de 3,9 mil lesões corporais de crianças no Estado desde 2019, em 694 as vítimas foram bebês, ou seja, com menos de dois anos de idade. A delegada Vanessa destaca que, mais uma vez, a violência doméstica está por trás da maior parte destes fatos.
Dados da SSP sobre lesões corporais de crianças no RS
- 2019 – 1.432
- 2020 – 976
- 2021 – 1.040
- 2022 – 537 (de janeiro a junho)