Os advogados dos policiais militares presos preventivamente por suspeita de participação na morte do jovem Gabriel Marques Cavalheiro, 18 anos, em São Gabriel, na Fronteira Oeste, decidiram se manifestar pela primeira vez sobre o caso. Eles sustentam que os PMs são inocentes e não têm qualquer participação na morte do jovem, cujo corpo foi encontrado dentro de um açude, na localidade de Lava Pé, na sexta-feira (19), uma semana depois de ter sido visto pela última vez sendo abordado pelos policiais e levado numa viatura.
Vânia Barreto, junto com a colega Shaianne Lourenço Linhares, defende os soldados Raul Veras Pedroso e Cléber Renato Ramos de Lima. Ela afirma que "não foram os policiais que levaram ele (Gabriel) até o açude" (leia mais sobre a entrevista abaixo).
Os advogados Ivandro Bitencourt Feijó e Mauricio Adami Custódio, que defendem o segundo-sargento Arleu Júnior Cardoso Jacobsen, se manifestaram por nota, na qual declaram: "Desde já, bradamos a total inocência do constituinte e a total indignação de sua família por ocorrer, antes de tudo e de forma sumária, o julgamento de antecipação de culpa em detrimento da cautela que deve existir nos procedimentos penais desta natureza".
"PMs estão sendo massacrados pela população"
GZH ouviu, durante 34 minutos, a advogada Vânia Barreto, que apresentou a versão de seus clientes sobre os fatos daquela sexta-feira, 12 de agosto, dia da abordagem ao jovem. Ela reclama que os PMs "estão sendo massacrados pela população, sem que tenham dado a sua versão". Também detalha o que disseram os policiais militares sobre a abordagem a Gabriel.
Conforme Vânia, os PMs admitem ter omitido, num primeiro momento, que levaram Gabriel à localidade de Lava Pé. Que no boletim de ocorrência, limitaram-se a dizer que o jovem foi abordado, revistado, teve a ficha consultada (não havia registro de ocorrências policiais) e liberado. Somente dias depois, quando instaurado o Inquérito Policial Militar (IPM), é que eles disseram que levaram o jovem até a região.
Ainda de acordo com a advogada, os três policiais estavam de serviço naquela noite, sendo que Jacobsen era o auxiliar de serviço externo, Pedroso era o motorista, e Lima era o patrulheiro. Às 23h56min, relata Vânia, os PMs estariam no patrulhamento no centro da cidade quando receberam um despacho da sala de operações. Seria a respeito da chamada de uma senhora, chamada Paula, pedindo para que uma guarnição fosse até o local, onde homem estaria tentando entrar na casa dela, sacudindo o portão.
Minutos depois, ao chegarem ao local, os PMs teriam revistado Gabriel e perguntado para Paula o que estava acontecendo. O jovem teria dito que estava querendo entrar na casa de uma prima chamada "Paula Barcelos" e de um "Tio Barcelos". Apesar da coincidência do primeiro nome, não seria a pessoa que o jovem procurava.
Agressão relatada por testemunha é negada
A testemunha disse, em entrevista a GZH, que um dos PMs agrediu Gabriel com um tapa — o que eles negam, segundo a advogada. Conforme Vânia, os policiais teriam perguntado para a moradora da residência se ela gostaria de registrar ocorrência por perturbação de sossego alheio. Foi, então que Paula teria dito que não gostaria de registrar, porque estava aguardando uma amiga para sair, e que gostaria apenas que o jovem fosse retirado dali, já que uma criança e uma adolescente ficariam na residência sozinhas.
Na versão da defesa, o sargento teria orientado Paula a colocar um cadeado no portão, o que teria sido providenciado pela moradora, e dito a ela que os PMs levariam Gabriel para outro local. Conforme os PMs, segundo a advogada, Gabriel aparentava ter ingerido bebida alcoólica e estaria um pouco alterado. Por esse motivo, algemaram o jovem e o colocaram na viatura. Teriam perguntado onde ele gostaria de ser deixado e onde estava morando. O jovem teria respondido que morava em Guaíba e que estava parando na casa de um tio em São Gabriel, mas que, naquele momento, estaria procurando a casa de uma prima que seria moradora da localidade de Lava Pé. Foi então que Gabriel teria dito que gostaria de ser deixado nessa região.
— Eles deslocaram para a localidade de Lava Pé. Logo depois que passaram um colégio municipal que tem ali, entraram numa estradinha de chão. Eles pararam a viatura, tiraram o rapaz da viatura, tiraram as algemas, liberaram ele, fizeram o retorno e voltaram — sustenta a advogada.
Conforme Vânia, há imagens de câmeras de segurança de um colégio juntadas ao IPM que comprovariam que os PMs foram até essa estrada de chão e, logo em seguida, cerca de 1min50seg depois, teriam voltado e passado de novo na frente da escola. Ainda de acordo com a advogada, eles seguiram no policiamento até uma hora da madrugada, quando voltaram para o quartel, porque o soldado Lima estaria entrando de folga.
— Tem imagens de câmeras do quartel deles chegando tranquilos, conversando. Não tem farda molhada, não tem farda suja. A gente percebe que não tem coturno embarrado. Nada, eles estão tranquilos — diz a advogada sobre a imagem.
A advogada também ressalta que Lima teria ido para casa por estar de folga. Jacobsen teria continuado no patrulhamento, só trocando de motorista. E Pedroso teria continuado o serviço em outra viatura:
— O que tem de comprovação disso? Tem o GPS da viatura, todo o trajeto que eles fizeram está registrado no GPS da viatura. Tem o GPS do celular do sargento. Eles, inclusive, entregaram espontaneamente (os celulares) na sexta-feira (19) à noite, quando estávamos acompanhando eles, quando foi cumprido o mandado de prisão. Eles entregaram espontaneamente os três celulares, inclusive com as senhas para facilitar o acesso.
Vânia sustenta que o maior interesse dos PMs é que se descubra o que aconteceu com Gabriel após ele ter sido deixado na localidade:
— Porque eles não têm a mínima ideia do que aconteceu. E tudo que aconteceu depois é inusitado para eles. Jamais previram que alguma coisa pudesse acontecer com o rapaz.
Tenho certeza absoluta, e não é pela palavra dos policiais, é pelas provas materiais que temos dentro do processo, que não foram os policiais que levaram ele até o açude. Não foram, isso não foram. O que aconteceu depois que eles largaram ele da viatura, não sei se vão conseguir esclarecer. Mas que não houve a participação dos policiais, não houve,
VÂNIA BARRETO
Advogada que defende, junto com a colega Shaianne Lourenço Linhares, os soldados Raul Veras Pedroso e Cléber Renato Ramos de Lima
A advogada ainda acrescenta que uma questão intriga a defesa. Uma das irmãs de Gabriel teria dito que ele teria ligado para ela por volta de 23h de sexta-feira (12), data do desaparecimento. Mas que, na manhã de sábado, dia seguinte, quando o tio teria ido procurar Gabriel no quarto onde ele dormia, esse aparelho estava carregando na tomada. A Polícia Civil está com o telefone para análise.
Vânia afirma que há depoimentos no IPM que comprovariam que Gabriel conhecia a localidade de Lava Pé, ao contrário do que diz a família.
— Tenho certeza absoluta, e não é pela palavra dos policiais, é pelas provas materiais que temos dentro do processo, que não foram os policiais que levaram ele até o açude. Não foram, isso não foram. O que aconteceu depois que eles largaram ele da viatura, não sei se vão conseguir esclarecer. Mas que não houve a participação dos policiais, não houve — finaliza.
Advogados de sargento também alegam inocência
Os advogados Ivandro Bitencourt Feijó e Mauricio Adami Custódio, que defendem o 2º sargento Arleu Júnior Cardoso Jacobsen, também alegam que seu cliente é inocente. Dizem que pediram acesso aos elementos de prova já documentados nas investigações, tanto da Corregedoria-Geral da Brigada Militar quanto da Polícia Civil, para tomar conhecimento completo dos fatos objeto da apuração. E criticam a postura da Polícia Civil no caso.
"Causa espécie a essa defesa técnica, noticiar-se que a Chefia de Polícia Civil trabalhe apenas com uma única linha de investigação, sabendo-se que, no contexto de um fato complexo, deve se observar todas as hipóteses variáveis sem açodamentos que levem a total inversão de presunção por parte de agente público que não ostenta qualquer comportamento à margem da ética-policial militar ao longo de toda sua carreira", dizem os advogados na toa divulgada.