Aos seis anos, Brayan Vidal Ferreira é descrito como um "pequeno adulto" pelos familiares. Como não convivia tanto com crianças, amadureceu cedo, participando das conversas dos mais velhos. Fardado com camisa do Internacional e com livros de pintura embaixo do braço, o menino que morava em Imbé com os pais e os irmãos era quem coloria a rotina na casa. Ele era também o xodó da avó e o melhor amigo dos cachorros da família.
A infância de Brayan foi interrompida depois que ele foi atingido por disparos dentro de casa, em ataque a tiros, no último dia 7. O garoto morreu um dia depois, durante uma cirurgia em Porto Alegre.
O menino costumava dizer que queria ser jogador de futebol e também policial, seguindo a profissão do pai, o sargento aposentado da Brigada Militar (BM) Alexandre de Jesus Ferreira, 50 anos, que também foi ferido no ataque.
Brayan gostava de assistir desenhos, colorir livros e andar de bicicleta. Quando ia para a praia, só saia da água com os dedos murchos, depois de aproveitar o mar, lembra a mãe, Fabiene Ferreira, 53 anos. O menino morreu sem conseguir realizar um dos maiores sonhos: ir a jogo do Inter no Beira-Rio.
— Como os irmãos são todos adultos, ele era muito maduro para a idade. Era o único bebezinho com a gente. Era carinhoso, querido. Era ele que enchia nossa casa, que nos fazia rir, que nos dava alegria. Agora ficou esse vazio, não existe mais futuro para nós. O que vai ser agora?
Fabiene é mãe de Brayan desde os três meses de vida do garoto, que perdeu a mãe biológica durante o nascimento, em Tramandaí, no Litoral Norte.
— Eu lembro dele bebê, o jeito que ele me olhava, me cheirava toda. Eu soube ali que ele tinha me escolhido.
Desde fevereiro, o garoto frequentava a Escola Municipal Estado de Santa Catarina, em Imbé, onde cursava o 1º ano do Ensino Fundamental. Por professoras, ele é descrito como alegre, participativo e carinhoso, uma criança que amava jogar bola e cantar.
No dia em que foi baleado, um domingo, o menino e a mãe se preparavam para ver um jogo do colorado, deitados no sofá da casa, quando três homens armados invadiram a residência. A ação durou cerca de cinco minutos. Segundo a Polícia Civil, o alvo seria um colombiano, companheiro da neta do policial aposentado, que estava no local e conseguiu escapar. O homem estaria envolvido em suposto esquema de agiotagem. Naquela tarde, seis pessoas estavam na casa, e pai e filho ficaram feridos.
O sargento aposentado recebeu alta do hospital e está em tratamento, se recuperando do disparo que o atingiu no braço, enquanto lida com a perda do filho.
— Era muito inteligente, queria estar por dentro de todas as conversas. Ele era apaixonado pela avó, enlouquecido por ela, pedia sempre pra ir lá, dizia que sentia saudades. E ele era o xodó dela também. Era um menino excepcional. A única coisa que me conforta é saber que ele está ao lado de Deus agora — afirma o pai.
Baleado na cabeça e em um dos braços, o garoto foi atendido em um hospital em Imbé e depois transferido para uma unidade de Porto Alegre. Durante uma cirurgia no dia seguinte, uma segunda-feira, ele não resistiu e morreu.
O enterro de Brayan foi realizado no último dia 9, uma terça-feira, em Imbé. Em razão da morte, a prefeitura do município decretou luto oficial de três dias.
Investigação
A investigação é conduzida pela Polícia Civil de Imbé. Na última quarta-feira (17), o delegado que comanda o caso, Antônio Carlos Ractz, não informou mais detalhes da apuração para não prejudicar o trabalho.
Anteriormente, a polícia havia divulgado que a invasão na casa de Imbé, que resultou na morte do menino, teria ocorrido em razão de um esquema de agiotagem — prática ilegal de emprestar dinheiro com juros elevados — comandado por um grupo de colombianos. As equipes ainda tentam esclarecer o que motivou o ataque, embora já saiba que esteja vinculado às ações do grupo. Pode se tratar de represália ou mesmo de desentendimento entre os envolvidos no esquema. A polícia afirmou, na ocasião, que tenta localizar o homem que seria o alvo da invasão e que escapou dos disparos na casa do PM.
Segundo o delegado, os criminosos que atacaram a residência da família de Imbé efetuaram mais de 50 disparos com pistolas. Ractz afirmou que os atiradores só não mataram todos que estavam no local porque acabaram as munições. Embora o caso envolva estrangeiros, os atiradores que balearam a criança eram brasileiros, conforme a apuração.
No último dia 10, em uma coletiva, a polícia divulgou resultados de uma operação que integra a investigação do assassinato de Brayan. Naquela quarta-feira, Brigada Militar e Polícia Civil cumpriram 14 mandados de busca e apreensão no Litoral Norte e no Vale do Sinos e efetuaram uma prisão em flagrante, de outro colombiano, de 45 anos, que estava em uma casa em Tramandaí com dinheiro falso. Durante a ação, foram localizados cerca de R$ 15 mil, em peso colombiano, euro e dólar e algumas notas falsas de reais.
— Uma criança, de apenas seis anos, estava brincando e vendo TV num domingo à tarde, na sua casa, com um irmão autista, com os pais, quando entram aqueles indivíduos, efetuando série de disparos, ela corre para os braços do pai, e é morta na frente dele. Isso tem de ter uma resposta, independentemente do filho de quem fosse — disse Ractz, na coletiva do dia 10.
A ação dos criminosos na casa foi flagrada por uma câmera de segurança, que registrou o momento em que três homens armados chegaram ao local em um Ka, sendo que dois deles descem do carro e entram na residência já atirando. Após o ataque, os criminosos fugiram e abandonaram o automóvel em um terreno baldio na cidade. Eles também atearam fogo ao carro.