Em uma semana marcada por anúncios importantes para o sistema penitenciário gaúcho, o governo do Estado se prepara para colocar em funcionamento um centro de triagem de detentos, que servirá para abrigá-los antes de serem encaminhados para as unidades prisionais. O Núcleo de Gestão Estratégica do Sistema Prisional (Nugesp), inaugurado na manhã desta segunda-feira (27), é apontado como solução para evitar que presos aguardem em viaturas e delegacias. O espaço deve receber detentos de toda a Região Metropolitana, incluindo municípios dos vales do Sinos e Paranhana e do Litoral Norte.
São 708 vagas para pessoas detidas temporariamente enquanto aguardam pela transferência em uma unidade prisional ou por sua soltura. Elas ficam divididas em cinco módulos, sendo quatro destinados a detentos do sexo masculino, com 156 vagas cada um, e um para 60 apenadas mulheres e LGBT+. Em todas elas há uma cela para pessoas com deficiência, com rampas de acesso aos dormitórios. O complexo deverá abrigar ainda 24 presos em caráter permanente, que irão realizar atividades operacionais, como alimentação, limpeza e manutenção do prédio.
Quem chega da delegacia passa por uma série de etapas (veja todas elas detalhadas no final da matéria). Primeiramente, os indivíduos passarão pelo “módulo da inclusão”. É o espaço onde os presos serão submetidos a exames, atendimentos e audiência de custódia. O processo, conduzido pelo Poder Judiciário, irá indicar o destino do preso.
A presença das salas de audiência dentro do centro de triagem é considerada pelas autoridades como um dos diferenciais para garantir maior dinamismo na chegada e saída de detentos. O governador Ranolfo Vieira Júnior garante que o funcionamento do complexo será eficaz para que não haja mais viaturas lotadas.
— É uma maneira totalmente diferente daquela que nós fazíamos até então. Não tenho dúvida de que presos em viaturas e delegacias de polícia farão parte do passado — assegura Ranolfo.
A audiência de custódia deve ocorrer em até 24 horas após a chegada do detento ao Nugesp. Na sequência, será definido o seu destino: se sai em liberdade, é solto mediante medida cautelar (com a instalação de tornozeleira eletrônica, por exemplo), ou permanece preso. Nesse caso, é encaminhado a um dos demais módulos. A diretora do espaço, Rita Leonardi, explica que a sua transferência para uma penitenciária não deve ultrapassar 15 dias.
— A nossa proposta é que o sistema consiga absorver essas pessoas nesse período (de 15 dias), não deverá passar disso — garante Leonardi.
Outra novidade é a presença de um painel de indicadores instalado na entrada dos módulos, que irá registrar as atividades que ocorrem no complexo. Nele, serão informados em tempo real os números de audiência de custódia realizadas, quantitativo de atendimentos psicossociais e de saúde, tempo de permanência do preso e a quantidade de tornozeleiras eletrônicas instaladas. Em um primeiro momento, não haverá sistema de bloqueadores de celular. A implementação da medida poderá ser avaliada nos próximos meses.
A expectativa é de que as primeiras audiências ocorram a partir de terça-feira (28).
— Será possível realizar as audiências a partir desta terça e receber os detentos nos dias posteriores — promete a diretora.
Local já servia como centro de triagem
O espaço passou por quase três anos de obras, orçadas em R$ 46,4 milhões. O anúncio da construção foi feito em julho de 2019, e os trabalhos iniciaram um mês depois. Inicialmente, a previsão era que a estrutura fosse concluída no fim de março. No entanto, o cronograma acabou alterado e estendido. Entre os motivos citados pelo governo para o atraso estão afastamentos que foram necessários em razão da pandemia e a instalação de estruturas que não estavam previstas inicialmente.
O local escolhido, na Rua Salvador França, no bairro Partenon, na zona leste da Capital, já havia sido utilizado como um centro de triagem provisório entre 2015 e 2018, em meio ao aumento no número de presos em viaturas e delegacias. O Centro de Triagem de Porto Alegre abrigou detentos em contêineres, mas não apresentava a estrutura adequada para desafogar o sistema.
— Eram apenas 80 vagas disponíveis e não suportava todo o volume de presos que chegava das delegacias. Acreditamos que agora, com o número muito maior de vagas, a situação seja diferente — afirma o chefe da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) José Giovani Rodrigues de Souza.
Novos anúncios nesta semana
A inauguração do Nugesp foi a primeira de quatro ações previstas pelo governo do Rio Grande do Sul no setor penitenciário nesta semana. Na terça-feira (27), uma cerimônia irá marcar o começo da construção da nova Cadeia Pública de Porto Alegre (CPPA), antigo Presídio Central. Com investimento de R$ 116 milhões, o objetivo da Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo (SJSPS) é adequar os módulos e a infraestrutura da unidade prisional, com a qualificação de 1.884 vagas.
Na quarta-feira (29), serão iniciadas as obras da Penitenciária Estadual de Charqueadas 2, com a previsão de abrir mais 1.656 vagas. Já na sexta-feira (1º) ocorre o pontapé inicial na ampliação da Penitenciária Estadual de Canoas 1, que deverá oferecer outras 188 vagas no sistema prisional.
Como funcionará a triagem:
- O detento é conduzido pela Polícia Civil ou Brigada Militar até o núcleo
- Ele passa por exames de corpo de delito
- É levado ao módulo de inclusão
- Passa pelo processo de identificação
- É submetido a três atendimentos: médico, psicossocial, de defesa (com Defensoria Pública ou advogado particular)
- Aguarda por até 24 horas para a realização da audiência de custódia
- Feita a audiência, a Justiça irá definir o destino do detento
- Se for definida sua liberdade, ele é autorizado a deixar o complexo imediatamente
- Se for determinada uma medida cautelar, ele deverá cumprir os procedimentos exigidos (como a colocação de tornozeleira eletrônica) antes de ser liberado
- Caso seja mantida sua prisão, o indivíduo é levado a algum módulo, onde ficará por no máximo 15 dias, até conseguir transferência para uma unidade prisional