O que inicialmente parecia uma opção atrativa se transformou em dor de cabeça que se arrasta há nove meses para clientes de uma doceira em Viamão, na Região Metropolitana. A confeiteira, que é investigada por estelionato, desapareceu em agosto do ano passado após anunciar promoções e receber pagamento antecipado. Desde então, parte da clientela, que ficou sem as entregas, aguarda pelo desfecho do caso e ressarcimento dos valores.
A técnica de enfermagem Vanessa dos Santos, 31 anos, é uma das clientes que afirma ter transferido pelo menos R$ 450 para a doceira. Os valores depositados dariam direito, conforme os anúncios de promoções realizados pela confeiteira, a cerca de R$ 6 mil em produtos. Entre os itens que ela esperava receber estava o bolo do aniversário de três anos do filho, encomendado com quatro meses de antecedência. Poucos dias antes da festa, ela precisou contratar outra profissional para fazer a entrega.
Logo após a repercussão do episódio, no fim de agosto do ano passado, em sua página no Instagram, a confeiteira investigada publicou nota de esclarecimento, na qual negava que tenha tentado enganar os clientes e repudiava a afirmação de que se tratava de um golpe. Pedia desculpas pelos transtornos e dizia estar buscando uma forma de solucionar cada caso. Na mesma mensagem, havia indicação de contato para solicitar ressarcimento. Vanessa foi uma das que buscou contato, e foi informada de que receberia o valor em cerca de cinco dias, mas isso também não se concretizou.
Nos dias seguintes, em um grupo formado pelas clientes no WhatsApp, 13 mulheres informaram ter recebido e outras saíram sem relatar se haviam sido ressarcidas. O mesmo grupo chegou a ter uma lista de 73 pessoas que afirmam terem quitado valores, sem receber as encomendas. A soma se aproximava de R$ 17 mil. Após a promessa do ressarcimento, a maior parte das clientes seguiu à espera de novos pagamentos, mas não recebeu mais resposta. O perfil da confeitaria desapareceu das redes sociais e os contatos de telefone não chamam.
— Simplesmente aquele número sumiu. É difícil de acreditar. Enganou todo mundo e vai ficar por isso mesmo — lamenta Vanessa.
Outra cliente que também buscou a polícia após ter ficado sem receber as encomendas Cristiane Longaray de Oliveira Borba, 37 anos, foi uma das vítimas a serem ouvidas durante a investigação em novembro do ano passado. Ela relata ter adquirido R$ 250 em vouchers, sem ter os produtos entregues.
— É um sentimento muito estranho, de estar com as mãos amarradas. Comprei voucher e não recebi, e a promessa de ser reembolsada, mas eu nunca consegui de volta. Isso dá um pavor, essa impunidade — diz.
Depois de passar pelo episódio, conta que ficou receosa em fazer novas compras e agora não realiza mais pagamentos adiantados. A empresária Fernanda França Ferreira, 39 anos, também diz ter ficado traumatizada com o fato. Depois disso, afirma ter ficado desconfiada de qualquer compra, por acreditar que pode ser um novo golpe. Recentemente, passou por isso ao adquirir produto para o aniversário de 15 anos da filha.
— Fiquei duas noites sem dormir porque comprei pelo site e achei que tinha caído em mais um golpe — relembra Fernanda.
A empresária, assim como outras clientes, chegou até a confeiteira após ser indicada por uma amiga, que levou provas dos produtos para que conhecesse. Depois de não ter parte das encomendas entregues, a empresária descobriu relatos de outras clientes nas redes sociais e que fazia parte de um grupo de pessoas que acreditavam terem sido vítimas de golpe. Depois disso, os fregueses começaram a procurar a polícia para registrar os casos — parte foi feito por meio da Delegacia Online.
A investigação
Segundo o delegado Júlio Fernandes Neto, da 2ª Delegacia de Polícia de Viamão, o caso segue sob investigação. Parte das vítimas já foi ouvida durante a apuração.
— Todos os elementos apurados até agora indicam que será indiciada por estelionato — afirma.
Durante a investigação, a polícia tentou localizar a confeiteira para prestar depoimento, mas ela não foi encontrada em Viamão. Os investigadores receberam naquele período informação de que ela estaria em Santa Catarina. No entanto, agora, segundo o delegado, a mulher já retornou ao Rio Grande do Sul. A doceira deve ser a última ouvida pela investigação, que ainda não tem prazo para ser concluída.
GZH não divulga o nome da doceira porque, neste momento, ela é considerada suspeita, sem ter sido ouvida pela polícia, e ainda não foi localizada para apresentar sua versão.
Como funcionava
Os clientes eram incentivados a fazer pagamentos antecipados, com os quais seriam beneficiados com vouchers em valores bem superiores. As promoções prometiam, por exemplo, que ao pagar R$ 69,90 adiantado o cliente receberia voucher de R$ 2 mil que daria direito a adquirir produtos.
Os valores dos anúncios, enviados em grupos ou em mensagens diretas, variavam. Outra promoção anunciava que, ao pagar R$ 99,90, o cliente teria direito a voucher de R$ 1 mil. Havia ofertas de valores mais acessíveis, de apenas R$ 50, para obter direito a R$ 1,5 mil em produtos. Nesse caso, as entregas precisavam ser agendadas com antecedência.
Em agosto, os clientes começaram a ser contatados pela doceira, informando que não teria como realizar as entregas. Depois disso, ela acabou desaparecendo. Há casos também de clientes que relataram terem adquiridos cursos profissionalizantes.