Três dias antes do aniversário de oito anos do filho, em agosto, Mônica Rodrigues, 31 anos, foi surpreendida ao descobrir que os doces encomendados para a festinha não seriam entregues. A vendedora é uma das clientes que acredita ter sido vítima de golpe por parte de uma doceira de Viamão, na Região Metropolitana. Assim como ela, outros fregueses relatam terem sido lesados e aguardam por uma solução para o caso.
A vendedora conta ter sido procurada pela própria doceira, que lhe ofereceu uma promoção. Caso adquirisse voucher de R$ 99,90, teria direito a retirar R$ 1 mil em produtos. Mônica ainda comprou outro voucher, de R$ 100, que daria direito a R$ 2,5 mil em doces, e pagou um topo de bolo por R$ 25. Da mesma forma, as demais supostas vítimas também contam terem sido lesadas após serem atraídas por essa mesma promoção.
– Antes de comprar, eu olhei o Instagram dela, vi que tinha 19 mil seguidores, com pessoas famosas, olhei os comentários – diz Mônica.
O bolo e os doces tinham sido encomendados com a temática escolhida pelo garoto. Foi a própria confeiteira quem avisou por mensagem que não faria a entrega – outras clientes receberam o mesmo texto. Para garantir que a festa não ficaria sem doces, a mãe precisou recorrer a outro estabelecimento, às pressas. Quando se deu conta de que havia caído num golpe, decidiu registrar o caso na polícia.
– Foi uma frustração meu filho não ter o bolo do jeito que queria. Agora, ela sumiu de novo. A justiça tem que acontecer. É o que estamos esperando – afirma Mônica.
Logo após a repercussão do episódio, no fim de agosto, em sua página no Instagram, a confeiteira publicou nota de esclarecimento, na qual negava que tenha tentado enganar os clientes e repudiava a afirmação de que se tratava de um golpe. Pedia desculpas pelos transtornos e dizia estar buscando uma forma de solucionar cada caso. Na mesma mensagem, havia indicação de contato para solicitar ressarcimento.
É muito triste isso. Já perdi a esperança de ter meu dinheiro de volta. Se ela falasse: "não tenho condições", eu iria entender. Ela não deu satisfação. Sumiu, desapareceu
VÍTIMA
47 anos
Nos dias seguintes, no grupo formado pelas clientes no WhatsApp, 13 informaram ter recebido, e outras saíram sem relatar se haviam sido ressarcidas. No entanto, depois disso, as clientes seguiram à espera de novos pagamentos, mas não receberam mais resposta. O perfil da confeitaria desapareceu das redes sociais e os contatos de telefone não chamam.
– Assim que teve a nota de esclarecimento, entrei em contato. Disse que iria efetuar o pagamento em três a cinco dias. Deu o prazo, entrei em contato, e ela disse que, como a demanda era muito grande de pessoas querendo dinheiro de volta, o prazo seria 10 dias. Esse prazo se encerrou no dia 1º de setembro. Já é dia 17 e não tive nenhum retorno dela. Inclusive, ela sumiu de novo – reclama Vitória Castro, 20 anos.
A jovem conta ter tido prejuízo de R$ 415, após comprar três vouchers da doceira. Já havia, inclusive, feito a encomenda para o aniversário de um ano do filho Miguel, em abril de 2022. Além desse pedido, por meio de vouchers adquirido por uma familiar, encomendava bolos a cada mês de aniversário do filho. Chegou a receber as primeiras entregas, mas agora ficou no prejuízo.
– Tinha encomenda para todo o dia 1º, que é o "mesversário" do meu filho. Já tinha passado os temas, e aí ela some – diz Vitória.
No grupo de WhatsApp, ainda há lista com 43 nomes de mulheres que afirmam terem sido lesadas, numa soma de R$ 10,2 mil. Letícia Antunes, 23 anos, é uma das freguesas que integra a lista e buscou a polícia. Ela conta inicialmente até ter desconfiado da promoção, em razão da diferença entre os valores pagos e os produtos que podiam ser adquiridos. Mas acabou se convencendo pelo histórico da confeiteira, que tinha boas recomendações.
– Pagar R$ 100 e poder gastar R$ 1 mil não fazia muito sentido para mim. Mas minha amiga tinha pago e recebido. Era uma confeiteira famosa, com propaganda, seguidores. Pensei que não ia se sujar por R$ 100. Sem saber eu da quantidade de pessoas que também estava pensando assim. Fiz o Pix na mesma hora, para não perder a promoção – recorda.
A jovem encomendou o bolo para o aniversário de 15 anos da irmã e, duas semanas antes, procurou a doceira, para se certificar. A confeiteira garantiu que estava tudo certo. Cinco dias antes da festa novamente voltou a perguntar e recebeu a mesma resposta: “está tudo bem, não te preocupa”. Três dias antes, foi avisada que a entrega não seria feita.
– Fiquei desesperada. Liguei para ela, mas não me retornou. Aí vi que todos tinham recebido a mesma mensagem e percebi que havia caído num golpe – diz a jovem, que teve de procurar outra profissional para fazer o bolo da irmã.
Assim que a doceira compartilhou a nota, sobre o ressarcimento, Letícia também fez contato e teve como retorno a promessa de que receberia em 10 dias. O prazo, no entanto, não foi cumprido até agora.
Curso profissionalizante
Nem todas as pessoas lesadas tinham adquirido o voucher para comprar os doces. Uma moradora de Viamão, de 47 anos, havia se inscrito para curso de confeitaria anunciado pela confeiteira, pelo valor de R$ 265. A promessa era de aprender técnicas para a produção de bolos. Em busca de emprego, acreditou que seria uma oportunidade de se profissionalizar.
– Faço meus bolos, mas nunca fiz curso. Queria me especializar, ter certificado. Era meu sonho fazer curso de confeitaria com ela. Estamos todos desempregados aqui em casa. É um dinheirinho que a gente lutou para conseguir. Não é muito, mas dá para pagar água, luz. Fiquei sem o curso e sem dinheiro. É muito triste isso. Já perdi a esperança de ter meu dinheiro de volta. Se ela falasse: "não tenho condições", eu iria entender. Ela não deu satisfação. Sumiu, desapareceu – lamenta a cliente, que prefere não ser identificada.
A investigação
Segundo o delegado Júlio Fernandes Neto, da 2ª Delegacia de Polícia de Viamão, a investigação do caso segue em andamento. Na DP, chegaram 17 boletins de ocorrência até o momento, conforme o policial.
Segundo o delegado, a polícia já começou a ouvir vítimas para esclarecer se o caso se trata de estelionato. A doceira foi procurada para prestar depoimento, mas não foi encontrada em Viamão. Os investigadores receberam a informação de que ela estaria em Santa Catarina e a polícia catarinense deve ser acionada para fazer a oitiva da suspeita.
– (São) Muitos registros. Está tramitando ainda, mas ela se encontra em outro Estado. Vamos ter de deprecar (pedir que seja realizada por outro órgão) a oitiva – afirma.
GZH não divulga o nome da doceira porque, neste momento, ela é considerada suspeita, sem ter sido ouvida pela polícia, e ainda não foi localizada para apresentar sua versão.