O governo do RS voltou atrás e informou ao Judiciário que os líderes de facções criminosas transferidos no dia 13 de abril para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) não ficarão isolados. A comunicação foi feita pela Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo (SJSPS) e a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) à 1ª Vara de Execuções Criminais e Porto Alegre.
A resposta do Estado foi protocolada após a juíza Sonáli da Cruz Zluhan pedir esclarecimentos sobre eventual regime diferenciado de cumprimento de pena que havia sido anunciado sem que houvesse autorização judicial. Conforme o documento assinado pelo secretário Mauro Hauschild e pelo titular da Susepe, José Giovani Rodrigues de Souza, esses líderes de facções ficarão 10 dias isolados em razão de protocolos relacionados à covid-19.
“Na Pasc, a ordem de serviço nº 001/2021/ASD/PASC, de 16 de dezembro de 2021, dispõe dos itens 1 e 2 sobre o local onde se dará o isolamento sanitário aos que entrarem na penitenciária e estabelece o prazo de 10 dias para a permanência daquelas pessoas presas que forem oriundas de outros estabelecimentos prisionais, justamente atendendo ao necessário isolamento sanitário”.
Ou seja, o isolamento não seria por outro motivo, como o anunciado regime diferenciado de cumprimento de pena que estaria sendo aplicado sem autorização judicial.
“Registramos nosso mais profundo respeito pelo Poder Judiciário enquanto ente harmônico do Estado Democrático de Direito, assim como pela atividade jurisdicional desempenhada, há anos, por essa magistrada, entendendo que as providências adotadas por esta Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo e Superintendência dos Serviços Penitenciários, assim como pelas demais forças de segurança pública jamais tiveram o escopo afrontar/desrespeitar o equilíbrio dos poderes constitucionais ou mesmo qualquer decisão primitiva relacionada ao juízo dessa Vara de Execuções Criminais”.
A magistrada não questionou as transferências, mas o anúncio de governo de que esses líderes de facções seriam colocados em isolamento, sem que houvesse autorização judicial. Com a resposta do Estado, a juíza determinou que sejam informadas as galerias que eles ficarão na Pasc após o isolamento por causa da covid-19. A secretaria também terá de informar o que fará com apenados que não são ligados a facções e que não teriam galerias para se alojar.
No dia da transferência de 10 líderes de facções para a Pasc, na Operação Fatura, para conter a onda de ataques em Porto Alegre, tanto o secretário Hauschild quanto o secretário da Segurança Pública, Vanius Cesar Santarosa, afirmaram que esses apenados seriam colocados numa espécie de RDD (regime disciplinar diferenciado), cujas regras de cumprimento de pena são mais rígidas.
A intenção era que os presos não tivessem contato nenhum entre eles. Ficariam em celas individuais e teriam direito a pátio também sozinhos, além de receberem a alimentação na própria cela. Haveria a criação de protocolos sobre toda a rotina interna e de como funcionariam as visitas e os contatos com advogados. Na oportunidade, em entrevista a GZH, o secretário Hauschild afirmou que o sistema seria baseado em protocolos mais rigorosos, como, por exemplo, revistas de hora em hora e quando o preso saísse e voltasse do pátio, além de buscas no pátio após o banho de sol. O modelo ainda estaria sendo criado.
— Estão sendo construídos vários protocolos para garantir, além do isolamento, que também seja assegurada a incomunicabilidade — disse Hauschild, na oportunidade.
Em entrevistas a GZH e RBS TV, o secretário Santarosa seguiu na mesma linha:
— É um regime diferenciado. Ou seja, o preso realmente não vai ter contato. Ele vai sofrer revistas diárias nas celas. Se, caso conseguir burlar esse sistema que impeça que entre o celular, a revista diária vai detectar e vai recolher. Mas acredito que não. A ideia é manter ele totalmente isolado como deve ser — ressaltou Santarosa no dia das transferências.
Santarosa afirmou que o Estado tinha autorização judicial por um período para mantê-los naquela situação.
A transferência durante a Operação Fatura foi solicitada pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, que identificou os possíveis envolvidos na recente onda de crimes que deixou 25 mortos em cerca de um mês na Capital. A operação foi trabalho integrado da Polícia Civil, Brigada Militar e Superintendência dos Serviços Penitenciários, além das áreas de inteligência de cada órgão.
Na quinta-feira (21), por volta das 11h, a SJSPS se manifestou por meio de nota negando que tenha voltado atrás. Leia a íntegra:
"A Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo (SJSPS) informa que em nenhum momento voltou atrás no que diz respeito ao cumprimento de pena dos apenados transferidos para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (PASC).
Conforme resposta ao expediente nº 5836-15/000012-9, a SJSPS esclarece que o pedido fundamentado realizado pelo Departamento de Segurança e Execução Penal (DSEP) da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) ao Poder Judiciário, acerca da transferência dos apenados em questão, obteve concordância do magistrado competente.
Cabe ressaltar também que as transferências, por ora, não estão pautadas em Regime Disciplinar Diferenciado de cumprimento de pena previsto na legislação vigente e que a condição em que os apenados transferidos estão submetidos, no momento, refletem a necessidade da precaução de medidas de contingência em relação ao contágio por covid-19, bem como os procedimentos adotados caracterizam medidas de segurança, com regime de protocolos mais rígidos para aquele local específico, de acordo com o perfil dos presos, sendo preservados todos os direitos previstos em lei.
Por fim, há que se mencionar, por oportuno, que a administração penitenciária dispõe de conduta específica relacionada ao enfrentamento da covid-19, acompanhando a Nota Informativa Conjunta do Centro Estadual de Vigilância e Saúde 05/2021-CVES/DAPPS de 15.09.21, revisada em 14.02.22, resultando no isolamento sanitário pelo prazo de 10 dias para a permanência daquelas pessoas presas, justamente atendendo a necessária separação."