De dentro da sala na sede da Polícia Federal (PF), em Porto Alegre, o superintendente Aldronei Antônio Pacheco Rodrigues ouviu gritos no fim da manhã de segunda-feira (7). Ao olhar pela janela, para compreender do que se tratava, na calçada da Avenida Ipiranga viu um homem desferindo socos em uma mulher. O caso foi registrado pelas câmeras de segurança do prédio.
Após serem alertados pelo superintendente, os policiais saltaram para fora do prédio e deram voz de prisão para o homem. Ainda na calçada, o agressor foi imobilizado no chão e detido em flagrante.
— A situação é um absurdo total. Um fato como esse, e ainda na frente de um órgão policial. Como não poderia deixar de ser, sempre agimos, ainda mais em situação dessa natureza. O desdobramento que teve já foi horrível, mas é o tipo de caso que ainda poderia se agravar — diz o superintendente da PF no Estado.
Inicialmente, a mulher, que está grávida, informou aos agentes que não queria registrar ocorrência contra o companheiro. Como não se trata de um crime federal, os dois foram encaminhados para a sede Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) da Capital, que fica nas proximidades.
Somente após o homem ser detido é que os policiais conseguiram analisar as câmeras de segurança e descobriram que todo o episódio havia sido registrado. Pelo vídeo, é possível ver que a vítima anda pela calçada e, logo em frente à sede da PF, é seguida pelo homem. Os dois discutem e ela faz menção de entrar no prédio.
Em determinado momento, a mulher cruza o portão, caminha na direção da entrada da sede, mas não chega a subir as escadas. Ela é seguida pelo homem, e os dois retornam para a calçada, discutindo. Segundo o superintendente, os agentes do plantão registravam outra ocorrência e não chegaram a presenciar a movimentação.
Logo depois, o homem espanca a mulher pela primeira vez, junto ao portão da sede. Os dois voltam a caminhar, e ela tenta revidar. É possível ver que pedestres passam pelo casal e observam a cena, mas seguem andando. O agressor, então, passa a bater repetidas vezes, desferindo socos no rosto e na cabeça da mulher. Assim que consegue se desvencilhar do homem, ela sai caminhando no sentido oposto. É neste momento que os agentes surgem.
Caso será investigado pela Delegacia da Mulher
Segundo a Polícia Civil, o casal foi ouvido, mas a mulher agredida se recusou a registrar ocorrência e também não queria que o homem fosse preso. Nesse contexto, o caso foi registrado, mas não foi feito flagrante de prisão do suspeito, que responderá em liberdade.
— Nesse caso, específico, a mulher depende economicamente do suspeito, e está gravida. Muitas vezes, vejo isso diariamente, as mulheres não têm como prover seu próprio sustento e isso implica que elas fiquem com os agressores. É muito difícil permanecer nessa situação, contudo, como mulher e mãe, elas preferem passar por esse sofrimento, a não ter como manter um filho. Nesse caso em específico, ela não contou por que não queria registrar, mas existem muitos motivos apontados pelas mulheres — explica a delegada Fernanda Campos Hablich, que atendeu o caso no plantão da Deam.
O fato, conforme a delegada, seguirá sendo apurado pela polícia, e, ao final da investigação, o homem poderá ser indiciado pelo crime. Os vídeos registrados pelas câmeras da sede da PF também serão analisados. Para a policial, esse tipo de caso evidencia o número de fatos subnotificados porque as mulheres ainda não conseguem se desvencilhar desse tipo de relação, por diferentes motivos.
— Nesse fato, conversei com a vítima, ela estava muito relutante, disse que não aconteceu nada e que ela também havia agredido. Ela não apresentava nenhuma lesão. Então, optei por não lavrar o flagrante. Até porque, com certeza, mesmo que ele fosse preso, ela manteria essa relação com ele, porque deixou isso claro. Essa mulher precisa do aparato estatal, assim como a grande maioria das que aparecem ali. É preciso mudar a mentalidade, é preciso uma evolução da nossa cultura em relação ao papel da mulher no relacionamento. A violência doméstica vai muito além da função repressiva da polícia — diz a delegada.
Onde pedir ajuda
- Telefone: 190
Horário: 24h
Serviço: atende emergências envolvendo violência doméstica em todos os municípios. Para as vítimas que já possuem medida protetiva, há a Patrulha Maria da Penha da BM, que fiscaliza o cumprimento. Patrulheiros fazem visitas periódicas à mulher e mantêm contato por telefone.
- Endereço: Delegacia da Mulher de Porto Alegre (Rua Professor Freitas e Castro, junto ao Palácio da Polícia), bairro Azenha. As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias.
Telefones: (51) 3288-2173, 3288-2327, 3288-2172 ou 197 (emergências)
Horário: 24h
Serviço: registra ocorrências envolvendo violência contra mulheres, investiga os casos, pode solicitar a prisão do agressor, solicita medida protetiva para a vítima e encaminha para a rede de atendimento (abrigamentos, centros de referência, perícias, Defensoria Pública etc.), entre outros.