Quase quatro meses depois, a Polícia Civil faz nova ofensiva contra facção paulista que operava no Rio Grande do Sul. Sempre com foco específico no combate à lavagem de dinheiro, o objetivo foi apreender bens da organização criminosa e o montante estimado é de R$ 3,2 milhões.
Ao todo, 85 agentes cumpriram 21 ordens judiciais, entre mandados de apreensão de imóveis e veículos, indisponibilidade de contas bancárias e ainda um de prisão preventiva no Estado e também em Santa Catarina.
Somando os valores dos bens apreendidos entre as duas fases da operação, o total chega a R$ 7 milhões. Em Gravataí, um homem foi preso em flagrante devido a quantidade de drogas apreendidas em casa, o que se configuraria como tráfico e não para consumo.
A organização criminosa de São Paulo passou a operar em várias cidades gaúchas após se unir com um grupo que tem base no Vale do Sinos. Com isso, segundo a investigação da Operação Irmandade, desde 2017 tinha uma movimentação financeira mensal de R$ 12 milhões por meio de uma rede de 45 operadores que vendiam entorpecentes enviados aos integrantes do Rio Grande do Sul e remetiam os valores para cerca de cem contas bancárias.
Lavagem de dinheiro
As cidades onde foram cumpridos mandados judiciais nesta segunda fase são Porto Alegre, Canoas, Cachoeirinha, Gravataí e São Leopoldo, no Estado, além de Itapema, em Santa Catarina.
O objetivo foi desarticular uma nova célula financeira da facção no Vale do Sinos, responsável por uma complexa rede de dissimulações para ocultar bens e ativos financeiros, inclusive usando empresários, comerciantes e corretores de imóveis que atuavam de forma criminosa. Os nomes dos envolvidos não foram divulgados porque a investigação continua, mas todos estão sendo responsabilizados conforme os delitos que cometeram.
O titular da Delegacia de Repressão à Lavagem de Dinheiro do Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc) e responsável pela operação policial, delegado Adriano Nonnenmacher, diz que foi comprovado que criminosos do nordeste do Brasil pagaram por imóveis em Santa Catarina e que pertenciam à quadrilha gaúcha. Segundo ele, também houve a retirada fraudulenta de valores em espécie de uma delegacia de polícia do interior do Estado: integrantes da facção simularam uma história sobre a retirada de dinheiro apreendido por agentes de um município durante investigação. Para isso, os criminosos usaram documentos, assim como contratos fictícios, para dar aparência lícita a uma ação que, quando comprovada, ocorre normalmente mediante registros.
— Eram valores apreendidos pela polícia em situação de transporte por laranjas, mas o grupo usou documentos falsas e simulou uma situação para retirar esse dinheiro da delegacia. Não estamos divulgando o local porque um inquérito sobre isso está em andamento — ressalta Nonnenmacher.
Assim como na fase 1, também foi constatada pela investigação a utilização de contas de passagem no sistema financeiro, ou seja, dinheiro que era depositado nas contas de laranjas, bem como operadores que emprestavam seus nomes para a ocultação e venda de veículos de luxo, além de pagamento em esmeraldas pelo serviço realizado por estes operadores. Foi apurado ainda que um traficante colombiano estava encomendando grande quantidade de maconha do grupo com base no Rio Grande do Sul e ainda o uso de doleiros gaúchos para remessa de valores para fora do país.
Suspeitos investigados
Cinco suspeitos, entre líderes e gerentes, já foram indiciados como responsáveis pelos crimes de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e crime organizado. Todos estão com prisão preventiva decretada, sendo dois ainda foragidos. Um sexto integrante, gaúcho de São Leopoldo, que também foi alvo de prisão preventiva nesta quinta-feira e que tem funções de gerência na organização, está foragido do sistema prisional. Ele também foi investigado na fase um e é apontado por realizar operações logísticas e financeiras no Rio Grande do Sul e em outros Estados.
As ações contaram com apoio do Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos (GIE) gaúcho e da Polícia Civil de Santa Catarina.
Fase 1
Um dos operadores do grupo era uma garota de programa que atuava para a organização criminosa. A polícia descobriu que, atualmente, ela está em Dubai, nos Emirados Árabes. Além disso, foi confirmada a compra de dois imóveis, um prédio com vários apartamentos e outro onde funcionou uma boate em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, além de uso de veículos de luxo. Em julho, 22 veículos foram apreendidos, incluindo uma Mercedes avaliada em R$ 400 mil. Também foram localizados R$ 160 mil em vários locais onde houve buscas.
Mas o esquema não se restringia apenas à compra de bens, mas em um emaranhado de transações financeiras com depósitos de pequenos valores em contas de laranjas. Até o nome de uma criança foi usado. A organização tinha ainda outros investimentos, como em criptomoedas e na bolsa de valores de São Paulo. Além de fotos de encontros, quebra de sigilo bancário e fiscal e monitoramento, áudios revelaram como a facção de São Paulo operava em solo gaúcho.
O delegado Nonnenmacher ressalta que os operadores gaúchos eram comandados por um detento na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). Ele é apontado como o elo gaúcho da rede, enquanto um baiano, que está em presídio na região metropolitana de Belém (Pará), é o elo nacional. Em julho, durante a primeira fase da ação, 330 agentes cumpriram 72 mandados de busca e cinco de prisão em sete Estados.
A investigação apontou que, entre 2017 e 2019, dois irmãos de São Leopoldo eram os responsáveis por gerenciar a logística de drogas e valores no esquema criminoso entre o baiano, da facção paulista, e o gaúcho preso na Pasc. Mas esse papel passou, após este período, para um outro gaúcho que, até a realização da operação em julho deste ano, estava em prisão domiciliar em Florianópolis, Santa Catarina. Ele é de Canoas.