Enquanto a maioria dos crimes apresenta redução no Estado, os golpes continuam em alta. GZH mapeou o aumento deste tipo de delito, a partir dos indicadores divulgados pela Secretaria da Segurança Pública (SSP). Há 55 meses, os registros de estelionato apresentam aumento no RS, no comparativo com o mesmo período. Em agosto, dado mais recente, foram 6,3 mil comunicados à polícia - média de 206 por dia, e acréscimo de 5%.
Embora o aumento venha sendo percebido com maior intensidade nos últimos dois anos, a elevação teve início ainda em 2017. Em fevereiro daquele ano, os golpes cresceram 10% na comparação com mesmo mês em 2016 - de 1.454 para 1.606. A partir dali, ao longo de todo ano se mantiveram em alta, mas com pouca variação. Em 2018 e 2019 os números seguiram crescendo. Foi em 2020 que houve salto nesse tipo de crime e os casos mais do que dobraram. De janeiro a dezembro, foram 66,2 mil estelionatos - 130% a mais do que os 28,7 mil de 2019.
Em 2021, o cenário segue semelhante, com números em elevação. Em março, por exemplo, foram 8 mil registros - média de 259 por dia. O aumento nos golpes é acompanhado pela polícia, que vêm tentando reforçar a prevenção, considerada principal estratégia de combate. Foi lançada, desde então, cartilha com orientações sobre as principais fraudes e aplicativo (PC Alerta). Também houve reforço nas investigações contra os grupos criminosos envolvidos em estelionato. Ainda assim, até agora, segue sendo desafio estancar esse tipo de crime.
— É difícil ter única resposta. São alguns fatores. O primeiro deles, é que, como se trata de crime sem violência, sem grave ameaça, é difícil manter estelionatário preso. Segundo, não quero culpar a vítima, mas muitas vezes as pessoas enxergam vantagem fácil, lucro fácil. E, por outro lado, tem também a criatividade dos estelionatários. Estão sempre pensando numa fraude nova, golpe novo — analisa o delgado Fábio Motta Lopes, subchefe da Polícia Civil do RS.
Titular da Delegacia de Proteção ao Consumidor e substituto na de Repressão aos Crimes Informáticos e Defraudações, o delegado Joel Wagner entende que o aumento do uso de ferramentas online durante a pandemia trouxe facilidades, mas também abriu terreno fértil para os golpistas.
— Ainda estamos vivendo período excepcional, em razão da pandemia, que coincidiu com o aumento desses crimes. As pessoas tiveram que se adaptar, com mudanças que devem permanecer para a vida em geral, como o home office e tudo se resolvendo mais pela internet. Sempre digo que a criminalidade é dinâmica e se aproveita dessas brechas para cometer novos crimes — explica o delegado.
A procura por trabalho, que permita permanecer em casa, também é um nicho explorado pelos criminosos. Foi assim que uma empresa gaúcha de tecnologia, especializada em marketing digital, teve o nome utilizado por golpistas que ofertavam falsa vaga. Nela, os criminosos anunciavam, por meio do Facebook, emprego em home office, no qual só seria necessário enviar e-mails.
No entanto, após atrair as vítimas, o estelionatário solicitava que fosse realizado Pix de R$ 30 para dar seguimento ao processo seletivo. Após a transferência, informava que o candidato deveria aguardar novo contato. A empresa descobriu o golpe, quando passou a atender ligações de até 10 pessoas por semana, que acreditavam estar participando da seleção. Os casos, que vêm acontecendo desde fevereiro, seguem se repetindo mensalmente, inclusive em agosto.
— Como o valor cobrado pelos golpistas é de R$ 30, nesse caso, as pessoas acabam não registrando o boletim de ocorrência. E isso dificulta a investigação para conseguir chegar até os golpistas. A empresa não teve nenhuma lesão patrimonial, mas está tendo o nome utilizado por falsários. É muito importante mesmo que as pessoas que sofreram o golpe, efetuaram depósito em troca dessa falsa vaga de emprego, registrem ocorrência de forma online, ou na delegacia mais próxima. É simples e faz diferença — orienta a advogada Cristiane da Silva Barbosa, do jurídico da empresa.
A maior parte das vítimas seria de Minas Gerais, de onde também é a conta do golpista. A empresa, que preferiu não ser identificada, registrou o caso no RS e no outro Estado. Após o episódio, ao divulgar novas oportunidades de emprego, ainda passou a incluir nas redes sociais alerta para que os candidatos não caiam em golpes. Nele, informa que não cobra nenhum valor durante seleções, entrevistas ou contratação.
Golpe na internet
Embora os dados divulgados sejam até agosto, os criminosos seguem agindo. Em setembro, um casal de Alvorada se tornou vítima de golpe na compra de veículo pela internet. Os dois moradores da Região Metropolitana chegaram a viajar até Bento Gonçalves, na serra gaúcha, para retirar o carro. O primeiro contato aconteceu por meio de anúncio no Facebook - o Gol estava à venda por R$ 9,4 mil.
Uma das vendedoras repassou o número do WhatsApp de quem fecharia o negócio. O casal combinou de pagar entrada de R$ 2 mil. Depois do depósito, acertou com o rapaz indicado, que se identificava como Davi, que iria até Bento Gonçalves, três dias após o primeiro contato, para buscar o veículo. A agilidade com a qual o negócio foi concretizado empolgou os dois. Na terça-feira, dia 21 de setembro, partiram em viagem até a Serra.
— Uns 10 minutos antes de chegarmos no destino, vimos que ele tinha bloqueado o nosso número no Whats. Estranhamos, mas seguimos o caminho — recorda a mulher, que também preferiu não ser identificada na reportagem.
Ao chegarem na concessionária, descobriram que tudo não passava de uma farsa. Quando questionaram sobre Davi, foram informados que não havia funcionário com este nome ali. A própria loja já havia recebido outras vítimas do mesmo golpe. Os criminosos passaram a utilizar a identificação da revenda para enganar pessoas.
Ao ser procurada pelo casal sobre o caso, a vendedora, com quem tinham acertado a negociação na internet, afirmou que não sabia que se tratava de golpe e que tinha sido contratada para fazer o anúncio do veículo, mas também não havia recebido. O caso foi registrado na Polícia Civil de Bento Gonçalves, onde é investigado.
Desconfiar sempre
Na internet, a principal dica é desconfiar de quem está do outro lado, fazendo a oferta. Especialmente nos casos em que há pressa em concretizar a negociação e a vantagem é atraente. Muitos dos crimes são cometidos por golpistas que estão dentro da cadeia e conseguem encontrar uma forma de ter lucro rápido e fácil.
— Se tomar cuidados básicos, pode evitar. No caso do WhatsApp, por exemplo, basta ligar para a pessoa, entrar em contato. Saber se ela trocou mesmo de telefone e se é ela que está pedindo. A regra é sempre desconfiar de tudo. Não cair em ofertas vantajosas. Se cercar de cuidados — afirma o delegado Wagner.
Se tomar cuidados básicos, pode evitar. No caso do WhatsApp, por exemplo, basta ligar para a pessoa, entrar em contato. Saber se ela trocou mesmo de telefone e se é ela que está pedindo. A regra é sempre desconfiar de tudo. Não cair em ofertas vantajosas. Se cercar de cuidados
JOEL WAGNER
Delegado da Polícia Civil
Mas não só dos golpes cometidos pela internet ou telefone vivem os golpistas. Mesmo as trapaças mais antigas, conhecidas, como o golpe do bilhete, do falso sequestro ou do motoboy (cartão clonado) seguem fazendo vítimas no Estado. A regra geral, segundo a polícia, é desconfiar de ofertas vantajosas, ou mesmo de contatos de pessoas desconhecidas. (Confira outras dicas a seguir).
— Não existe lucro fácil. Se o carro que custa R$ 100 mil está sendo oferecido por R$ 60 mil, desconfia. É importante quer as pessoas fiquem mais atentas. Viemos buscando bloquear contas, sequestrar bens, (dos grupos criminosos), para tentar reaver o patrimônio da vítima. Mas estelionatários usam muitos “laranjas”, que recebem valores em suas contas. É difícil de rastrear o dinheiro. A forma mais eficiente de diminuir é informar a população, e evitar o golpe — alerta o subchefe da Polícia Civil.
*Produção Henrique Abrahão
Golpes comuns
Compra e venda pela internet
Há variações envolvendo esse tipo de negociação, desde pessoas que copiam anúncios de outros vendedores, e desaparecem com o dinheiro das vítimas, como aqueles que demonstram interesse por adquirir algo e fingem realizar o pagamento por transferência bancária. Quando a vítima se dá conta, o bem já foi levado e o dinheiro não foi repassado.
Nudes
Neste tipo de crime, que é considerado extorsão, embora também seja uma espécie de golpe, o criminoso usa perfil falso em redes sociais (geralmente, fingindo ser uma jovem atraente) e faz contato com homens. Durante a conversa, há troca de imagens íntimas, os chamados nudes. Com elas em posse, o golpista passa a fingir ser o pai da jovem, e afirma que ela é menor de idade, e que levará o caso à polícia. Há variações, nas quais finge ser advogado ou mesmo policial, para extorquir dinheiro.
WhatsApp: clonagem ou cópia
O aplicativo também é um meio usado pelos criminosos para tentar obter dinheiro falso. Existem duas variações envolvendo as contas do WhatsApp. Em uma delas, os bandidos conseguem capturar a conta da vítima. Para isso, tentam acessar de outro aparelho e a vítima recebe o código no celular.
Depois disso, é contatada por alguém que usa desculpas para descobrir o código. Pode fingir que é um código promocional, ou mesmo dizer que é de algum site, onde foi realizado anúncio pela pessoa, e quer se certificar que aquele telefone é dela.
Após capturar a conta, o golpista passa a pedir dinheiro para os contatos salvos. Em uma variação desse crime, os criminosos nem capturam a conta, mas usam outro telefone, com a fotografia da vítima, e entram em contato com amigos e familiares, fingindo ter trocado de número e pedindo dinheiro.
Site falso
Bandidos criam sites falsos de venda de mercadorias (eletrônicos, eletrodomésticos, etc). Para isso, usam nomes semelhantes ao de empresas conhecidas, alterando parte do endereço eletrônico. A vítima clica na oferta atraente, acreditando que se trata mesmo do site e acaba sendo enganada. Pode servir tanto para capturar dados, como para ficar com o dinheiro.
Dicas
- Acesse a cartilha da Polícia Civil para se informar sobre os principais golpes.
- Não acredite em desconhecidos que lhe abordam na rua ou por telefone. Não acesse links na internet dos quais não tem segurança. Desconfie.
- Promessa de recompensa é uma das principais estratégias usadas pelos golpistas para atrair as vítimas. Suspeite.
- Converse com familiares, amigos ou mesmo gerente de banco se tiver desconfiança. Estelionatários tentam criar meios de impedir que a vítima busque orientação, como mantê-la ao telefone, para que não seja alertada.
- Não faça depósitos bancários e nem recargas de celulares para quem não conhece.
- No caso dos leilões, verifique se os leiloeiros estão cadastrados junto ao Judiciário. As contas para depósito em leilões oficiais não são de pessoa física ou jurídica e, sim, judicial.
- No WhatsApp, habilite a verificação em duas etapas e não forneça esse tipo de código por telefone. Mas, caso já tenha sido vítima, tente rapidamente deletar o aplicativo, baixar e registrar novamente. Caso isso não funcione, se o PIN for solicitado, insira o número errado até que o app seja bloqueado temporariamente. Avise seus contatos, por meio das redes sociais ou pessoalmente, sobre o risco de alguém pedir dinheiro em seu nome. Comunique a clonagem por e-mail ao WhatsApp (support@whatsapp.com) para que a conta seja bloqueada. O mesmo cuidado vale para outros aplicativos - de compras e bancos - que tenham o recurso de verificação em duas etapas.
- Em alugueis de imóveis, desconfie de preços abaixo do mercado, se o dono exigir adiantamento e tiver pressa para que o depósito seja feito ou mesmo se o proprietário não aceitar atender a ligações ou se recusar a receber visita do locatário, para conferir a casa.
- Se receber contato por telefonema ou mensagem de familiar pedindo ajuda, certifique-se de que é real. Converse com outros parentes antes de fazer qualquer depósito.
- Se estiver vendendo algo, não entregue o bem antes de ter certeza de que recebeu o valor do pagamento. Depósitos só são confirmados pelo banco após a conferência do envelope. Então, aguarde para enviar a mercadoria.
- Se for vítima, chame a Brigada Militar ou vá até a Polícia Civil. Tente repassar aos policiais o máximo de informações sobre os golpistas.
Fonte: Polícia Civil-RS