Os quatro homens mortos por um policial militar dentro de uma pizzaria em Porto Alegre foram atingidos com tiros na cabeça e a curta distância. Um deles foi ferido no rosto e na palma da mão, o que sugere que "tenha esboçado algum movimento de tentativa de defesa". As informações estão nos laudos produzidos pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) das quatro pessoas da mesma família mortas no final da madrugada de 13 de junho. Os disparos aconteceram após uma discussão com o soldado Andersen Zanuni Moreira dos Santos, 25 anos.
Os documentos aos quais GZH teve acesso apontam que Alexsander Terra Moraes, 26 anos, foi ferido com tiro na cabeça, no abdômen e na palma da mão. A necropsia diz que "as características dos ferimentos presentes na mão e na face sugerem que foram gerados por um único projetil, com trajeto em chuleio" (quando um único projetil é capaz transfixar várias partes do corpo), o que sugere tentativa de defesa. Cristiano Lucena Terra, 38 anos, levou disparo na cabeça, de cima para baixo. Christian Lucena Terra, 33 anos, foi alvejado na região temporal, também na cabeça, próximo à orelha esquerda. Já Alisson Corrêa Silva, 28 anos, foi ferido na testa. As marcas demonstram, conforme o IGP, que os tiros foram efetuados a curta distância ou à queima-roupa.
Os ferimentos de Alexander levaram os peritos a concluir de que ele foi baleado dentro do banheiro da pizzaria ou próximo da porta de acesso. Pela posição que estavam as outras três vítimas, não é possível determinar se os três estavam em direção ao interior do banheiro ou se caminhavam em sentido contrário no momento dos disparos. Foram localizados seis estojos munição de calibre .40, no interior do banheiro, e três projetis _ um entre as vítimas, um no banheiro e outro no piso da cozinha.
Para o advogado da família Ismael Schmitt, a análise dos laudos reforça a narrativa das duas mulheres que estavam junto às quatro vítimas no momento das mortes:
— A conclusão dos peritos do IGP sugere que eles morreram em cristalino movimento de defesa. Foi uma verdadeira execução.
Responsável pela investigação, a 5ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) concluiu que o soldado agiu em legítima defesa e, por isso, não o indiciou pelas mortes. Quando o inquérito foi remetido ao Judiciário, em 30 de junho, o laudo pericial ainda não havia sido concluído pelo IGP. Agora, o inquérito e o laudo são analisados pelo promotor André Martinez.
O caso
Na madrugada das mortes, ao procurar a ex-namorada depois de sair de uma festa em Alvorada, Andersen entrou em uma confraternização da família Lucena no Morro Santana, em Porto Alegre. Ele deduziu que a ex pudesse estar no local, desentendeu-se com que estava na casa e foi seguido 180 metros por seis pessoas até uma pizzaria na Zona Norte, na Avenida Manoel Elias.
No relatório final, o delegado da 5ª DHPP Gabriel Lourenço aponta que ao ser localizado pelas vítimas dentro da pizzaria, Andersen se identifica, pede para se afastarem enquanto está escondido no banheiro do delivery. Alexsander, segundo a polícia, tenta retirar o PM do banheiro. O soldado resiste e utiliza um armário cinza, que está dentro do banheiro, como barreira. "É possível observar que o armário situado no interior do banheiro se movimenta em virtude dos empurrões do grupo. A esta altura, Andersen estava prestes a ser capturado pelos homens", afirma o delegado no relatório.
As duas mulheres também tentam entrar no banheiro e logo depois se assustam com o primeiro disparo. "A partir deste momento, o que se vê pelas imagens é o grupo de homens não recuando, mas sim avançando em direção ao policial, que torna a atirar contra as vítimas a fim de salvaguardar sua própria vida, culminando com a neutralização da ameaça", escreve Lourenço.
O delegado também considera que o banheiro, usado pelo policia para se refugiar, era "extremamente pequeno e não apresentava qualquer alternativa para que o autor continuasse fugindo e evitando os disparos de arma de fogo, de modo que esta passou a ser a única escolha que poderia ser tomada pelo agente para sobreviver."
Em 5 de julho, Andersen virou réu por outro caso: suspeita de estupro de uma jovem de 20 anos. O abuso aconteceu, segundo investigação da Polícia Civil, na noite do dia 9 de janeiro deste ano na casa dele em Gravataí, na Região Metropolitana, durante uma festa e tem outros dois PMs como acusados. Andersen e os colegas negam o crime.
Contraponto
O que diz David Leal, advogado de Andersen Zanuni Moreira dos Santos:
"A defesa entende que ficou bastante claro pelas imagens que todo os atos por parte do Andersen foram voltados para evitar os disparos. Não houve em momento algum qualquer interesse dele no combate. Ele poderia ter disparo antes e não o fez, fugiu do conflito, preferiu a conduta mais pacífica e correu até a pizzaria para se esconder. E evitar novamente o conflito. Os envolvidos insistiram na conduta hostil que apresentaram desde o início e buscaram vingança por um acontecimento banal, que foi o fato dele entrar entrado no pátio da casa deles. Insistiram nisso e inevitavelmente o Andersen teve que disparar. As imagens demonstram de forma clara o que aconteceu e veio a perícia apenas a confirmar de forma técnica que se trata legítima defesa."