Os filhos do policial rodoviário federal morto em uma ação da Brigada Militar, em Torres, não estavam em uma padaria onde aconteceu outra confusão também na madrugada de segunda-feira (23). A afirmação é do proprietário do estabelecimento que conversou com GZH na tarde desta terça-feira (24) na condição de anonimato. A padaria funciona 24 horas na área central da cidade.
O relato do empresário confere com as imagens de câmeras do local, às quais a reportagem assistiu, mas não tem autorização para divulgar. Os vídeos já estão com a Polícia Civil. Dois jovens e um homem de meia-idade chegaram em um Gol branco, por volta da 1h15min. Um deles entrou na padaria sem máscara e comprou 15 latões de cerveja. Ao ingressar na padaria, foi orientado por um funcionário a se retirar para ser atendidos na porta.
— Aí um deles tentou criar caso, discutiu, tentou meio que forçar para entrar. Ficaram discordando, um deles fez jeito para brigar. O funcionário disse o valor que havia dado, levou a máquina de cartão e ele a arrancou da mão do atendente, falou mais umas bobagens. Na hora de se despedir, colocou a mão na nuca do funcionário, meio que quis bater, quis intimidar — afirma o proprietário.
O homem que ingressou na padaria aparece nas imagens com moletom amarelo, boné branco e calça jeans clara. O outro jovem estava de camiseta azul marinho, bermuda jeans e chinelo preto. O homem de meia-idade vestia camisa azul, bermuda e chinelo branco. Uma câmera do lado externo da padaria mostra o trio sorrindo, brincando e fazendo gestos obscenos quando uma jovem passou por eles.
Depois da compra, saíram com Gol branco cantando pneu, quase colidindo ao cordão do canteiro da Avenida José Bonifácio, segundo o proprietário. Instantes depois, chegou uma guarnição da BM para fazer uma compra, e o atendente citou o que havia acabado de acontecer:
— Ele disse que tinham saído três caras daqui, que estavam agressivos, alterados, tentaram entrar sem máscaras. O pessoal perguntou onde eles estavam e avisamos que era um Gol branco.
Horas depois, souberam da confusão na Rua Borges de Medeiros, ao lado do prédio do apartamento da família Zortea, que fica a quatro minutos de carro do endereço da padaria.
— Vendo as imagens, é nítido que não eram eles. Se tratavam de dois rapazes jovens e o veículo era parecido. A roupa era diferente. Conhecemos o Zortea e os filhos dele, esses eram bem diferentes.
Vendo as imagens, é nítido que não eram eles. Se tratavam de dois rapazes jovens e o veículo era parecido. A roupa era diferente. Conhecemos o Zortea e os filhos dele, esses eram bem diferentes.
PROPRIETÁRIO DA PADARIA
Prefere não se identificar
Segundo o proprietário, a padaria não ligou para o 190, já que uma guarnição passou no estabelecimento. O relato se opõe à versão inicial da BM, de que teria recebido o chamado de perturbação da ordem pública perto de uma padaria e de que os filhos do PRF estariam provocando confusão nesse estabelecimento e na rua.
A abordagem aos irmãos Fábio Augusto Zortea e Luca Zortea acabou na morte do policial rodoviário federal aposentado Fábio Zortea, 59 anos, que tentou defender os filhos. Fábio, que tem o mesmo nome do pai, foi baleado em uma das pernas e segue internado no hospital Nossa Senhora dos Navegantes.
Zortea foi sepultado nesta terça-feira em Torres sob aplausos da comunidade e homenagens dos colegas.
Fábio e Luca Zortea chegaram a ter a prisão em flagrante decretada na madrugada de segunda-feira, decisão revogada na manhã desta terça juíza Marilde Angélica Webber Goldschmidt, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Torres.
"Não compactuo com coisas erradas", diz comandante-geral da BM
Questionado sobre a versão do proprietário da padaria, o comandante-geral da BM, coronel Vanius Santarosa, afirma que o resultado da ocorrência não é aceitável e que a ação será alvo de investigação "séria, idônea e rígida" dentro do Inquérito Policial Militar (IPM). Os cinco PMs envolvidos foram afastados — o que é comum apenas em casos graves.
— Me solidarizo com a dor da família. Não compactuo com coisas erradas. Vamos apurar todos os fatores que contribuíram para esse desfecho trágico. Não vou entrar no aspecto de que se houve abuso, pois eu terei que decidir sobre o inquérito. Não vou adiantar meu posicionamento. Ali tem coisas equivocadas em todos os aspectos. São muitas falhas que culminaram num resultado trágico. Vamos remontar a dinâmica do passo a passo do que aconteceu — disse.