Em 14 de janeiro deste ano, ainda preso, Wanderlei da Silva Camargo Júnior foi ouvido pelo Judiciário. Ele é réu por cinco ataques com ácido na zona sul de Porto Alegre em junho de 2019. O suspeito, natural de Esteio, na Região Metropolitana, mas morador de Curitiba, no Paraná, foi preso em outubro do ano passado — atualmente ele responde em liberdade ao processo. Quando interrogado, admitiu ter arremessado o líquido em duas pessoas, no mesmo dia, mas negou os outros casos.
No depoimento, Wanderlei confirmou que o objetivo era assustar a família da ex-companheira, para que eles decidissem ir residir com ele no Paraná, onde mantinha uma agência de turismo estudantil. O réu afirmou, no entanto, que outra pessoa teria sido responsável pelos outros três ataques. Um deles, considerado o mais grave, deixou lesões graves no rosto de uma das vítimas. O depoimento na íntegra foi obtido por GZH em consulta ao processo no site do Tribunal de Justiça. Confira trechos do interrogatório:
Juíza Carla Fernanda De Cesaro Haass - Como aconteceram esses ataques?
Wanderlei - Então, assim, eu fiz três ou quatro cartas, dizendo assim: "Você tem que jogar líquido em alguém", alguma coisa assim, então eu deixei duas cartas em dois HB20 e duas cartas em duas bicicletas...
Juíza - Para pessoas que o senhor não conhecia?
Wanderlei - Para pessoas que eu nunca conhecia, os dois HB20 foi naquela região ali da Campos Velho mesmo, larguei as duas cartas no painel...
Juíza - Dizendo o quê?
Wanderlei - Dizendo para essas pessoas fazer, jogar algum produto que poderia ser cloro, hipoclorito ou ácido, alguma coisa assim, nas roupas das pessoas...
Juíza - Tá bem.
Wanderlei - Senão iria acontecer alguma coisa, sei lá, era tipo uma ameaça assim sabe? Na realidade era mais para realmente assustar, não achando que essas pessoas iriam fazer, tá. Mas para realmente ter algum fato que realmente acontecesse, que repercutisse dois fatos eu fiz, que foi lá da Santa Flora que eu joguei no casaco do menino, tá, que foi o frasco que o delegado apreendeu, um frasco azul, com a intenção de não machucar, joguei, até testei em mim o ácido aqui (mostrando a mão).
Juíza - Quantas vezes o senhor jogou esse ácido?
Wanderlei - Eu joguei uma vez...
Juíza - Nessa Francisca Prezzi, num menino?
Wanderlei - Na Francisca Prezzi num menino e na outra moça.
Juíza - Nessa mesma rua?
Wanderlei - Na mesma rua, em questão de 10 minutos, joguei na roupa. E logo depois retornei, só que nessas quatro cartas ali dizia que as pessoas tinham que jogar entre o dia 20 e 21 na rua Dona... como é o nome da rua lá? Aonde mora a irmã dela, da (cita nome da ex).
Juíza - Aonde aconteceu o fato? Na Santa Flora?
Wanderlei - Isso, nessa Santa Flora.
Juíza - Foi o senhor que jogou nesse local?
Wanderlei - Não, nesses aí não fui eu, de bicicleta não fui. Falam que foi cinco casos, até um ponto de parada de ônibus não sei se tem aí no laudo, mas até me perguntaram eu disse: "Oh, não sei de ponto de ônibus nenhum", eu toquei lá no rapaz da Santa Flora e na moça.
Juíza - Quantos ataques o senhor fez nessas vítimas?
Wanderlei - Eu fiz dois.
Promotora Fernanda Ruttke Dillenburg - Qual era o seu objetivo final?
Wanderlei - O objetivo final era fazer tipo aquilo que seria o último recurso, que a gente tinha falado com a (ex-companheira) de criar alguma situação para que a (filha dela) realmente desistisse e aceitasse ir morar em Curitiba.
Advogado Wellington Alves Ribeiro - Você teve a intenção de causar mal, de ferir alguém?
Wanderlei - Nunca, de jeito nenhum. Eu até se ver uma formiga caminhando no chão, desvio. Nunca atropelei nenhum cachorro nem nada. Se eu atropelar ou matar qualquer bicho, vou me sentir mal, porque nunca fiz mal para ninguém na vida. Ao contrário, só de ajudar.
O caso
- Entre os dias 19 e 21 de junho de 2019, cinco pessoas foram vítimas de ataques com líquido ácido nas ruas Santa Flora, no bairro Nonoai, e Francisca Prezzi Bolognesi, no bairro Hípica, na zona sul de Porto Alegre.
- Em quatro dos cinco casos, o agressor estava em um HB20. A identificação do carro e a descoberta de que tratava-se de um veículo alugado foi essencial para que a Polícia Civil chegasse ao suspeito do crime.
- Durante a investigação, os policiais chegaram ao nome do empresário Wanderlei da Silva Camargo Júnior. Ele foi preso em Curitiba, no Paraná, no dia 4 de outubro do ano passado.
- Wanderlei deixou o Presídio Central no dia 25 de março em meio à pandemia de coronavírus. Segundo a decisão judicial que revogou a prisão preventiva, ele sofre de hipertensão e faz parte do grupo de risco da covid-19.