Um intenso tiroteio entre a Polícia Militar e traficantes interrompeu uma doação de cestas básicas na Cidade de Deus, favela da zona oeste do Rio de Janeiro, no fim da tarde desta quarta-feira (20). Um jovem de 18 anos, morador da comunidade, foi atingido e morreu.
A Frente Cidade de Deus contra a Covid-19 distribuía 200 cestas básicas na região conhecida como Pantanal, quando foi surpreendida pela entrada do caveirão na favela.
Um forte tiroteio teve início e a equipe teve que se abrigar na casa dos moradores. Quando o confronto cessou e os ativistas puderam deixar as casas, viram que um jovem havia sido baleado.
Segundo relatos de membros da Frente Cidade de Deus, João Vitor Gomes da Rocha, 18 anos, foi levado pela Polícia Militar para o hospital municipal Lourenço Jorge, mas não resistiu.
Em nota, a PM disse que a operação foi realizada para checar denúncias sobre o tráfico de drogas na comunidade. Nas redes sociais, a corporação afirmou que o jovem que morreu era criminoso e estava armado.
"Apontaram armas para nós enquanto tentávamos entrar no carro. Somos todos da Cidade de Deus, educadores, trabalhadores locais, artistas. A gente não tem direito de entregar comida, a gente não tem direito a cuidar dos nossos. A gente não tem direito a nada", escreveu o conselheiro tutelar Jota Marques no Twitter.
Também nas redes sociais, outro ativista da equipe questionou: "Se essa nova polícia do RJ tem o maior serviço de inteligência de todos os tempos e se o drone estava lá desde cedo não é possível que não viram uma ação comunitária gigante? Vocês usaram a nossa ação de escudo para entrar na favela?".
Essa foi pelo menos a segunda vez em que uma ação de distribuição em meio à pandemia do novo coronavírus foi interrompida nas favelas do Rio diante de uma operação da Polícia Militar.
No dia 30 de abril, ativistas do Complexo do Alemão, zona norte da cidade, disseram que a PM deu início a uma troca de tiros após confundir um caminhão de doações com um veículo roubado. A equipe, mais uma vez, precisou se abrigar na casa de moradores.
"O caminhão das entregas já tinha estado na favela da Galinha de manhã. Voltou para reabastecer com mais cestas básicas e material de higiene. Quando voltaram ao local, a equipe foi surpreendida pela operação para 'resgate de caminhão roubado'", escreveu o ativista Raull Santiago no Twitter, na ocasião.
As polícias têm insistido nas operações, muitas vezes com mortes, mesmo em meio à pandemia da covid-19 e à necessidade de distanciamento social.
Na segunda-feira (18), uma ação da Polícia Federal e da Polícia Civil em São Gonçalo resultou na morte do menino João Pedro Matos Pinto, 14 anos, que brincava dentro de casa. Pessoas que foram ao local na terça (19) relataram que há cerca de 70 marcas de tiros nas paredes.
O caso gerou muita comoção, especialmente porque os familiares procuraram o menino durante toda a madrugada de terça, até que foram informados que João estava morto.
Após ser atingido, o jovem foi levado de helicóptero pelos policiais para uma base do Grupamento de Operações Aéreas do Corpo de Bombeiros, na zona sul do Rio, a 18 quilômetros em linha reta, mas já chegou morto, segundo os bombeiros.
A família foi impedida de entrar no helicóptero e não recebeu nenhuma informação sobre o menino. O óbito foi constatado por volta das 15h15min de segunda, mas o corpo só chegou ao Instituto Médico Legal (IML) de São Gonçalo às 4h de terça, o que os parentes descobriram através de funcionários da unidade.