O advogado que fala em mensagem de voz com um detento para oferecer pedido de soltura por R$ 2 mil por causa da pandemia do coronavírus conversou com GaúchaZH nesta sexta-feira (3) e negou ter cometido qualquer irregularidade.
Conversas dele e de outro advogado circularam em grupos e acabaram enviados à Polícia Civil, Ministério Público e Corregedoria da Justiça. O teor de algumas mensagens indica que haveria um esquema de uso de atestados médicos falsos para favorecer a soltura de presos condenados ou provisórios como se fossem de algum grupo de risco.
Ao confirmar que pelo menos um dos áudios que circulam e que estão com as autoridades é de sua autoria, Antenor Colombo Neto, explicou:
— Tive conversas com cliente que me perguntou sobre o coronavírus, estava muito apreensivo, tem HIV, queria saber se tinha alguma medida. Conversei dando suporte quanto a fundamentação jurídica que usaria. Quando a gente manda um áudio para um cliente, o áudio voa. Ele passou para outros amigos dizendo "ó, meu advogado está conseguindo, vai conseguir retorno em tanto tempo". Daí um passou para sua advogada cobrando que ela não conseguia (soltura) e outros advogados estavam conseguindo.
Colombo Neto afirma que a advogada teria repassado o áudio dele a outras pessoas:
— Ela ficou ficou muito braba e divulgou meu áudio. Ela divulgou no intuito de dizer que eu estava pressionando os clientes dela a cobrarem dela uma resposta rápida. Porque no meu áudio eu dizia que conseguia (decisão de soltura) em 48 horas. E começou a divulgar esse áudio meu atrelado a outros que fazem coisas erradas, que prometem coisas ilícitas, que falam de coisas ilícitas. Não tenho qualquer ligação. Tenho toda a conversa aqui que falei com meu cliente. Não tem nada de errado.
Na quinta-feira (2), GaúchaZH e a Rádio Gaúcha revelaram o teor de áudios que estão sob análise da Polícia Civil e do Ministério Público. A conversa na qual Colombo Neto diz ter tido com um cliente é:
"Claro, claro. Eu sei, eu sei sim. Tudo bem, Pablo? Eu tô cobrando para os meus clientes o valor de R$ 2 mil para fazer os pedidos de liberdade. Eu peguei sete processos e consegui tirar seis clientes. Dois deles tinham condenação de homicídio e outro de estupro, e os outros são tráfico e receptação. Todos eu consegui colocar em casa por causa do coronavírus. Eu tô passando a minha conta para os clientes, os clientes estão fazendo transferência, eu já entro com o pedido. Ontem eu soltei dois, ao longo da semana eu soltei os outros. Vamos ver se essa semana, eles estão dizendo que vão liberar até quarta ou quinta-feira. Nós vamos ter que entrar o mais rápido possível. Eu estou avisando para todo mundo que eu conheço, se quiser que eu entre, né, que é a única chance que a gente tem é essa".
Segundo o advogado, esse áudio se espalhou no presídio e outros detentos tiveram interesse no serviço. GaúchaZH teve acesso a outra conversa em que ele questiona familiares de um preso sobre se a "advogada deles" conseguiu a soltura:
— Tudo bem, boa tarde. Só liguei para saber se tiveram algum retorno da advogada de vocês, um alvará, alguma coisa assim? Eu, graças a Deus, estou com dois alvará que consegui no final de semana, consegui no plantão, meus clientes estão indo embora para casa. Se vocês quiserem, posso mandar inclusive o alvará para vocês darem uma olhada, foi conquistado agora no plantão. Queria saber se ela conseguiu, se deu tudo certo para vocês.
Segundo Colombo Neto, quando é procurado por alguma pessoa questionando a respeito de um processo, sobre o que pode ser feito, ele explica os procedimentos. Quanto ao áudio em que um homem, que seria advogado, afirma que libertou um cliente em Camaquã usando laudo falso, ele disse desconhecer o caso e o suposto envolvido. O advogado afirmou ainda que entregará às autoridades todas as conversas que manteve com clientes.
O advogado disse que fez 25 pedidos de soltura ou prisão domiciliar, sendo que 23 para clientes que já atendia. Segundo ele, em apenas três casos foram usados laudos médicos.
— Falei com as famílias e pedi exames antigos até. Quem tem doença crônica, tem sempre —explica o advogado.
Dos pedidos, ele teria tido sucesso em seis casos.
As suspeitas estão sob investigação de uma força-tarefa do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e do Ministério Público. Também tramita expediente na OAB/RS para apurar todas as suspeitas: para saber se Colombo Neto tentou mesmo cooptar clientes de colegas e também sobre advogados estarem usando documentos médicos falsos.