Acostumados a ingressar nas prisões durante rebeliões que resultam em destruição e mortos, os agentes da Força de Cooperação do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) enfrentam no Rio Grande do Sul um cenário diferente. Nesta quinta-feira (2), 31 integrantes do grupo especializado foram deslocados para o Presídio Regional Bagé, onde foi confirmado na segunda-feira (30) o primeiro caso de coronavírus no sistema prisional do Estado.
— A nossa especialidade é a intervenção. É entrar naquele cenário de catástrofe, que ninguém consegue. A Força de Cooperação possui os melhores operadores de sistema prisional do Brasil. Mas essa situação de pandemia é singular. Não estamos enfrentando rebeliões. Estamos num cenário muito complexo para se atuar, onde a gente combate um inimigo invisível — afirma o coordenador institucional da Força de Cooperação no RS, Claudevan Costa.
No município da Campanha, os agentes estão atuando em três frentes. A primeira delas é a segurança da casa prisional, que mantém atualmente 544 detentos para 430 vagas, segundo a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). A vigilância é realizada do lado externo da cadeia, já que dentro da unidade o controle segue feito por agentes locais. O ingresso só será realizado se for necessário, em caso de motim, por exemplo. A segunda área de atuação da força-tarefa será o ensino. Esses agentes estão habilitados para ajudar na capacitação dos outros servidores, com cursos sobre técnicas penitenciárias. Os primeiros serão realizados na próxima semana.
Mas o trabalho da força-tarefa não ficará somente no entorno do presídio. Ainda nesta sexta-feira (3), entre 22h e 6h de sábado, os agentes penais participarão de ação que busca orientar os moradores de Bagé, em parceria com a Defesa Civil e a Vigilância Sanitária. Para atuar nesse cenário de pandemia, eles também passaram por treinamento, com palestra sobre formas de prevenção contra a contaminação.
— A ideia é que parte da equipe auxilie orientando as pessoas para que fique em casa, para que, na medida do possível, obedeça ao isolamento social. Também estamos fazendo na unidade um diagnóstico sobre a contaminação. Realizamos entrevistas com os servidores. Não assumimos a administração prisional. Viemos para ajudar o Estado a resolver os problemas, auxiliar no que for preciso — explica Costa.
A Força de Cooperação Penitenciária é composta por agentes que fazem parte de grupos especiais de vários Estados do Brasil. Participam da operação no RS servidores da Bahia, Mato Grosso, Goiás, Paraíba, São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará. Eles chegaram ao Estado no início de março com a missão de evitar uma possível reação das facções criminosas, por conta da transferência de 18 líderes desses grupos para penitenciárias federais. Mas com o avanço da pandemia, a atuação acabou ganhando novas prioridades.
No início dessa semana, foi confirmado em Bagé o primeiro caso de covid-19 dentro do sistema prisional do RS. O preso foi encaminhado para prisão domiciliar, com uso de tornozeleira eletrônica. O fato exigiu que fossem isolados cinco agentes da unidade, segundo a Susepe. Para manter a situação sob controle, a força-tarefa acabou deslocada para a Campanha.
— Estávamos em Porto Alegre, realizando visitas técnicas em várias unidades. Como houve o agravamento da covid-19 ficamos prontos para qualquer situação de emergência que pudesse causar instabilidade em alguma unidade do Estado. Aqui em Bagé, pelo que a gente pode ver, está um clima tranquilo. O prazo de permanência aqui é indeterminado. Podemos ser acionados em outra situação mais grave. Então nos deslocamos — relata Costa.
O RS teve o reforço autorizado pelo Ministério da Justiça em março, a partir de pedido do governo do Estado, como uma das medidas previstas na Operação Império da Lei. Com a transferência de 18 líderes de facções, havia a possibilidade de que as organizações criminosas se revoltassem. A previsão na portaria assinada pelo ministro Sergio Moro é de que eles permaneçam no RS pelo período de 60 dias, até 2 de maio.
Articulação
Assim como as demais prisões do Estado, o Presídio Regional de Bagé está com visitas suspensas desde o dia 23 de março. A medida é uma das adotadas pela Secretaria da Administração Penitenciária (Seapen). Apesar de necessária para controlar a circulação de pessoas, a restrição gera tensão no meio prisional.
No domingo, (29), na Fronteira Oeste, presos se rebelaram na Penitenciária Estadual de Santana do Livramento, queimaram colchões e subiram para o telhado. A ação teria sido motivada pela suspensão da entrada de sacolas levadas por familiares, com mantimentos – medida que acabou sendo suspensa na Justiça. O motim na casa prisional, que conta com menos presos do que em Bagé, 165 no total, já havia despertado a atenção do município da Campanha.
O prefeito de Bagé, Divaldo Lara, relata que, com a confirmação do primeiro caso dentro do sistema prisional, buscou junto ao governo do Estado apoio para a presença da força-tarefa no município. Havia preocupação que lá também pudesse acontecer uma reação dos presos.
— A situação aqui, onde o número de presos é bem maior, era de alto risco. Com tudo o que está acontecendo, não podemos permitir que aconteça um motim no presídio. Era uma bomba relógio, diante da revelação do caso de contágio. A qualquer hora poderia ter uma reação forte da população carcerária. Estamos agora estabilizados e contentes em poder contar com essa força. É menos um problema, diante do que estamos enfrentando —descreve.
A articulação junto ao Depen foi realizada pela Seapen do RS, que acertou o envio da força-tarefa para a Campanha.
— Além da já conhecida qualificação técnica, é notável a determinação da Força Nacional em colaborar com o Estado, neste momento tão duro — afirma o titular da Seapen, secretário Cesar Faccioli.
Nessa sexta-feira (3), conforme a Seapen, havia 15 presos com suspeita de coronavírus isolados. O único caso confirmado é o de Bagé.