Dois policiais militares do 20º Batalhão de Polícia Militar tiveram a prisão preventiva decretada nesta terça-feira (3) por suspeita de tortura e homicídio em Porto Alegre. Os dois já estavam presos de forma temporária pelos crimes investigados. Um terceiro agente também é suspeito, mas não houve pedido de detenção.
Em 4 de fevereiro de 2020, os dois PMs foram presos em decorrência de uma investigação da 5ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa. Segundo o delegado Luis Antônio Firmino, a vítima é um rapaz de 20 anos que foi abordado em uma rua do bairro Bom Jesus. Ele foi encontrado horas depois com marcas de espancamento às margens de um riacho no bairro Jardim Carvalho, também na zona leste.
O pedido de conversão das prisões foi feito pelo Ministério Público. Para a promotoria, a prisão preventiva era importante pelo fato de os suspeitos serem policiais e terem acesso a dados de todas as testemunhas, havendo risco de interferência na coleta de provas. Também pontuou que poderia haver risco à ordem pública.
O pedido do MP foi confirmado pela juíza Cristiane Busatto Zardo, da 2ª Vara do Júri de Porto Alegre.
O advogado dos PMs, David Leal, é contrário à prisão e declara que "não há elementos suficientes para a decretação da prisão preventiva". Confira a nota da defesa na íntegra no final desta reportagem.
Investigação
A investigação teve o término adiado pela delegacia de homicídios. Firmino explicou que aguarda a chegada de localização de GPS que mostraria onde estavam os policiais naquele dia. Também é esperado um laudo pericial que mostraria eventual resíduos de sangue ou humano na viatura apreendida.
No dia 26 de dezembro de 2019, investigadores da 5ª Delegacia de Homicídios localizaram um corpo com marcas de espancamento no beco Souza Costa, no bairro Jardim Carvalho. Não havia identidade da vítima nem testemunhas no local.
No dia seguinte à localização do corpo, uma ocorrência de desaparecimento foi registrada pela mãe de um rapaz de 20 anos. Às autoridades, a familiar relatou que vizinhos viram que o filho estava na rua, no bairro Bom Jesus, também na Zona Leste, na manhã de 26 de dezembro, quando foi levado por policiais militares do 20º Batalhão em uma viatura. O rapaz ainda teria dito aos presentes: "avisa a minha mãe que a Brigada me pegou". Desde então, o jovem nunca mais foi visto.
A mãe chegou a ir ao batalhão cobrar uma resposta, mas não existia nenhum registro de que seu filho tivesse sido conduzido em uma viatura. O procedimento habitual da Brigada Militar é registrar um boletim de atendimento, citando a abordagem a uma pessoa e sua identificação. Também não havia documentos sobre o fato em delegacias.
No mesmo dia em que a mãe registrou a ocorrência, por meio da coleta de digitais, o Instituto-Geral de Perícias (IGP) confirmou que o corpo encontrado no beco era do mesmo rapaz cuja familiar contava ter sumido após a abordagem da BM.
Confira a nota da defesa
O escritório Hoffmeister Leal, que defende dois dos PMs, enviou nota contestando as informações da Justiça. Confira na íntegra:
"Não há elementos suficientes para a decretação da prisão preventiva. Discordamos do despacho da magistrada. Acreditamos que em breve o Poder Judiciário poderá rever a decisão com base nos argumentos e informações fornecidas pela defesa dos dois policiais. No caso em questão, são três policiais militares investigados. Apenas dois tiveram a prisão temporária decretada, que foi convertida em prisão preventiva no dia 03/03/2020.
Porém, nos autos da investigação, não há indícios suficientes de autoria contra os nossos clientes. Até o presente momento, o que alicerça a prisão dos investigados é a palavra bastante titubeante de uma testemunha. No momento da acareação, essa mesma testemunha disse que não tinha certeza sobre a pessoa de um dos investigados. O problema todo é que esses policiais que ela procurou apontar atenderam a ocorrência no dia.
A testemunha associou o evento que disse ter visto às pessoas dos policiais que estão presos. Sabemos que esse é um local conflagrado (perigoso) e talvez por negligência do Estado esse rapaz não tenha sido socorrido a tempo. No dia dos seus interrogatórios na DHPP, os policiais negaram as hipóteses levantadas pelo delegado. Nos autos não há nada que aponte com segurança para os policiais a prática do crime.
Acreditamos que em breve os fatos serão esclarecidos mais adequadamente".