A Rua Ernani Behs, no bairro Hípica, virou um Big Brother a céu aberto. Na intenção de combater a criminalidade, moradores da via na zona sul de Porto Alegre se uniram para instalar câmeras de segurança. Há quatro meses, seis vizinhos colocaram oito equipamentos com ângulos de 94 graus que conseguem captar quase todos os 450 metros de extensão da rua. As imagens podem ser acessadas pelos aparelhos celulares da vizinhança.
A iniciativa partiu de Ulisses Padilha, 40 anos. Morador da Rua Ernani Behs desde 2007, ele é instalador de câmeras de segurança e sempre teve três no pátio da sua casa. Ao fixar um equipamento em poste de luz para captar movimentos da calçada, os vizinhos gostaram da ideia. Decidiram estender o monitoramento como uma forma de reprimir casos de violência. Cada um fez investimento de R$ 100 para a compra das câmeras e a instalação ficou por conta de Padilha. Até o momento, a parceria parece ter dado certo. Outros seis vizinhos já demonstraram interesse em fazer parte da "vaquinha do videomonitoramento." A intenção é cobrir toda a rua e evitar que haja algum ponto cego.
— Há dois anos eu tenho câmeras dentro do meu pátio. Ao instalar na calçada, a vizinhança se interessou. A nossa rua é calma, mas sempre ouvimos casos de violência no bairro, então, há o temor de que algo ocorra aqui.
Na casa de Padilha, funciona uma espécie de central de monitoramento da Rua Ernani Behs. A smart TV da sala é dividida em oito telas que mostram as imagens das movimentações da via em HD. O aparelho fica ligado 24 horas por dia e é usado exclusivamente para isso. Dentro de casa, virou hábito espiar a televisão para ver o que está ocorrendo do lado de fora.
— Não esperei acontecer algo para colocar câmeras. Estamos atuando na prevenção. Quem vê essas câmeras instaladas pensa duas vezes antes de fazer algo — avalia Padilha.
Os demais moradores acompanham as imagens no celular, por meio de um aplicativo. Podem escolher quais câmeras acessar e ver até quatro ao mesmo tempo. Também há possibilidade de assistir gravações de até duas semanas anteriores à data da consulta.
— Se alguém bate palma aqui na frente, a gente só sai para atender depois de ver a imagem — afirma Padilha.
Segundo os moradores, nos quatro meses em que as câmeras estão operando nenhuma ocorrência foi registrada na rua. Quando alguém percebe movimentação suspeita, seja na frente da sua casa ou na de um vizinho, faz um print da tela do celular e envia a imagem para o grupo da Rua Ernani Behs no WhatsApp, com 23 integrantes.
— Me habituei a olhar o celular de hora em hora. Quando tem criança voltando da escola, fico cuidando pela câmera. Se tem carro parado que a gente não sabe de quem é, já fica mais atento — afirma o operador de empilhadeira Reginaldo Torres, 50 anos.
Outra vantagem identificada por Torres é espiar as câmeras pelo celular antes de chegar em casa de carro à noite.
— Um pouco antes de entrar na rua, olho para ver se não tem nenhum movimento estranho. O maior medo é esse: alguém armado nos pegar chegando em casa. Me sinto muito mais seguro podendo ver antes como está a rua — admite Torres.
Se algum dos vizinhos viaja, o grupo todo é avisado e os demais ficam atentos.
— É um ajudando o outro — resume Torres.
Forças de segurança aprovam medida
Para o comandante do 21º Batalhão de Polícia Militar (BPM), responsável pelo policiamento dos bairros do extremo-sul da Capital, tenente-coronel Alex Severo, o monitoramento por câmeras de segurança auxilia tanto na prevenção do crime quanto na elucidação.
— A gente considera importante que a comunidade se preocupe com a sua segurança. O monitoramento é um elemento que ajuda a coibir, é um serviço de prevenção. Quando o delinquente enxerga as câmeras, eles já ficam reticentes porque sabem que serão filmados e identificados — explica.
A diretora-adjunta do Departamento de Comando e Controle Integrado (DCCI), delegada Eliana Paraíba Lopes, afirma que não há legislação específica que oriente este tipo de iniciativa. Uma portaria da Secretaria da Segurança Pública (SSP) de 2011 recomenda que a instalação seja feita com autorização do Estado.
— O Estado aprova e incentiva a participação do cidadão na questão da segurança. Estamos abertos para fazer termos de cooperação e convênios para fazer o cercamento eletrônico nessa comunidade — afirma.
A delegada diz que o Estado não pretende burocratizar a iniciativa das comunidades. Pelo contrário, explica que o DCCI pode orientar sobre os pontos mais críticos do bairro para casos de violência. Segundo Eliana, o órgão pode opinar e adequar, se necessário, as câmeras já instaladas:
— É uma ideia boa e tem de ser disseminada com análise técnica do Estado. Nós valorizamos a proatividade do cidadão. É uma forma até de proteger quem tem a iniciativa, já que há imagens das câmeras que podem afetar a intimidade ou a vida privada de outras pessoas.
Como funciona o "BBB" da Rua Ernani Behs
- Moradores contribuíram para compra das câmeras.
- O instalador de câmeras Ulisses Padilha, que é morador da rua, instalou nos postes e montou na sua casa uma "central de monitoramento", onde fica o gravador das imagens. Dali, ele pode acompanhar a movimentação das oito câmeras.
- Ele e os demais moradores também podem monitorar as movimentações da rua pelo celular, por meio de um aplicativo.
- Quando percebem movimentação suspeita, fazem um print da tela e enviam para o grupo de moradores no WhatsApp. Até agora, não precisaram chamar a Brigada Militar.
Onde buscar orientação
Departamento de Comando e Controle Integrado (DCCI), na Rua Voluntários da Pátria, 1358, no segundo andar. Telefone: 3288-7027.