Se o ingresso de presos em cadeias da Grande Porto Alegre seguir o mesmo ritmo dos 232 dias deste ano — de 1º de janeiro até 20 de agosto —, seriam necessárias apenas duas semanas para lotar as 600 vagas da Penitenciária de Sapucaia do Sul, ainda em construção. É isso que apontam dados da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) do Rio Grande do Sul. Desde janeiro até esta terça-feira (20), ingressaram nas cadeias da Capital e Região Metropolitana 10 mil detentos. Ou seja, a média é de 43 novos encarcerados por dia.
Em comparação com o mesmo período do ano passado, esse número é 28% maior. Entre 1º de janeiro e 20 de agosto de 2018, foram 7.790 presos nessas mesmas cadeias. No ano passado, o Estado chegou a 10 mil detentos somente em 14 de novembro — quase três meses mais tarde do que em 2019.
Na prática, isso não significa que o sistema prisional gaúcho tenha inchado nessa mesma proporção. Isso porque em 1º de janeiro, segundo a Susepe, o Estado contava com 40.041 presos e nesta terça-feira o número é de 42.260, ou seja 2.219 a mais. Para o titular da Secretaria de Administração Penitenciária, Cesar Faccioli, os números representam o exercício que precisa ser feito diariamente para acomodar os presos que necessitam ingressar no sistema.
— Estamos atuando em dois grandes eixos. Um deles é que estamos tentando dar velocidade aos processos de construção das novas casas, e estamos debatendo alternativas com o Poder Judiciário. E o segundo é a gestão, para o qual criamos um setor na Susepe, onde servidores ficam 24 horas monitorando o mapa prisional para, a cada liberação de preso, fazer o encaminhamento. Evidentemente que com esse crescimento exponencial das prisões, o cobertor é curto — afirma.
Os números divulgados não incluem os presos que ainda não chegaram nas cadeias, como aqueles custodiados pela Brigada Militar (BM) no Instituto Psiquiátrico Forense (IPF), em razão da falta de vagas. Nesta terça-feira (20), havia 239 detentos em delegacias e 90 custodiados em viaturas. Os casos de superlotação levaram o Tribunal de Justiça (TJ) e a secretaria a dar início a um processo de mediação, do qual participam a BM, Polícia Civil, Defensoria Pública, Ministério Público e a Susepe.
Faccioli afirma que, além da criação de novas vagas, uma das apostas da secretaria é este acordo com o Judiciário. Uma das propostas é instalar um centro de triagem em dois dos prédios do IPF e outra é provisoriamente aumentar o teto de lotação de algumas cadeias.
— Temos casas prisionais com o mesmo espaço e estrutura de engenharia, mas com diferença grande no número de presos. O que estamos propondo é que provisoriamente, em algumas casas, se levante esse teto para conseguir acabar com essa situação de presos em viaturas e delegacias — afirma.
Como o processo está em negociação, o secretário não quis citar possíveis locais onde isso pudesse ocorrer. O Rio Grande do Sul conta atualmente com capacidade para abrigar 25,5 mil presos. Desde o ano passado, foram abertas 630 novas vagas, com a inauguração da Penitenciária Estadual de Porto Alegre. Estão previstas, no regime fechado, mais 420 vagas na Penitenciária Estadual de Bento Gonçalves — prisão que deve ser inaugurada nos próximos dias — e 600 em Sapucaia do Sul, obra que deve ser finalizada até o fim do ano.
— Num comparativo, a cada 10 dias são encaminhados para o sistema penitenciário o equivalente a um presídio de Bento. Isso sem novas vagas, sem novas obras. Esse é o tamanho da nossa dificuldade — diz o secretário.
Nas prisões da Grande Porto Alegre estão 18 mil presos, segundo a Susepe, o que representa 42,5% do total de detentos no Estado. Destes, um terço foi encaminhado ao Presídio Central, 15% para a Penitenciária de Canoas (Pecan) e 12% para a Penitenciária Estadual de Porto Alegre. Os demais foram para outras prisões.
Os dados apontam ainda que, do total, 65% são vinculados à Vara de Execuções Criminais (VEC) de Porto Alegre e 30% à de Novo Hamburgo. Dos detentos que ingressaram nesse período, pelo menos, 43% possuem vínculo com alguma facção. Segundo a Susepe, nos anos anteriores esse acompanhamento não era feito diariamente, o que não permite ter comparativo por período mais longo.
BM e Civil atribuem aumento ao foco em crimes graves
Comandante-geral da Brigada Militar, o coronel Mario Ikeda acredita que o maior ingresso de presos no sistema prisional reflete resultado do trabalho das polícias.
— Muitas prisões que temos feito são por crimes mais graves, como tráfico de drogas e roubos de veículos, por exemplo. Temos focado nesses delitos, com objetivo de reduzir indicadores. Temos trabalhado especialmente dentro desses locais que têm maior incidência desse tipo de crime. Muitas vezes a BM faz a prisão, mas ele acaba saindo, não indo efetivamente para o presídio. Nesses casos, de maior gravidade, ele acaba realmente entrando para o sistema prisional.
O subchefe da Polícia Civil, delegado Fábio Motta Lopes, também acredita que o acréscimo pode estar relacionado às prisões consideradas por ele como "mais qualificadas". Ele afirma que, embora os grupos consigam se reestruturar para cometer delitos, como no tráfico de drogas, algumas prisões como de líderes, impactam mais na organização do crime.
— Estão sendo presas pessoas que ingressam e permanecem no sistema prisional. Não é o preso primário, que não tem antecedentes. Os números acabam mostrando isso. Isso demonstra que as polícias vêm qualificando as prisões. A partir do momento que retira de circulação alguém da quadrilha, em alguns casos é difícil de as estruturas se rearticularem rapidamente. Nesse caso, a retiradas das ruas e reclusão têm impacto na redução da criminalidade.
A reportagem pediu ao Tribunal de Justiça um posicionamento da Vara de Execuções Criminais (VEC) da Capital, mas até o momento os magistrados não se manifestaram.