O Instituto-Geral de Perícias (IGP) concluiu nesta semana o trabalho de apuração das lesões na jovem de 19 anos que teve o corpo marcado por objeto cortante no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, no dia 8 deste mês.
De acordo com o laudo, houve lesões superficiais, contínuas, uniformes e sem profundidade em região do corpo facilmente acessível pela periciada. O laudo sugere que os traços podem ter sido provocados pela vítima. Também é apontado que o ferimento teria sido provocado com consentimento dela, com a colaboração ou até mesmo de forma contrária à vontade da garota, mas sem esboço de reação.
"Conclui-se que a figura poderia ser mais facilmente produzida com o consentimento ou com a colaboração da própria periciada, ou, alternativamente, ao menos, com marcada incapacidade de ela em reagir, ainda que involuntariamente, aos estímulos que seriam esperados diante de uma agressão", aponta o laudo.
A polícia segue investigando o fato para comprovar a autoria, bem como para saber se foi marcada uma suástica ou um símbolo budista na barriga da mulher. Nesta terça-feira, a jovem foi indiciada por falsa comunicação de crime, com pena que varia de seis meses a um ano.
A advogada Gabriela Souza, que defende a jovem, disse que teve acesso ao laudo nesta manhã e que irá se manifestar após a análise do documento. Pelas informações que recebeu, ela comentou que uma das sugestões do IGP condiz com o depoimento da garota, de que ela não esboçou reação. Segundo a advogada, a jovem disse que teve um ataque de pânico e "apagou" durante a agressão.
Em um primeiro momento, o IGP fez uma análise para responder se houve ofensa à integridade corporal da jovem, para saber o tipo de instrumento, se houve asfixia ou uso de substância tóxica, se a vítima ficou incapaz para ocupações habituais ou se teve problemas motores, se houve perigo de vida e se ficou incapaz permanentemente para o trabalho. Depois disso, passou a verificar as marcas no corpo, uma espécie de suástica no lado esquerdo e uma cruz no lado direito da barriga.
Para a polícia, a mulher, que tem o nome mantido em sigilo pelas autoridades, disse que havia descido do ônibus e que foi ofendida por três homens pelo fato de estar com adesivos que indicavam sua orientação sexual e sua preferência em quem votar nas eleições. Ela alega que foi segurada por dois deles, enquanto um terceiro fez as marcas no seu corpo. No entanto, afirmou que não se lembrava da cruz e de mais detalhes por ter entrado em pânico.
Conclusões
Os peritos sugeriram uma comparação entre as imagens feitas pelo IGP e as imagens recebidas pela polícia para esclarecer todas as dúvidas. Eles também destacaram que não houve consentimento da jovem em prosseguir com o exame de corpo de delito na busca de outras possíveis evidências, principalmente pelo fato de que não havia elementos suficientes que indicassem um embate corporal. Ela não apresentava lesões, como, por exemplo, hematomas ou demais marcas na face, nas mãos e nos braços, que são sinais característicos de quem reage a uma agressão.
O laudo confirma as lesões, mas aponta que são escoriações superficiais, sem profundidade, uniformes, contínuas, em região do corpo de fácil acesso às mãos da própria vítima e que tiveram ainda um padrão de paralelismo. Os peritos indicam que houve um certo zelo e que os traços, que em determinado momento são mencionados como "arranhões", foram feitos de forma cuidadosa, ou seja, não condizentes com o ambiente descrito no depoimento, sugerindo que o agressor teve tempo ou teria muita habilidade. Em uma das partes da conclusão, é mencionado que um agressor, agindo de forma rápida, em plena rua e diante de provável resistência da vítima, teria dificuldades para fazer estas marcas paralelas e deixaria lesões mais profundas e menos uniformes.
"Pode-se concluir que as lesões tenham sido produzidas cautelosamente, de modo a não causarem dano às camadas profundas da derme, provocando alterações que são apenas superficiais. Não seria esperado produzirem-se lesões como estas, com as características das que foram evidenciadas neste exame de corpo de delito, por um agressor que agisse de forma tempestuosa e demasiadamente rápida, como se esperaria que fosse o caso em situações de agressões furtivas e em ambientes adversos", diz trecho do laudo.
Ao responder às questões iniciais apresentadas pela polícia, o IGP confirma que foi usado um objeto contundente, que pode até ter sido um canivete, e que há sinais compatíveis com lesões autoinfligidas, mas que não há ainda elementos de convicção para confirmar que foram autoprovocadas. A perícia sugere que a própria vítima fez as marcas, que ela consentiu ou colaborou, além da hipótese de terem sido feitas sem a vontade dela, mas mesmo assim sem esboço de reação. Não foi possível confirmar o uso de substâncias tóxicas ou até mesmo asfixia que pudessem neutralizar reações da jovem. O certo é que ela não apresentava outros tipos de marcas que indicassem imobilização.
A defesa da jovem se manifestou através de nota. O documento é assinado pela advogada Gabriela Souza.
Contraponto
Diante da divulgação de laudo pericial do Instituto Médico Legal (IML) referente ao ataque sofrido por uma jovem de 19 anos no último dia 8, em Porto Alegre, quando teve gravada no corpo uma suástica nazista, cabe esclarecer o seguinte:
1 - O teor do laudo assinado pelos peritos reafirma a convicção da defesa de que a jovem foi vítima de um ataque, conforme testemunhado por ela à Polícia Civil.
Atesta o laudo no item 3 - Conclusões:
“(...) As lesões verificadas apresentam, portanto, características compatíveis com as de lesões autoinflingidas, embora não haja, a partir exclusivamente dos resultados do exame de corpo de delito, elemento de convicção para se afirmar que efetivamente foram autoprovocadas. Nesse sentido, pode-se afirmar que as lesões foram produzidas: ou pela própria vítima ou por outro indivíduo com o consentimento da vítima ou, pelo menos, ante alguma forma de incapacidade ou impedimento da vítima em esboçar reação.”
Nota-se que a perícia não descarta a hipótese de as lesões terem sido causadas por outro indivíduo, inclusive mediante incapacidade de defesa da vítima.
Isto apenas comprova o teor do depoimento da vítima, que não esboçou reação durante o ataque e sofreu estresse pós-traumático, situação que se mantém até o momento.
2 - O laudo divulgado nesta quarta-feira não representa o fim das investigações; a defesa da vítima ainda espera que sejam apresentadas imagens de câmeras de segurança e ouvidos depoimentos de pessoas que prestaram auxílio à jovem atacada.
Qualquer conclusão antes de esgotada a avaliação de todos os elementos possíveis é precipitada e pode não representar a realidade dos fatos.
3 - Em respeito à privacidade da vítima, neste momento a defesa não fará novas manifestações.
4 - A defesa confia na apuração verídica dos fatos e aguarda a conclusão das investigações para a comprovação da verdade dos fatos.