A promessa do Governo do Estado de não encaminhar presos que pertençam a facções criminosas para a Penitenciária de Canoas (Pecan), para que ela seja modelo no Estado e não vire um Presídio Central, não está sendo cumprida. Esse perfil de apenado já está ocupando vagas na casa prisional. A juíza da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre Patrícia Fraga Martins, responsável pela fiscalização da prisão, admite esse tipo de ingresso, mas garante que o Estado ainda tem o controle total da penitenciária:
— Todo preso pertence a uma facção. Mas estamos misturando os presos de facções para evitar que controlem galerias.
Segundo a magistrada, existe a tentativa quase que diária das facções de controlar alas da casa prisional, mas sem êxito.
— O objetivo é não ter facção mandando nos outros (presos) e comandando galerias. Na Pecan, cada preso fala por si.
Patrícia afirma que os bloqueadores de celulares instalados na casa prisional estão surtindo efeito e evitando, inclusive, a tentativa de ingresso dos aparelhos e relata uma situação inusitada:
— Os presos estão reivindicando o recebimento de cartas. Com bloqueadores de celulares, não funcionam os aparelhos lá.
Quando existe suspeita de que algum preso esteja tentando implementar as ordens de uma facção criminosa em uma galeria, a juíza afirma que é transferido para outra penitenciária o mais rápido possível. O complexo conta hoje com 1.682 presos para 2.808 vagas.
Cuidada para não virar novo Presídio Central
Conforme o dirigente do Núcleo de Defesa em Execução Penal da Defensoria Pública do Estado, Alexandre Brandão Rodrigues, alguns dos presos estão burlando o sistema:
— A Susepe (Superintendência dos Serviços Penitenciários) está tentando não permitir que eles (presos de facções) entrem na Pecan. Acontece que muitos são faccionados e tentam subverter essa triagem. Defensores que falaram com presos disseram que eles admitiram pertencer a facções, mas esconderam isso da administração prisional.
Assim como a juíza Patrícia, Rodrigues também ressalta que ainda não há controle da casa prisional pelas organizações criminosos, como ocorre no Presídio Central.
— O Estado tem tentado manter as Pecans livres das facções. E nas Pecans, facções não estão coordenando galerias. Não existe separação de facções por galerias. Isso é positivo. O Estado está conseguindo. Entram presos faccionados, mas o poder das facções não está tão forte.
O defensor público defende que o Estado amplie o rigor na triagem dos presos para evitar que o complexo de Canoas vire um novo Presídio Central.
— É necessário que o Estado tenha um controle mais rigoroso das facções no sistema penitenciário. Temos que evitar a administração interna do presídio por presos faccionados. Na Cadeia Pública de Porto Alegre (Presídio Central), quem comanda são os presos. O Estado tem o controle externo da cadeia. Os presos tem o controle interno.
A Superintendência dos Serviços Penitenciários está tentando não permitir que eles (presos de facções) entrem na Pecan. Acontece que muitos são faccionados e tentam subverter essa triagem. Defensores que falaram com presos disseram que eles admitiram pertencer a facções, mas esconderam isso da administração prisional.
ALEXANDRE BRANDÃO RODRIGUES
Núcleo de Defesa em Execução Penal da Defensoria Pública do Estado
Para o coordenador do Centro Operacional Criminal e de Segurança Pública do Ministério Público (MP), Luciano Vaccaro, a estrutura do complexo de Canoas deve seguir como o planejado inicialmente.
— Na Pecan 1, não há registro de presos faccionados. Nas outras unidades, na 3 e na 4, haveria notícia de presos de facções. Obviamente não interessa ao MP e à sociedade que comece a entrada no sistema penitenciário de Canoas de presos de facções. Devemos trabalhar para que não ocorra no futuro o que há em outras casas prisionais. Não podemos admitir retrocesso em relação a isso.
Para Vaccaro, é necessário esforço das instituições para manter a penitenciária de Canoas sem o controle das facções.
— Houve esforço de todas as instituições para que começasse um modelo diferente de penitenciária. Mas também sabemos que é uma questão complexa o sistema prisional. Temos de unir esforços de todas as instituições para que isso não ocorra. Caso se identifique algum preso de facção, temos de controlá-lo ou retirá-lo dali.
Ocupação do complexo penitenciário de Canoas:
Pecan 1
Capacidade: 393
População Carcerária: 352
Pecan 2
Capacidade: 817
População Carcerária: 505
Pecan 3
Capacidade: 805
População Carcerária: 549
Pecan 4
Capacidade: 793
População Carcerária: 276
Total
Capacidade: 2.808
População Carcerária: 1.682
Contraponto
Em nota, a Susepe se manifestou. Confira o posicionamento:
A Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) informa que está cumprindo todas as normas estabelecidas na convenção de sua criação, que os presos estão com regramento diferenciado, com normas diferenciadas e que a triagem é constantemente realizada. Assim que identificados presos faccionados, pela ação constante da Divisão de Inteligência da Susepe, são removidos e transferidos para outra unidade prisional.
Sabe-se que, infelizmente, devido ao contexto social brasileiro, a maioria dos presos hoje é recrutada por alguma organização criminosa. Justamente para dar-lhes uma oportunidade, seja através de cursos, seja através do trabalho prisional, o Complexo Prisional de Canoas foi criado. Dessa maneira, a presença plena do Estado mantém a ordem e a segurança nas unidades prisionais.