Com esponjas, escovas, vassouras, detergentes, desinfetantes e baldes com água, um grupo de 40 voluntários organizou na manhã deste sábado (14) a limpeza de um dos prédios do antigo Instituto Penal Padre Pio Buck, que será a sede da Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (Apac), em Porto Alegre.
O mutirão marca o primeiro aniversário de um ano de criação da entidade, cuja filosofia consiste em um modelo diferenciado de cadeia, no qual o índice de recuperação dos apenados pode alcançar 80%, como ocorre em Minas Gerais, onde a principal unidade não registra fugas há 15 anos. A estimativa é de que a Apac de Porto Alegre possa abriga 100 apenados até o final do ano.
Profissionais de diversas áreas, como professores, advogados, psicólogos, enfermeiros, e procuradores de Justiça limparam pisos, paredes, latrinas e vidros entre 9h e 12h de um dos prédios que abrigarão detentos da Apac da Capital. O método foi criado há três décadas no interior de São Paulo, abrangendo apenados de todos os regimes prisionais dispostos a ressocialização por meio de estudo, trabalho, disciplina e construção de valores.
— A Apac é o sistema de cumprimento de pena que deu certo no Brasil e que exporta para outros países — afirmou a procuradora do Estado Roberta Arabiane Siqueira com um esfregão nas mãos, tirando a sujeira de uma pia de banheiro.
Por meio de um convênio, o Estado cedeu no ano passado a área do Pio Buck para a instalação da Apac. Ao menos dois prédios serão utilizados para alojar presos. O primeiro deles, limpo neste sábado, é um pavilhão de dois pisos remodelado em 2016 com verba do Judiciário. A unidade precisa de obras de adaptação como grades nas janelas, muro e pátio cercado. Conforme o procurador de Justiça Gilmar Bortolotto, um dos voluntários da Apac, a estimativa é de que em três ou quatro meses seja possível iniciar transferências de presos.
O segundo pavilhão necessita de reformas e ampliações. Além de obras de manutenção interna, estão previstos erguer uma unidade anexa para trabalho e pátio gradeado. Bortolotto explica que os projetos arquitetônico, elétrico e hidrossanitário, além do plano de prevenção de incêndio estão prontos, confeccionados gratuitamente por engenheiros voluntários. A verba para as obras será do Fundo de Reconstituição de Bens Lesados (proveniente de indenizações decorrentes de condenações e acordos judiciais promovidos pelo Ministério Público).
O antigo Pio Puck já teve 700 apenados do regime semiaberto e foi considerado um dos símbolos do descontrole nas cadeias por causa de recordes de fuga e liberação de presos para cometer crimes encomendado por agentes penitenciários. Mas isso faz parte do passado.
— O mutirão de hoje é um ato simbólico de transformação do Pio Buck em uma Apac. Jamais voltará a ser o que foi — destaca a empresária Isabel Cristina Oliveira, presidente da Apac.
Saiba mais
A Apac
— O modelo prisional leva o nome de Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (Apac). Existentes em outros Estados desde os anos 1970, trata-se de uma ONG sem fins lucrativos que visa a recuperação de apenados com método diferenciado dos presídios convencionais
— No Rio Grande do Sul, além de Porto Alegre, existem Apac's constituídas em Canoas, Pelotas, Três Passos e Palmeira das Missões
— A Apac da Capital é formada por um grupo de voluntários, com estatuto próprio, diretoria, tesouraria, conselhos fiscal e deliberativo. Fazem parte profissionais liberais, professores, assistentes sociais, psicólogos e servidores públicos
Custos
— Para cada vaga ocupada na Apac, o Estado repassará para a entidade o valor do custeio, que deve ser equivalente a 40% do custo médio de um preso tradicional. O custo de uma vaga na Apac varia de R$ 10 mil a R$ 20 mil, enquanto, no sistema tradicional, chega a R$ 60 mil.
— A Superintendência dos Serviços Penitenciários terá um núcleo para acompanhar a qualidade do serviço e a utilização dos recursos, que também serão fiscalizados pelo Tribunal de Contas do Estado, Contadoria e Auditoria-Geral do Estado, Tribunal de Justiça do Estado e Procuradoria-geral de Justiça
Controle de presos
— Com recursos oriundo do convênio com o Estado, a Apac contratará empregados para funções administrativas e de segurança, sob supervisão dos voluntários que integram a diretoria da entidade.
— A transferência de apenados dos regimes fechado e semiaberto para a Apac dependerá de autorização judicial com parecer do Ministério Público. Os primeiros apenados deverão ser aqueles de perfil menos agravado. Detentos do regime fechado ficarão em celas com grades.
— Apenados que praticarem faltas graves como briga, porte de arma, droga ou celular serão desligados da Apac. Retornarão para presídio comuns, entrando outro na vaga
As atividades
— A rotina diária na Apac começa às 6h e se estende até as 22h. Os presos trabalharão na cozinha, lavarão a própria roupa e terão outras ofertas de trabalho, estudo, assistência jurídica e à saúde e oficinas de reflexão — ações de construção de valores morais e religiosos, no qual o preso avalia as consequências do crime na vida dele e dos familiares
— Assim como voluntários e empregados, os detentos também passaram por cursos para conhecimento do sistema Apac que preza o comprometimento do grupo com apenados, ajudando um ao outro, com participação da família e da comunidade