A notícia do roubo do carro da deputada federal Maria do Rosário, na noite de quarta-feira (27), gerou manifestações nas redes sociais. A maior parte delas hostil à parlamentar. Maria do Rosário e o marido estavam carregando o veículo com malas, quando foram abordados por três homens armados que anunciaram o assalto. O carro acabou sendo recuperado na manhã desta quinta-feira (28).
Na página de GaúchaZH, no Facebook, foram quase 5 mil comentários na postagem relacionada ao assalto sofrido pela parlamentar. Algumas pessoas chamaram a deputada de "mãe dos bandidos", questionaram os motivos pelos quais ela não teria "dialogado" com os assaltantes e outros até disseram que Maria do Rosário deveria ser vítima de crime sexual. Não é a primeira vez que Maria do Rosário é hostilizada no ambiente digital. Parlamentar com atuação na área dos direitos humanos, ela já teve fotos da filha expostas nas redes sociais.
Na mesma rede social, o apresentador de TV Bibo Nunes, vinculado ao Partido Ecológico Nacional (PEN/Patriota), mesma sigla pela qual Jair Bolsonaro pretende concorrer à Presidência da República, criticou a deputada. Na gravação, classificou a parlamentar como "defensora dos bandidos, de estupradores". Ainda disse que a deputada deveria "cumprimentar quem lhe assaltou".
Procurado, Nunes argumentou que não ofendeu a parlamentar.
— Não chamei de sem-vergonha, nem nada. Queria demonstrar essa situação de insegurança. Da pessoa que critica a polícia tendo que procurar a polícia. Não dá para viver sem a polícia e a Brigada Militar. Direitos humanos defenderem bandidos, nunca vi direitos humanos defender policial.
Situação revela onda de ódio, analisa pesquisadora
Para Aline Kerber, socióloga e consultora do núcleo de segurança cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma), a situação evidencia a onda de ódio espalhada no país. No caso de Maria do Rosário, as críticas se intensificaram após o deputado federal Jair Bolsonoro declarar que não a estupraria por ela ser "feia demais", em 2014.
— Ele é uma das expressões que defendem que "bandido bom é bandido morto". E Maria do Rosário, que não defende bandido, mas defende direitos humanos para todos, quando ela se posiciona, está sendo alvo, vítima — observa.
Aline considera as manifestações como "grande covardia".
— Tem muito machismo nessa história. Por ser mulher, sofre ainda mais, como se não tivesse legitimidade para defender a bandeira dos direitos humanos.
Letícia Maria Schabbach, professora de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), entende que há desconhecimento geral sobre o que são direitos humanos.
— As pessoas confundem direitos humanos com defesa de criminosos. Há uma visão muito estreita, entendimento muito limitado, apesar de já terem se passado mais de 60 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos — entende a professora.
Pelo documento, todos são "livres e iguais em dignidade e direito" e, por isso, ninguém pode ser submetido a tortura, escravidão, tratamento ou castigo cruel.
— Os criminosos são seres humanos, que têm direitos previstos na Lei de Execução Penal (LEP). Quem comete crime continua sendo ser humano. Não deixa de ser — explica Letícia.
A rejeição à parlamentar também se deve à postura contrária a possíveis abusos da polícia, entende o especialista em segurança e professor de sociologia da PUCRS Rodrigo de Azevedo. Em 2012, a deputada criticou o uso de crianças como escudo humano por policiais militares em greve na Bahia.
Em 2015, manifestou-se contrária à declaração de um comandante da Brigada Militar que sugeriu "chamar o Batman" quando jornalistas pediram reforço no policiamento, em um evento na Redenção.
— Quando ela defende os direitos humanos, quer dizer que as regras do jogo valem para todos. Quando a polícia comete abusos, que sejam punidos — entende Rodrigo.
GaúchaZH tentou ouvir a deputada Maria do Rosário. A assessoria da parlamentar disse que ela não vai dar entrevistas sobre o caso. Na noite de quarta-feira, foi divulgada uma nota. O texto detalha que, além do carro, foram levados pertences pessoais. Por telefone, a assessoria informou que seriam o celular, computador e documentos da parlamentar.