A busca pelo traficante considerado o número 1 do Rio Grande do Sul terminou às 7h da manhã de sexta-feira em uma estrada da cidade de Los Cedrales, no Paraguai. Foragido do Brasil desde 2013, Neri José Soares, o Nazareth, 39 anos, vivia no Paraguai desde então sob a fachada de pecuarista e era conhecido como Gaúcho.
Com receio de represálias ou tentativa de resgate por parte do grupo de Neri, autoridades paraguaias foram ágeis em liberar o traficante aos policiais gaúchos: menos de duas horas depois da captura, já estava emitida a ordem de expulsão dele do Paraguai.
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No momento da prisão efetuada pelo Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) com apoio da Polícia Nacional Paraguaia, Neri usava roupas simples, estava desarmado e dirigia uma caminhonete S-10 sem seguranças por perto.
Quem o visse, não desconfiaria se tratar de um traficante que movimenta, conforme a Polícia Civil, em torno de R$ 100 milhões nos meses de safra da maconha, enviando carregamentos que saem do Paraguai em lanchas para facções do Sul e do Sudeste, com pequena ramificação no Nordeste.
Ele também estaria envolvido, segundo a polícia paraguaia, no violento ataque à sede da Prosegur, ocorrido em abril, em Cidaud del Este, e que resultou na morte de um policial e rendeu aos bandidos US$ 40 milhões. Há suspeita de que teria usado lanchas para o transporte dos malotes de dinheiro.
Ao ver viaturas na estrada, Neri tentou fugir. Depois de imobilizado, revelou, tranquilamente, uma faceta da estrutura de apoio que ergueu vendendo toneladas de maconha:
– Eu tenho pouco de pena, em pouco tempo eu resolvo isso (a prisão). Tenho um escritório de Brasília contratado que atua junto ao Supremo Tribunal Federal.
Neri estava na mira da polícia gaúcha havia um ano e sete meses. Sua captura era considerada prioridade desde 2015. Em sua ficha prisional, estão registradas as informações sobre o perfil: "chefe de quadrilha, líder do narcotráfico, com possibilidade de resgate e escolta de risco". O secretário da Segurança, Cezar Schirmer, e o chefe da Polícia Civil, delegado Emerson Wendt, estiveram no Denarc para prestigiar o trabalho feito na Operação Cedrales, que teve apoio do Gabinete de Inteligência da polícia.
– Hoje é um dia em que toda a população gaúcha poderia vestir a camiseta da Polícia Civil. Tem que se destacar o profissionalismo, a competência, a dedicação, a seriedade e a responsabilidade do trabalho da polícia. Estamos comemorando uma grande vitória, na medida em que um dos maiores traficantes do país e o maior do sul do Brasil está preso, vai sair do crime – ressaltou Schirmer.
O delegado Wendt ressaltou que quando foi feito planejamento de ações do Denarc em 2015, Neri se destacou como um dos principais alvos:
– Nos faltava trabalhar em cima de pessoas que realmente influenciavam no tráfico de drogas e, seguramente, o Neri é o maior fornecedor de maconha do Rio Grande do Sul. E esse trabalho é apenas o começo da investigação em relação a ele, que deverá ter desdobramentos.
Natural de Candelária e criado na Vila Nazareth, zona norte de Porto Alegre, Neri é esperto e escorregadio: não usava smartphone, trocava rotineiramente a linha telefônica fixa paraguaia e esbanjava carro novo todo mês. Tinha vida confortável de classe alta. Enquanto se fixava no Paraguai, aprendendo com fluência o espanhol e o guarani, também fortalecia laços com facções brasileiras.
Segundo o Denarc, ele mantém relações com o Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, e com os Bala na Cara e Antibalas, no Estado. Mas também fornece maconha para outras quadrilhas. A polícia suspeita que ele costumava dar abrigo a criminosos brasileiros visando a fortalecer os laços comerciais.
– Ele está acima das facções, se relaciona com todas – explicou o diretor de investigações do Denarc, delegado Mario Souza.
Para a polícia foi Neri que inaugurou os tempos de crimes violentos relacionados ao tráfico de drogas na Capital. Em 2008, se tornou suspeito de ter mandado sequestrar e matar a viúva de seu ex-chefe no tráfico na Vila Nazareth. A mulher e um funcionário dela foram achados soterrados em um poço de 15 metros de profundidade com sinais de tortura. Neri respondeu a quatro inquéritos por tráfico de drogas e um por homicídio.
Chefe da investigação e da operação de prisão no Paraguai, o delegado Guilherme Calderipe, da 1ª Delegacia de Investigações do Narcotráfico, falou das dificuldades do trabalho:
– Tínhamos muitas informações que não se confirmavam. Um trabalho assim à distância é mais difícil. Desta vez, fomos acreditando que daria certo. A informação, sustentada por levantamentos anteriores, era de que ele costumava usar aquela estrada. Era uma ação delicada, pois teríamos que abordá-lo em deslocamento.
O Denarc agora quer rastrear o patrimônio do traficante. Há informações de que teria fazendas no Paraguai, onde cria gado. Também há bens no Estado a serem identificados e um inquérito será destinado a desvendar os caminhos da lavagem de dinheiro. A polícia gaúcha manterá o trabalho em parceria com a paraguaia a fim de buscar mais detalhes da vida de Neri naquele país. É preciso descobrir, por exemplo, onde exatamente ele morava e com quem, e tentar identificar outros integrantes de seu grupo.