Nesta quarta-feira, o secretário da Segurança Pública, Airton Michels, recebeu a reportagem de Zero Hora e falou sobre a situação dos 4,3 mil apenados dos regimes aberto e semiaberto que estão nas ruas.
Zero Hora - Mais de mil vagas foram fechadas por descontrole, incêndios e depredações só na Região Metropolitana, e criadas 590 vagas no semiaberto. O senhor não acha pouco?
Airton Michels - Não é pouco porque estamos investindo em tecnologia, que é a tornozeleira, mais barata e mais eficiente. Todo juiz que trabalha com execução penal alardeiam há muitos anos, e com razão, que os regimes semiaberto e aberto não funcionam no Brasil. Tem direito à saída temporária, e a questão do trabalho, sem fiscalização, muitas vezes, é uma simulação. Hoje temos 750 presos usando tornozeleiras. E temos um contrato para 5 mil presos.
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ZH - Como explicar para a sociedade que 4,3 mil presos estão em casa por prisão domiciliar, com tornozeleira ou esperando vagas por causa de descontrole em albergues e falta de espaço?
Michels - Temos 5,4 mil presos no semiaberto e 1,5 mil no aberto. Há muitos anos, no Brasil, vários Estados já mandam presos do aberto para prisão domiciliar. Isso é uma evolução jurisprudencial. Acho que isso acontece em São Paulo há 20 anos. No semiaberto do Rio Grande do Sul, temos mais vagas do que presos, só que elas são no Interior, e não vamos mandar presos da Região Metropolitana para Pelotas, por exemplo. Alguns juízes têm entendido que, em vez de mandar o preso para o semiaberto por problema de superlotação, manda o preso para a prisão domiciliar para finalização de pena. O semiaberto tem de ser suprimido e tem de ser suprido com a tecnologia disponível, que é a tornozeleira.
ZH - Os juízes mandam para prisão domiciliar por descontrole e falta de vagas nos albergues.
Michels - Há um problema de superlotação, e nós preferimos desativar (albergues) e investir em tornozeleiras para que não ocorra o que ocorreu no IPV, em Viamão (presos andavam armados, intimidavam agentes, fugiam para cometer assaltos).
ZH- O governo está fechando albergues em Torres, em Viamão, não reformou os prédios destruídos nos Instituto Miguel Dario e Pio Buck, em Porto Alegre, apostando na vigilância eletrônica...
Michels - Sim. Mas vamos reformar estes prédios. Mas primeiro será investido em tornozeleiras.
ZH - Mas não é temerário apostar nisso, à medida que a prisão domiciliar e o uso da tornozeleira é questionada na Justiça pelo MP?
Michels - Tem juiz que acha a tornozeleira muito boa, outros, não. Nós achamos que é boa.
ZH - O TJ vai julgar recursos do MP, e a questão da prisão domiciliar tem uma ação do MP no STF.
Michels - Te asseguro que a questão da tornozeleira no STF é muito bem-vinda.
ZH - O MP diz que a tornozeleira, por lei, deve ser usada em saída temporária e para presos que trabalham fora dos albergues.
Michels - A tornozeleira é uma forma de cumprimento de pena. Eu entendo assim.
ZH - O plano de alugar prédios que gerariam 300 vagas para o semiaberto na Região Metropolitana, prometida duas vezes, foi abandonado?
Michels - Sim. Estávamos com contratos assinados (em Gravataí e Campo Bom), mas as comunidades ficaram sabendo, se insurgiram e as prefeituras recuaram. Não nos deferiram o alvará. O Judiciário e o MP precisam compreender essa dificuldade e perceber porque investimento nas tornozeleiras.
ZH - Como o senhor recebe as críticas do Judiciário de que o governo se demitiu da função de criar vagas?
Michels - Isso é surpreendente. Estamos investimento na tornozeleira. Isso não é uma omissão é uma inovação.
ZH - O senhor é promotor de Justiça de carreira. O que acha da hipótese de ser acionado por iniciativa de seus colegas do MP por eventual improbidade administrativa e até ser acionado criminalmente por não gerar vagas?
Michels - Meus colegas devem perder noites de pesquisa para buscar todos os gestores anteriores que não geraram vagas, especialmente aqueles que deixaram o Presídio Central chegar a 5 mil presos. Por um lado exigem gerar vagas, por outro entram com liminares para obstruir construções em andamento (caso de uma penitenciária em Canoas para 400 vagas no fechado, interrompida por falta de licitação).
ZH - A ação do MP se refere a alguma irregularidade na obra.
Michels - Não há irregularidade. Apenas entenderam que a obra deveria ser licitada. Da forma como fizemos, comprovadamente, será mais barata (a empresa é detentora de tecnologia de ponta), vai custar R$ 18 milhões. Se licitar, custará R$ 26 milhões. Será patético.