Basta navegar pela internet por alguns minutos e, provavelmente, você irá encontrar alguma “denúncia” sobre vacinas. Entre tantas informações que circulam nas redes sociais, uma é bastante compartilhada: a de que a tríplice viral, que protege contra caxumba, sarampo e rubéola, pode causar autismo. Mas isso não é verdade.
A relação entre vacina e autismo, apesar de falsa, já circula há 20 anos. Em 1998, o médico inglês Andrew Wakefield publicou na renomada revista científica The Lancet um estudo descrevendo o caso de 12 crianças que desenvolveram comportamentos autistas e uma inflamação intestinal grave. De acordo com Wakefield, essas crianças tinham vestígios do vírus do sarampo no corpo. O médico levantou a possibilidade de que a vacina tríplice viral, que contém o vírus do sarampo em sua composição, tenha causado esses problemas gastrointestinais, que levariam a uma inflamação no cérebro e, possivelmente, ao autismo. Foi o suficiente para que muitas pessoas no Reino Unido entendessem que a culpa pelo autismo está na vacina.
Anos mais tarde, descobriu-se que Wakefield tinha forjado os resultados da pesquisa. Na publicação original, ele disse que havia vestígios do vírus do sarampo nas 12 crianças pesquisadas. No entanto, um médico que o auxiliou no trabalho veio a público dizer que, na verdade, não havia encontrado o vírus em nenhuma delas – e que Wakefield ignorou essa informação. Em 2010, ele foi julgado pelo Conselho Geral de Medicina do Reino Unido como “inapto para o exercício da profissão” – ou seja, perdeu seu registro médico. Seu comportamento foi classificado como “irresponsável”, “antiético” e “enganoso”. A revista Lancet, que publicou o estudo, se retratou dizendo que suas conclusões da pesquisa eram “totalmente falsas”.
Mas o estrago já estava feito e, desde então, muitas pessoas acreditam que a vacinação pode realmente causar autismo e outros problemas.
– Por ter sido publicado em uma revista muito conceituada, o artigo acabou gerando um dano imenso. Crianças voltaram a morrer de doenças que praticamente já não existiam mais – relata o clínico-geral Carlos Eduardo Carvalho, do Hospital Divina Providência.
Ainda que tenha se provado que o estudo de Wakefield era falso, a polêmica se espalhou pelo mundo e ganhou novas versões. Nos Estados Unidos, o vínculo com o autismo não foi feito com a tríplice viral, mas sim com o timerosal, componente antibactericida que está presente em algumas vacinas. Foram necessários anos de debate para que ambas as teorias fossem desmontadas e para que o elo entre autismo e vacinas fosse descartado pela comunidade científica.
Carvalho reforça a importância de não acreditar nas publicações que encontram nas redes sociais e busquem sempre uma fonte segura.
– É importante conversar com um médico pediatra de confiança, que poderá esclarecer dúvidas e falar sobre todos os benefícios da vacinação correta – recomenda o especialista.
Em 2016, o Brasil recebeu o certificado da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) de eliminação da circulação do vírus do sarampo. Entretanto, novos casos da doença foram registrados recentemente, e a situação já é considerada um surto pelo Ministério da Saúde. Até o dia 14 de agosto, mais de 1,2 mil casos haviam sido confirmados somente nos Estados de Roraima e Amazonas.
Para conter esse avanço, o Ministério da Saúde lançou uma campanha de vacinação contra poliomielite e sarampo, tendo como público-alvo crianças de um a cinco anos. Neste sábado, ocorre o Dia D de mobilização nacional, com imunização em vários postos de saúde em todo o país.