A decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de divulgar fotos nas quais aparece de cabelo e barba raspados, na última semana, foi considerada positiva por especialistas que trabalham com pacientes em tratamento contra o câncer. Ao alterar a imagem da época de sindicalista, nos anos 70, Lula passou por um ritual comum às vítimas da doença.
A decisão de Lula é um incentivo aos brasileiros que enfrentam a mesma doença. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), são detectados cerca de 489 mil casos novos de câncer por ano no país. A equipe médica do ex-presidente previa que ele começaria a perder tanto a barba quanto o cabelo até o último final de semana.
- Quando personalidades como o ex-presidente e o ator Reinaldo Gianecchini decidem não esconder o câncer e compartilhar o que estão vivendo, ajudam a reduzir o preconceito, mostram o quanto a doença é democrática e que todos correm riscos - observa Luciana Holtz de Camargo Barros, psico-oncologista e presidente do Instituto Oncoguia, organização não governamental dedicada à defesa dos pacientes com câncer.
Segundo a especialista, após o presidente ter anunciado publicamente que tem câncer na laringe, aumentou o número de pessoas interessadas em fazer exames semelhantes aos que ele se submeteu.
- Essas atitudes também levam as pessoas a rever seus hábitos. É sabido que o fato de o ex-presidente fumar o tornava mais exposto ao risco da doença do que um não fumante - acrescentou Luciana.
O médico Paulo de Tarso Lima, do centro de oncologia do Hospital Albert Einstein, também considerou positiva a divulgação da foto na qual o ex-presidente aparece de cabeça raspada e sendo barbeado pela mulher, Marisa.
- Mostra a conexão do ex-presidente com o tratamento a que está se submetendo. Apesar de sua importância e poder político, de sua popularidade, ele cede no momento apropriado e se submete ao tratamento - destacou ele.
Na avaliação de pessoas próximas do ex-presidente, a divulgação das fotos também sinaliza uma decisão de encarar de maneira mais direta a luta contra a doença, diagnosticada há pouco mais de duas semanas. Para Paulo Okamoto, presidente do Instituto Cidadania, Lula mostrou a seriedade com que encara o tratamento.
Esperança por novos medicamentos com menos efeitos colaterais
Pelo tipo de câncer, é possível ter um prognóstico, com algum grau de confiabilidade, se a queda de cabelo vai ocorrer ou não após alguns tipos de quimioterapia. Tumores de pele e de intestino, por exemplo, têm baixa probabilidade de provocar queda de pelos. O primeiro, porque o tratamento usual é a radioterapia. O segundo, pelo tipo de medicamento empregado, não tão agressivo (em muitos casos).
Quando a queda é inevitável, a maioria dos pacientes apela para perucas. O oncologista Antonio Kalil, 48 anos, admite que o corte se apresenta, de certa forma, como um ritual de aceitação da doença, já que para a maioria dos pacientes a queda de cabelos vai acontecer.
A esperança dos oncologistas é de que a ciência desenvolva medicamentos sem tantos efeitos colaterais (um dos mais temidos e frequentes é a náusea provocada pela quimioterapia, que costuma ser bem pior do que o mero dano à imagem representado pela queda dos pelos).
A oncologista Débora Batassini, 47 anos de idade e 22 de profissão, ex-presidente da Sociedade de Cancerologia gaúcha, confirma que a queda de cabelos é dilema sobretudo feminino. E as reações dependem do tipo de personalidade.
Muitas pessoas, diz a médica, se antecipam ao desconforto provocado pela queda incessante de cabelos. Os efeitos podem ser muito incômodos, como maços inteiros de pelos que se desprendem no simples ato de se pentear. Aí, os mais prevenidos e conformados raspam de uma vez, corte zero, como fez Lula. Sem muletas emocionais.
:: O cabelo é uma célula de crescimento rápido e permanente, como são as células cancerígenas. O resultado é que, ao tratar o câncer, a quimioterapia muitas vezes mata também os folículos capilares, num devastador efeito colateral.
:: A queda é progressiva e varia de pessoa para pessoa. Em geral, começa a cair em poucos dias e pode deixar a pessoa calva em um mês. Usualmente o cabelo volta a crescer após o tratamento.
Careca contra a doença
Para especialistas, divulgação de fotos de Lula sem cabelo e barba é incentivo a pacientes com câncer
Queda de cabelo é preocupação de quem enfrenta tratamento quimioterápico
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