Um protocolo de treinamento físico de 16 semanas sozinho, combinando musculação e exercício aeróbico, foi capaz de reverter o envelhecimento prematuro de células imunes e disfunções metabólicas, sobretudo associadas a moléculas de gordura. A conclusão é de estudo realizado por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com apoio da Fapesp.
No período, os participantes realizaram três sessões semanais de uma hora de treinamento, que envolvia meia hora de musculação e meia hora de corrida, caminhada ou pedalada em bicicleta ergométrica.
A obesidade promove uma inflamação crônica e de baixo grau que deixa o sistema imunológico em constante alerta, gerando uma sucessão de falsos alarmes para o sistema de defesa do organismo, causando o envelhecimento prematuro das células imunes. Denominado como imunossenescência precoce, contribui para uma maior incidência de doenças infecciosas ou mesmo crônico-degenerativas, como diabetes, aterosclerose e outras condições cardiovasculares.
Além dos níveis constantes de inflamação, a obesidade também pode desencadear alterações metabólicas, sobretudo associadas a lipídios, outro mecanismo comprovadamente envolvido no desenvolvimento do diabetes tipo 2 e de outras doenças crônicas não transmissíveis.
Claudia Cavaglieri, coordenadora do Laboratório de Fisiologia do Exercício (Fisex) da Faculdade de Educação Física da Unicamp, afirma que o cumprimento do protocolo de forma isolada foi capaz de reduzir a circunferência abdominal, aumentar a força e a massa magra.
— Um tratamento não farmacológico para dois fatores extremamente associados ao desenvolvimento de doenças crônicas. São resultados importantes e que mostram, mais uma vez, o papel-chave do músculo como órgão endócrino — explica.
A reversão só é possível porque o tecido muscular em atividade libera substâncias, conhecidas como miocinas ou exerquinas, que atuam em diferentes mecanismos por todo o organismo, explica Claudia.
— O treinamento combinado muda a composição corporal, gera perda de gordura visceral e ganho de massa magra, melhorando o metabolismo lipídico e a função mitocondrial (das organelas que produzem energia para as células), bem como reduzindo a inflamação e, consequentemente, promovendo melhora nos marcadores de saúde — afirma.
Nos casos de obesidade, a mitocôndria não consegue transformar gordura em moléculas de energia (reação química conhecida como fosforilar), o que passa a ocorrer com a realização do treinamento.
— Então, o indivíduo acaba gastando gordura para gerar energia e isso melhora a condição metabólica lipídica do organismo como um todo e contribui para a perda de peso — destaca a especialista.
Exercícios simples
Os pesquisadores avaliaram marcadores associados às condições em uma mesma coorte, formada por 167 indivíduos divididos em três grupos: obesos, obesos com diabetes tipo 2 e indivíduos saudáveis, sem comorbidades. Os participantes dos estudos tinham entre 40 e 60 anos.
A pesquisadora ressalta que a relação entre a obesidade e os dois fatores estudados forma um círculo vicioso.
— Quanto mais obesidade, maior liberação de gorduras no sangue, maior a inflamação e, consequentemente, maior é o risco do desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis — afirma.
Um dos pontos analisados, os lipídios desempenham papéis vitais nas membranas celulares, atuando como reservas de energia, fornecendo suporte estrutural, como precursores de hormônios, transportando vitaminas e permitindo a sinalização celular. No entanto, na obesidade ocorre a desregulação do metabolismo lipídico, levando ao acúmulo de gordura corporal e à deposição anormal de lipídios no fígado.
— Ao medirmos os marcadores de expressão gênica relacionados à imunossenescência, verificamos que, embora houvesse muita semelhança entre os índices apresentados pelos participantes obesos e obesos com diabetes, o resultado era completamente diferente dos indivíduos magros e sem comorbidades. Essa semelhança entre obesos e obesos diabéticos se deu, provavelmente, pelo fato de todos os participantes diabéticos estarem sob tratamento medicamentoso — explica Claudia.
Os marcadores de imunossenescência, no entanto, voltaram parcialmente aos níveis ideais após as 16 semanas de treinamento.
— Trata-se de um protocolo simples, que tem sido testado em diferentes populações e é recomendado pelas principais sociedades médicas. Mostramos, no entanto, que, além de ganhos estéticos, o treinamento reverte dois processos de grande relevância para a saúde e que estão relacionados com a obesidade — sublinha.
As conclusões foram obtidas durante o pós-doutorado de Diego Trevisan Brunelli e em projeto de doutorado de Renata Garbellini Duft, sob supervisão de Julian Griffin, do Imperial College of London, no Reino Unido.