Após mais de 540 milhões de doses aplicadas em quase três anos, o Brasil vive em 2023 um período de transição na vacinação contra a covid-19, das campanhas emergenciais para a imunização de rotina. A avaliação foi feita na quarta-feira (20) pelo diretor do Programa Nacional de Imunizações (PNI), Eder Gatti, na Jornada Nacional de Imunizações, realizada pela Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), em Florianópolis. O diretor disse que os municípios trabalham há praticamente três anos em uma campanha de vacinação contra a covid, mas a mudança no cenário epidemiológico da doença requer a incorporação dessa vacina no calendário do programa.
Em 2023, o Ministério da Saúde estendeu a vacinação com doses de reforço bivalentes para toda a população acima de 12 anos de idade. A adesão, porém, foi baixa até mesmo para os grupos prioritários, considerados de maior risco de agravamento da doença. Enquanto 516 milhões de doses de vacinas monovalentes foram aplicadas no país, somente 28 milhões de bivalentes foram administradas, sendo apenas 217 mil em adolescentes.
Para 2024, a proposta ainda em elaboração é a adoção de um calendário de vacinação contra a covid-19 na rotina de crianças menores de 5 anos, e doses de reforço periódicas ao menos uma vez por ano para grupos de risco, como idosos, imunocomprometidos (pacientes com sistema imunológico debilitado) e gestantes, seguindo orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Há ainda a possibilidade de inclusão de outros grupos como profissionais de saúde e comunidades tradicionais.
— Vacinar toda a população, como a gente vem fazendo, precisa ser revisado nesse momento de transição em que nos encontramos. Fizemos reuniões técnicas e tiramos diretrizes básicas que o Ministério da Saúde vai seguir em discussões internas. Agora, o anúncio disso ainda depende de uma discussão com a gestão tripartite (governo federal, Estados e municípios) — conta Gatti.
— Hoje, avançamos tanto na avaliação da recomendação internacional, da OMS, quanto na discussão com os especialistas, mas precisamos avançar nessa pactuação — complementa.
O diretor do PNI pretende iniciar uma estratégia de vacinação de rotina contra a covid-19 no início de 2024, para substituir o "caráter de excepcionalidade", com constantes alterações, que ainda dita o ritmo da imunização contra a doença:
— A covid-19 precisa deixar de ser uma estratégia de campanha e passe a ser uma recomendação permanente. Esperamos fazer anúncios oficiais com a estratégia mais completa antes do fim do ano.
Corrida contra o vírus
O secretário do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria e representante da SBIm em Pernambuco, Eduardo Jorge da Fonseca, descreve que a transição para uma vacinação de rotina contra a covid-19 está em discussão em todo o mundo. O Reino Unido, por exemplo, decidiu adotar a recomendação da vacina aos grupos prioritários sugeridos pela OMS. Já outra parte da Europa e os Estados Unidos estenderam a vacinação a toda a população.
— No momento atual, temos evidências da importância de manter os reforços com as vacinas bivalentes disponíveis no Brasil. Não há consenso se devemos revacinar todas as pessoas. Provavelmente, também aqui, adotaremos vacinar os grupos de maior risco com a vacina atualizada. Mas precisamos garantir o aumento da cobertura das vacinas já disponíveis, principalmente da pediátrica — relata.
A corrida constante para manter as vacinas atualizadas contra as cepas circulantes tem sido vencida pelo coronavírus SARS-CoV-2, que continua a sofrer novas mutações para adquirir escape imunológico. As vacinas continuam comprovadamente efetivas para redução da gravidade de suas infecções, mas não conseguem neutralizá-las nem bloquear o vírus, que está sempre um passo à frente em sua evolução acelerada. Um exemplo disso é a vacina monovalente contra a variante XBB, que chegou aos Estados Unidos em um momento em que a variante dominante era a EG.5, e já com a BA.2.86 em ascensão.
— Com a covid, o tempo passou a correr muito mais rápido — alerta Fonseca.