O Rio Grande do Sul enfrenta uma tragédia em função da chuva severa registrada na última semana. Além das mortes e dos transtornos ocorridos em diversas regiões do território gaúcho, a população também terá de lidar com o risco de doenças - como leptospirose, hepatite A, cólera e tétano - que existe em momentos como esse, de limpeza em ambientes com inundações.
O Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs) publicou nesta sexta-feira (3) um comunicado de risco quanto aos riscos da transmissão da leptospirose e acidentes com animais peçonhentos em locais com enchentes.
Em desastres que envolvem enchentes, as pessoas acometidas são expostas à água suja, que traz contaminação, principalmente quando vão limpar as casas – e há doenças que advém dessa circulação e contato com a água, conforme explica Marcelo Vallandro, diretor-adjunto do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs).
— Quem está nas localidades onde a água está baixando e está retornando para casa, está envolvido na limpeza, deve colocar botas, luva, proteção para evitar a exposição a riscos de acidentes — afirma.
A orientação também é importante dado que locais com entulhos aumentam o risco de acidentes e de ferimentos durante a limpeza, além de serem pontos facilitadores para picadas de escorpiões, aranhas e cobras. Isso porque, em situações de chuva, esses animais costumam se abrigar em pontos secos, como o interior de casas.
Além disso, doenças respiratórias também são esperadas neste momento, marcado por umidade – sobretudo nos abrigos que reúnem as pessoas atingidas pela catástrofe, resultando em aglomeração.
Leptospirose
A leptospirose é uma das doenças que mais preocupam em locais que enfrentam inundações. Ela é causada por uma bactéria presente na urina de roedores (rato, ratazana, camundongo). Situações de chuva acima do normal fazem com que rios, córregos e rede de esgoto transbordem. A água, então, é contaminada em tocas de roedores e, por fim, chega às residências.
A urina de outros animais contaminados pela bactéria, como bois, porcos e cães, também pode transmitir a doença. O contato com a pele, as mucosas ou a ingestão de alimentos, líquidos e medicamentos contaminados transmite a leptospirose para humanos. Os sintomas são febre, dor de cabeça, dores musculares, vômito, diarreia e tosse.
— É uma doença que pode ser potencialmente grave. Como não há vacina, a prevenção dela é usando botas, luvas e evitar o contato com a água — resumiu Paulo Gewehr, infectologista do Hospital Moinhos de Vento, em entrevista concedida a GZH após o ciclone de junho.
O especialista também reforçou a importância de buscar imunizantes o quanto antes:
— A vacinação é fundamental, embora todas as vacinas (contra as doenças comuns em enchentes) demorem de 15 a 30 dias para começarem a funcionar. Então, em uma situação aguda como essa, elas não nos ajudam muito, mas seguem indicadas porque não sabemos se isso vai se repetir ou se prolongar. A atualização vacinal é primordial para todas as situações, as do dia a dia e também essas catástrofes.
Acidentes com animais peçonhentos
A Cevs indica que as autoridades fiquem em alerta para o aumento na ocorrência de acidentes com animais peçonhentos, em função de deslocamentos dos habitats naturais destes animais, provocados pelas inundações. Os profissionais de saúde devem estar atentos aos fluxos de encaminhamento da sua região dos pacientes para tratamento com antivenenos.
Em casos de suspeita ou acidentes com animais peçonhentos, qualquer pessoa ou o profissional de saúde, durante o atendimento, pode contatar o Centro de Informações Toxicológicas (CIT) pelo telefone 0800-7213000, disponível 24 horas.
Cuidado com alimentos e água
É preciso redobrar os cuidados com alimentos e água para evitar problemas, frisa o diretor-adjunto do Cevs:
— A gente sabe a situação de escassez em que as pessoas estão, mas elas precisam ter cuidados para minimizar danos. Ao comer qualquer coisa e tomar qualquer água, tem a possibilidade de ter doenças transmitidas, como infecções gastrointestinais.
Vallandro reforça que as pessoas com dificuldades busquem abrigos, que estão recebendo diversas doações.
— É para ter alimentos lá de uma melhor qualidade, porque, às vezes, a pessoa pode querer reaproveitar os que tiveram contato com águas contaminadas, e há grande chance de estarem contaminados. Eles devem ser descartados — ressalta.
Cuidados com a água
A água disponível à população em municípios atingidos por enchentes precisa ser avaliada, pois pode conter microrganismos causadores de diversas doenças. Por isso, deve ser confiável, sem ter tido contato com a água da chuva. É importante consumir água potável, fervida ou tratada com hipoclorito de sódio.
- Filtre a água utilizando filtro doméstico. Caso não seja possível, utilizar coador de papel ou pano limpo
- Na impossibilidade de filtrar ou coar, reserve ou coloque a água em um vasilhame limpo e deixe a sujeira decantar (descer até o fundo do vasilhame) até que a água fique transparente. Em seguida, separe com cuidado a água limpa, coloque em outra vasilha limpa e realize a desinfecção com água sanitária (solução de hipoclorito de sódio a 2,5%)
- Coloque duas gotas de água sanitária para um litro de água para inativação/eliminação de microrganismos que causam doenças
- Aguarde 30 minutos para beber a água, tempo necessário para o hipoclorito eliminar os microrganismos presentes na água
- Caso observe alguma alteração na água da torneira (como odor e/ou coloração diferente do habitual) entre em contato com a empresa de saneamento responsável pela distribuição e/ou a secretaria de saúde do seu município
Cuidado com alimentos
Após uma enchente ou inundação, é possível que os alimentos não estejam em condições adequadas para o consumo. Produtos contaminados podem causar diarreia, vômito, febre e, em casos mais graves, levar à morte. É importante evitar alimentos crus e mal lavados ou mal higienizados e dar preferência aos cozidos, assados e que estão em pacotes fechados.
Não devem ser consumidos:
- Alimentos com cheiro, cor ou aspecto fora do normal (úmido, mofado, murcho)
- Alimentos como leite, carne, peixe, frango e ovos, crus ou malcozidos, principalmente aqueles que entraram em contato com a água de enchente
- Frutas, verduras e legumes estragados ou escurecidos que entraram em contato com a água de enchente
- Alimentos cozidos ou refrigerados que tenham ficado por mais de duas horas fora da geladeira, principalmente carne, frango, peixe e sobras
- Alimentos com embalagem em plástico (garrafas PET, leite em saco, grãos ensacados) que tiveram contato com água da enchente devem ser descartados, mesmo que não tenham sido abertos
- Alimentos com embalagens em latas, plásticos e vidros que apresentem sinais de alteração, como inchaço, esmagamento, vazamento, ferrugem, buracos, tampas estufadas ou outros danos devem ser descartados, mesmo que não tenham sido abertos
*Fonte: Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs)