Correção: 85% dos profissionais que atuam na enfermagem são mulheres, e não 75% como publicado entre as 16h38min de 1 de julho e as 12h44min de 3 de julho. O texto já foi corrigido.
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou, na sexta-feira (30), o pagamento do piso nacional para enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares e parteiras que atuam no setor público e em hospitais filantrópicos, mas não entrou em consenso sobre o cumprimento do valor em hospitais e instituições privadas.
Lei aprovada em 2022 definiu, pela primeira vez, piso nacional de R$ 4.750 para enfermeiros, R$ 3.325 para técnicos de enfermagem e R$ 2.375 para auxiliares e parteiras. A lei agradou à categoria, mas gerou reação negativa de prefeituras e hospitais privados, segundo os quais não há dinheiro para custear a mudança.
A decisão já foi dada no que afeta o setor público. A maioria dos ministros do Supremo decidiu que Estados e prefeituras deverão pagar o piso, desde que o governo federal transfira recursos para os salários da categoria. Caso a União não envie verba, não será possível exigir o pagamento dos pisos. No setor privado, é preciso aguardar posicionamento final dos magistrados.
O que diz a categoria da enfermagem
Diretor do Fórum Nacional de Enfermeiros, que representa sindicatos de todo o país, Jorge Henrique de Sousa diz que a entidade está tranquila com a decisão sobre o pagamento do piso no setor público ser condicionado aos repasses da União porque a entidade conversou com o governo federal e recebeu a confirmação de que haverá verba para as transferências. Todavia, enfermeiros estão preocupados com as possíveis repercussões no setor privado.
— Os pareceres dos ministros são diversos. A gente avalia que essa decisão ficará para avaliação no plenário presencial em agosto. Nesse ínterim, vamos ver como o Fórum poderá atuar junto ao governo federal para garantir a aplicação do piso salarial. Obviamente que o julgamento do Supremo sinaliza de forma negativa, mas esperamos fazer movimentações para nos resguardar alguns direitos — diz Sousa.
Presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Rio Grande do Sul (Sergs), Cláudia Franco defende que o piso seja pago imediatamente.
— Estamos abertos a negociações com os entes privados. Não sou contrária a chamar os sindicatos a discutir, é nosso papel fazer a negociação. O que vamos dizer? Não tem alteração de carga horária e não vamos ceder. A lei é clara: o piso está em vigor e a enfermeira que fazia 36 horas por semana passará a ser paga em R$ 4.750, se ganhava menos do que isso. Se enfermeira for demitida, não se pode contratar ninguém por menos de R$ 4.750. Também não pode ter técnico em enfermagem trabalhando sem supervisão de enfermeiro. Essa é a posição do sindicato — diz.
Presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Rio Grande do Sul (Coren-RS), Antônio Tolla destaca que a entidade não é responsável pela defesa salarial, a cargo do sindicato, mas que defende o pagamento do piso porque as condições de trabalhado de enfermeiros afetam o cuidado de pacientes. Segundo a entidade, 85% das pessoas que atuam na enfermagem são mulheres.
— Se Estados, municípios e rede privada não estavam organizados para pagar o piso, a culpa não é da enfermagem. Uma das visões do Supremo é de pagar conforme a carga horária. Mas temos enfermeiro no interior do Estado fazendo 44 horas por semana e ganhando um salário mínimo e meio, então não tem como diminuir — diz Tolla.
A reportagem tentou contato com o presidente do Sindisaúde-RS, que representa auxiliares e técnicos de enfermagem, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
O que dizem prefeituras
A Federação dos Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) enviou nota a GZH na qual afirma ser a favor do pagamento do piso, mas que não há garantia de repasses da União para cumprir com a obrigação.
"Até o momento, o recurso extraordinário de R$ 7,3 bilhões não foi repassado aos municípios e é insuficiente devido ao custo desses profissionais (estimativa da CNM é de um custo R$ 10,5 bilhões ao ano para os enfermeiros). O Ministério da Saúde está realizando junto aos municípios e Estados um levantamento até o dia 6 de julho para saber o valor necessário", diz a Famurs.
A entidade observa que a maior discussão está na garantia do repasse da União aos municípios e Estados nos anos subsequentes, "considerando que o recurso extraordinário levantado até o momento não faz parte do orçamento".
A Famurs diz que, como o orçamento segue o mesmo para os próximos anos, o pagamento do piso salarial para a enfermagem "afetaria a manutenção dos serviços de saúde que os municípios e Estados prestam atualmente, além de causar uma possível demissão em massa na iniciativa privada".
O que dizem hospitais
Após a publicação da decisão do Supremo Tribunal Federal na segunda-feira (3), a Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp) enviou nota na qual afirma que "a decisão do Supremo Tribunal Federal, adotando o chamado 'voto médio' sobre o piso da enfermagem, está sendo analisada detidamente pelos assessores jurídicos da Anahp. Como sempre, os hospitais associados à entidade cumprirão rigorosamente o que estiver decidido em termos definitivos. Isto significa que, com diálogo e respeito, buscarão contato com os representantes da enfermagem e discutirão com transparência e espírito construtivo a situação salarial nas respectivas localidades, bem como a possibilidade e os limites para a ampliação do padrão salarial em cada hospital".
O Sindicato dos Hospitais Privados de Porto Alegre (Sindihospa) afirma que respeita e considera importante a valorização dos profissionais de enfermagem, fundamentais para o pleno atendimento na saúde.
Contudo, diz, em nota, que avalia ser necessário "que sejam fornecidas alternativas para o financiamento do piso, dado seu grande impacto nos setores público e privado, que já enfrentam desafios de sustentabilidade econômica".
O Sindihospa ainda afirma que, sem alternativas, há "risco de prejuízos e mesmo de vários serviços fecharem as portas pela impossibilidade de dar conta dos custos, como é o caso de serviços hospitalares, residenciais geriátricos, empresas de home care, afetando também famílias que possuem cuidadores de idosos". Quanto aos efeitos do julgamento na prática, a entidade "orienta que os empregadores da área da saúde ainda aguardem os desdobramentos no Judiciário".