Tarja preta é a mais alta categoria da classificação criada para controlar a comercialização de medicamentos no país, de acordo com os efeitos, o risco de dependência e os danos colaterais que cada um deles pode causar no usuário. Na novela Terra e Paixão, da Rede Globo, a personagem Petra, interpretada por Débora Ozório, é dependente de medicamentos dessa categoria.
Os remédios são divididos entre diferentes classes e grupos. Alguns não têm tarja, ou seja, são isentos de prescrição e podem ser facilmente adquiridos na farmácia. Outros são classificados como tarja vermelha, que é o caso dos antibióticos, por exemplo, e só podem ser vendidos com receita médica. Os remédios de tarja preta são, geralmente, compostos de fármacos que têm grande potencial para causar dependência física e psíquica.
Os mais conhecidos são os psicotrópicos utilizados para o tratamento de distúrbios psíquicos como depressão e ansiedade. São os chamados estimulantes, antidepressivos e ansiolíticos, que atuam em neurotransmissores do sistema nervoso central. Além desses, há, ainda, o grupo dos sedativos.
— A maioria dos medicamentos tarja preta são psicotrópicos e agem na fisiologia dos neurotransmissores. Eles são considerados tarja preta porque causam dependência e tolerância, e têm mais efeitos colaterais — pontua a farmacêutica professora do curso de Farmácia da Universidade Feevale Bárbara Spaniol.
Como os remédios tarja preta funcionam
Esses fármacos agem diretamente no cérebro do paciente e podem causar um efeito sedativo, analgésico ou estimulante, a depender das substâncias envolvidas na formulação e na indicação de uso. No geral, os medicamentos de tarja preta atuam no equilíbrio de neurotransmissores, que são os responsáveis por transmitir os impulsos nervosos.
Segundo o chefe do Serviço de Psiquiatria do Hospital Moinhos de Vento e professor titular do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Paulo Silva Belmonte de Abreu, esses psicotrópicos atuam no ácido gama-aminobutírico (Gaba), um neurotransmissor do corpo humano que tem função relaxante e é responsável por auxiliar no combate de sentimentos de ansiedade, estresse e medo.
— O cérebro tem uma espécie de fechadura e essas drogas agem como se fossem a chave. Elas abrem a porta do sistema cerebral para que o Gaba possa ligar, desligar, acalmar ou reduzir a ativação de algumas telas do cérebro. Esses remédios são muito úteis para uma série de transtornos, porque eles agem rápido — explica. Ou seja, o uso de um psicotrópico de tarja preta pode auxiliar o paciente com insônia a dormir mais rápido ou reduzir os efeitos de uma crise de pânico, por exemplo.
Também é possível encontrar, entre os remédios tarja preta, fármacos que são considerados emagrecedores. Destinados ao tratamento da obesidade, sob orientação e acompanhamento médico, eles costumam ser usados incorretamente por pessoas que desejam perder peso, o que causa sérios riscos à saúde.
Os remédios tarja preta são indicados para o tratamento de diversas condições, tais como:
- Dor intensa aguda ou crônica
- Dor pós-operatória
- Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)
- Obesidade
- Epilepsia
- Ansiedade aguda e crônica
- Ansiedade associada à depressão
- Síndrome do pânico
- Fobia social
- Bipolaridade
- Depressão
- Vertigem
- Insônia
Quais os efeitos colaterais dos remédios tarja preta
Além da dependência física e psíquica, que pode levar a um quadro de abstinência quando o tratamento termina, os medicamentos de tarja preta podem ocasionar o que os médicos chamam de tolerância. Trata-se de um quadro no qual o organismo passa a necessitar de doses cada vez maiores do medicamento para obter o efeito desejado, pois se "acostumou" com a substância.
O potencial de dependência e tolerância dos remédios variam de acordo com uma série de fatores, como a composição do fármaco e o organismo do paciente. Paulo Silva Belmonte de Abreu afirma que é difícil prever esses efeitos.
— Tem alguns medicamentos que em três meses de uso já geram dependência. Outros podem demorar dois anos — contextualiza o psiquiatra. Conforme o paciente aumenta a dose ou frequência do uso, surge a tolerância e a dependência.
Com a interrupção do tratamento, seja com orientação médica ou não, podem aparecer os sinais de abstinência. O paciente passa a precisar do remédio para se sentir produtivo, dormir bem ou ficar calmo, por exemplo. A abstinência pode trazer efeitos como irritabilidade, insônia, tonturas, dores de cabeça, enjoo, suor excessivo, falta de coordenação motora e até vertigens.
— Tanto para ampliar quanto para diminuir a dose, ou fazer o desmame do medicamento, um médico deve ser consultado. Os medicamentos de tarja preta não podem ser retirados de forma abrupta, o paciente deve ir diminuindo a dose e a frequência gradualmente, com acompanhamento médico — enfatiza a farmacêutica Bárbara Spaniol.
Tratamentos com remédios tarja preta
O tratamento com esses medicamentos, independentemente da classe e da função, não seguem um padrão. Em alguns casos, pode ser um tratamento contínuo, com reavaliação periódica da dose e da frequência do uso. Em outros, deve ser uma medida temporária, com prazo para redução da ingestão.
— É importante pontuar que são drogas coadjuvantes. Elas não curam a depressão, mas promove bem-estar em algumas situações para que o paciente possa ficar bem. São drogas muito úteis e não devem ser aposentadas, mas elas não irão mudar a doença — defende o psiquiatra e professor da UFRGS.
Ele relata, ainda, que a dependência pode deixar o paciente em um estado de alienação mental, que lembra um quadro de demência. Por isso, a orientação médica a respeito do tempo de uso deve ser respeitada.
Como são vendidos os remédios tarja preta
Por essas razões, os remédios de tarja preta apresentam, em suas embalagens, a seguinte frase: "Venda sob prescrição médica, o abuso deste medicamento pode causar dependência". Diferentemente de medicamentos isentos de prescrição, os remédios de tarja preta necessitam de receita médica e têm venda controlada pelo Ministério da Saúde e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A receita dos remédios tarja preta fica retida na farmácia no momento da compra e vem acompanhada de dois tipos de notificação de receita, amarela ou azul. A amarela tem uma validade de 30 dias a partir da data da prescrição e vale em todo o território nacional. Já a azul é válida somente dentro da unidade federativa em que foi feita a prescrição, mas também é válida por 30 dias.
Entre os medicamentos que utilizam receita amarela estão fármacos como morfina, codeína e oxicodona. Já entre os remédios tarja preta que são comercializados através de receita azul estão psicotrópicos como zolpidem, clonazepam – vendido comercialmente como rivotril – e diazepam, além de produtos à base da sibutramina, substância utilizada para tratar a obesidade.
*Produção: Yasmim Girardi