Conferência promovida pela Academia Americana de Pediatria (AAP) neste mês na Califórnia, nos Estados Unidos, reforçou uma orientação a mães e pais: o consumo de café e outras bebidas com cafeína por crianças deve ser restringido e desencorajado.
Tiveram especial repercussão relatos a respeito de crianças que são levadas a serviços de emergência de hospitais por apresentarem batimentos cardíacos irregulares ou taquicardia sem causa aparente — na sequência, descobre-se que elas haviam ingerido refrigerantes do tipo cola, café ou chá horas antes.
Os resultados de um estudo realizado em Boston e publicado em 2015 no Journal of Human Lactation também foram citados e chamaram a atenção no encontro: 14% das mães informaram permitir que seus filhos de até dois anos tomassem entre 30ml e 120ml de café por dia. No levantamento, também se demonstrou que 2,5% das entrevistadas davam café para bebês menores de um ano.
São comprovados cientificamente inúmeros benefícios do café para a saúde do adulto, mas a AAP é rigorosa na recomendação de restrição de cafeína para o público infantil: crianças não devem consumir café, chá, refrigerante, bebidas esportivas (isotônicos) e energéticos antes dos 12 anos. Dos 12 aos 18 anos, a ingestão não deve ultrapassar 100mg diários.
Tadeu Fernando Fernandes, presidente do Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), explica que a cafeína é um estimulador do sistema nervoso central e periférico. Um dos principais efeitos disso é o revigoramento, com redução do sono e da fadiga, fazendo com que o consumo moderado (de 200mg a 300mg ao dia) pelos adultos proporcione sensação de bem-estar, aumento da concentração, do estado de alerta e da energia. A performance cognitiva e a reatividade também melhoram. Mas em uma das principais vantagens também está um malefício: a cafeína pode alterar o sono, principalmente se consumida no período da tarde ou à noite.
Não há consenso sobre limites seguros
Com base em uma revisão da literatura científica sobre uso de cafeína na infância e na adolescência, Fernandes afirma ficar evidente que a ingestão de bebidas contendo cafeína não traz benefícios à saúde infantojuvenil.
— Muito pelo contrário: pode até interferir no desenvolvimento neurocognitivo e influenciar o sistema cardiovascular, além do risco de dependência e intoxicação — alerta o médico da SBP.
— Não existe consenso ou recomendação mundial estabelecendo limites para o consumo de cafeína por crianças e adolescentes, sendo nossa obrigação alertar pais e cuidadores que existem outras opções alimentares mais saudáveis para se oferecer às crianças — completa.
Para o Rio Grande do Sul, um componente cultural também precisa estar no horizonte das famílias: o chimarrão, que muitas vezes tem o consumo incentivado desde muito cedo, também contém cafeína. Roberto Zagury, endocrinologista e membro da Comissão de Comunicação Social da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), orienta que crianças não devem ser estimuladas a tomar café, mas faz uma ponderação quanto ao chimarrão:
— Não é preciso tolher uma questão cultural e afetiva também, já enraizada, mas não se pode deixar a coisa sem freio.