Excluídas, até o momento, da campanha de vacinação contra a covid-19 no Brasil, as crianças passaram a somar uma proporção maior dos internados por coronavírus no Rio Grande do Sul nos últimos meses.
O percentual de menores de 12 anos, que ficava abaixo de 1% entre os hospitalizados no primeiro semestre deste ano, chegou a 2,4%, conforme dados preliminares de outubro. Especialistas avaliam que o crescimento em termos proporcionais se deve ao avanço da imunização em outras faixas etárias, que reduziu a procura por leitos entre os mais velhos, e não reflete, até agora, agravamento significativo da pandemia entre os pequenos.
A volta parcial as aulas, a partir de maio, não teve impacto negativo visível em termos de casos graves de covid. Em números absolutos, as internações mensais infantis chegaram a 115 ao longo de março, no pico geral da doença, e mesmo com a reabertura das escolas passaram a oscilar com tendência de queda até chegar a 22 registros em setembro, de acordo com dados do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe) analisados por GZH.
Em outubro, conforme notificações até o dia 25 e ainda sujeitas a atualizações retroativas, houve nova oscilação para cima, chegando a 32 – ainda abaixo de patamares de meses como junho ou julho.
– Não temos notado nenhum aumento relevante. Há uma oscilação do número de internados muito parecida com o que vemos desde o início da pandemia, fora os momentos críticos – analisa a professora de Epidemiologia da UFRGS e integrante do Comitê de Dados do Piratini Suzi Camey.
O epidemiologista e professor da UFRGS Paulo Petry explica que o avanço das hospitalizações de crianças em termos proporcionais se deve ao fato de que estão caindo os casos graves de adolescentes e adultos graças à vacinação. Registros do Sivep mostram, por exemplo, redução geral nas internações por covid de 2,5 mil em agosto para 1,8 mil em setembro (mês mais recente com estatísticas completas).
Felizmente, as crianças não têm uma mortalidade elevada, mas algumas já morreram, e podem contrair e transmitir a doença. A imunização desse grupo nos ajudaria a alcançar a imunidade coletiva que as vacinas oferecem. Não foram observados efeitos colaterais significativos.
PAULO PETRY
Epidemiologista e professor da UFRGS
– Felizmente, as crianças não têm uma mortalidade elevada, mas algumas já morreram, e podem contrair e transmitir a doença. A imunização desse grupo nos ajudaria a alcançar a imunidade coletiva que as vacinas oferecem. Não foram observados efeitos colaterais significativos – diz Petry.
Nos Estados Unidos, um painel de especialistas recomendou, recentemente, a aprovação da vacina da Pfizer para crianças de cinco a 11 anos, mediante uso de dose menor em relação à dos mais velhos.
População abaixo de 14 anos soma 0,1% dos óbitos por covid
Dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES), que separam os registros de óbito por faixa etária até 14 anos, revelam situação de estabilidade nas notificações de morte entre esse grupo, que inclui as crianças e uma pequena parcela de adolescentes.
Desde março, em números absolutos, a quantidade de vítimas da covid tem ficado abaixo de três por mês. Em outubro, segundo dados disponíveis até esta sexta-feira (29), nenhuma morte havia sido informada oficialmente. Proporcionalmente, as vítimas com essa idade têm oscilado entre 0% e 0,3%. A média de todo o ano de 2021, até agora, é de 0,1%
O infectologista do Hospital Conceição André Luiz Machado da Silva entende que não há urgência na aprovação de imunizantes para esse grupo no Brasil – embora acredite que as vacinas são seguras, e os benefícios superam eventuais riscos como relatos esporádicos de miocardite (inflamação do músculo cardíaco) entre adolescentes e adultos jovens nos EUA que utilizaram produtos de mRNA como da Pfizer:
Não sou contra a imunização, mas também podemos proteger as crianças de outra forma, imunizando a população que tem contato com elas. Não houve avanço de casos após a volta às aulas porque toda a rede de apoio estava imunizada.
ANDRÉ LUIZ MACHADO DA SILVA
Infectologista do Hospital Conceição
– A vacina da Pfizer já mostrou ser segura. Mas os pais temem porque ainda não temos experiência significativa de uso em crianças, e considero lícito esse temor. Não sou contra a imunização, mas também podemos proteger as crianças de outra forma, imunizando a população que tem contato com elas. Não houve avanço de casos após a volta às aulas porque toda a rede de apoio estava imunizada.
O presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, pondera que uma onda recente de covid nos Estados Unidos afetou basicamente os não vacinados, o que incluiu a população infantil. Por isso, entende que, se houver liberação da Anvisa, os pequenos deveriam receber as suas doses no Brasil.
– Se tivermos vacina eficaz e segura, que possa proteger individualmente e contribuir para a coletividade, consideramos benéfico incluir esse grupo na campanha de imunização – sustenta Cunha.