Em meio ao avanço da vacinação, o número de pacientes com coronavírus nas unidades de terapia intensiva (UTIs) de Porto Alegre chegou ao nível mais baixo em cerca de oito meses – desde antes da disseminação da variante P.1 que, combinada ao desleixo com ações preventivas, levou ao pico da pandemia em março deste ano.
As 231 internações registradas no painel de monitoramento da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) até as 16h desta quarta-feira (21) representam a menor demanda desde 15 de novembro do ano passado, quando havia apenas um doente a menos em estado crítico. Graças a esse relativo alívio, que se reflete também nos números gerais do Estado, hospitais planejam enxugar a estrutura voltada a pacientes da covid-19 enquanto ampliam o atendimento a outros problemas de saúde represados.
– Acreditamos que esse resultado é fruto da vacinação, que mantemos de domingo a domingo, e de uma maior conscientização de todas as pessoas em relação aos protocolos sanitários, que foram muito descumpridos durante o verão, mas depois as pessoas ficaram mais temerosas e passaram a respeitar mais – analisa o secretário municipal da Saúde de Porto Alegre, Mauro Sparta.
A quantidade de doentes graves com exame positivo para o novo vírus segue em declínio na Capital desde 25 de março, quando alcançou um pico de 870 hospitalizações. Mas o cenário atual foi ainda mais favorecido por recuos recentes na demanda por leitos de UTI. Apenas nas últimas duas semanas, houve uma queda de 22% nas vagas em uso pela pandemia.
Os gestores hospitalares também atribuem esse alívio ao avanço da campanha de imunização, que, segundo o painel estadual de acompanhamento, chega a 55% da população com uma dose e pouco mais de 30% com esquema vacinal completo no município.
– Nossos pacientes de UTI costumavam ter mais de 70 anos e quadros gravíssimos. Com a vacina, essa faixa já caiu para 40 a 55 anos – observa o diretor técnico da Santa Casa, Ricardo Kroef.
Em razão disso, os principais hospitais da cidade planejam intensificar a conversão de leitos de covid-19 em vagas para receber doentes com outros problemas. A Santa Casa já havia reduzido a capacidade da UTI de coronavírus de 65 para 48 leitos – dos quais apenas metade estava ocupada na tarde desta quarta. Quando essa demanda chegar a cerca de 15 internações, a intenção da diretoria é cortar pela metade o tamanho da ala covid.
A ociosidade é ainda maior nas alas clínicas, onde apenas nove doentes com exame positivo se encontravam em meio a 43 camas disponíveis.
– A partir da próxima segunda (26), vamos transferir esses pacientes para uma ala menor, de 23 leitos, e vamos direcionar os 20 restantes para outros pacientes. Hoje somos pressionados por uma imensa demanda de doentes não covid que tiveram seus diagnósticos atrasados por conta da pandemia – complementa Kroef.
O Hospital Conceição deverá reduzir o número geral de vagas em UTI de 75 para 69 na próxima semana, devolvendo seis leitos que pertenciam originalmente a salas de recuperação e foram usados para atender coronavírus. Com isso, será possível ampliar ainda mais o socorro a outras patologias.
– Já estamos quase voltando ao patamar de cirurgias eletivas que tínhamos em 2019, quando fizemos 988 procedimentos até junho. Baixou para 588 no ano passado e, agora, já atingimos 856 nesse mesmo período – afirma o diretor-presidente do Grupo Hospitalar Conceição, Cláudio Oliveira.
Assim como na Santa Casa, a maior parte dos 55 leitos clínicos destinados à pandemia está ociosa: apenas 30% se encontravam em uso.
O Hospital de Clínicas, por segurança contra eventuais repiques provocados por fatores como o avanço da variante Delta, por enquanto anuncia a manutenção das 105 vagas da UTI covid – onde havia 56 internados com diagnóstico confirmado à tarde. Mas, conforme a coordenadora do Grupo de Trabalho de Enfrentamento ao Coronavírus da instituição, Beatriz Schaan, deverão ser feitos ajustes para otimizar o uso da enfermaria onde há 18 vagas.
– Chegamos a ter 80 leitos de enfermaria no pior momento. Já diminuímos para 18, mas estamos com apenas seis pacientes, o que reduz nossa eficiência. Provavelmente, vamos usar essas vagas para pacientes pós-covid, que recém deixaram de positivar (o exame para o vírus) ou saíram da UTI – afirma Beatriz.
A partir de segunda-feira, o Clínicas vai elevar o atendimento no bloco cirúrgico de 60% para 85% em comparação aos patamares pré-pandemia. Mas Beatriz Schaan lembra que o atual cenário ainda é incerto e não permite baixar a guarda contra o coronavírus:
– No Reino Unido, a entrada da variante Delta aumentou as contaminações, mas sem elevar os casos críticos. Mas eles estão com a vacinação muito adiantada (53% das pessoas com as doses necessárias). Com pouco mais de 20% da população gaúcha com esquema vacinal completo, temos alguma proteção, mas não como em outros países.
Caem hospitalizações por covid em UTIs e leitos clínicos no RS
O cenário de recuo nas internações por coronavírus verificado na Capital se repete em outras regiões. Nos dados gerais de todo o Rio Grande do Sul, a quantidade de doentes com covid-19 sob tratamento intensivo caiu 26% nas últimas duas semanas e, na tarde desta quarta-feira (21), estava em 1.084 pacientes com diagnóstico confirmado. É um patamar ainda alto, mas bastante diferente da situação em março, quando foi superada a barreira de 2,6 mil internações.
O dado desta quarta é levemente superior ao da véspera, quando foram informadas 1.070 pessoas em UTIs em razão da pandemia. Essa oscilação de 1%, porém, é pouco significativa em termos estatísticos se for levado em conta que a tendência de declínio se mantém desde o começo de junho e que as alas clínicas (de onde costumam sair os pacientes para as UTIs) indicam recuo ainda mais forte.
Em todo o Estado, a queda de demanda nos leitos em nível de enfermaria chegou a 36% nas últimas duas semanas: passou de 1.444 para 927 até as 15h de quarta – cifra mais baixa desde 3 de fevereiro, quando ficou em 919. Graças a esse cenário, a taxa geral de ocupação nas UTIs gaúchas, que chegou a bater em 110% em meados de março, se encontrava em 70% no meio da tarde.
Uma das explicações para o relativo alívio da pandemia é o avanço da imunização, que já beneficiou 53% dos gaúchos com uma dose e 23,4% com esquema vacinal completo. Porém, como estima-se ser necessário alcançar pelo menos 70% da população totalmente protegida para frear a transmissão do vírus, especialistas reforçam a importância de manter a aplicação das doses e cuidados como distanciamento social, uso de máscaras e higienização das mãos.