Alvo de investigação do Ministério Público Federal (MPF) e da CPI da Covid, o contrato firmado para a compra da vacina Covaxin está sendo avaliado também pelo próprio Ministério da Saúde. O acordo firmado entre a pasta e a Precisa Medicamentos, representante do Instituto Bharat Biotech, da Índia, chega a R$ 1,6 bilhão — e, conforme a procuradora do MPF Luciana Loureiro, deveria ser anulado.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, na manhã desta quinta-feira (24), o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, admitiu que a suspensão do contrato é uma das possibilidades estudadas:
— Esse instrumento de suspensão é previsto na lei e é uma das alternativas que se tem no Ministério da Saúde, dentre outras. A suspensão de fato é uma alternativa que pode ser usada, caso essa seja a conclusão após os estudos do ministério — disse Cruz, em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade.
Conforme cronograma estabelecido em contrato, o primeiro lote de 4 milhões de doses deveria ser entregue em até 20 dias após a assinatura do acordo — feita em 25 de fevereiro. Desta forma, as primeiras vacinas deveriam ter chegado ao Brasil em 17 de março, e o total, de 20 milhões, até 6 de maio. Contudo, nenhum imunizante da Covaxin entrou em território brasileiro até agora.
A negociação durou cerca de três meses, prazo bem mais curto do que o de outros acordos — como o da Pfizer, por exemplo, que durou quase 11 meses. Na CPI da Covid, os senadores querem entender por que o governo priorizou a vacina indiana.
Documentos do Ministério das Relações Exteriores mostram que o governo comprou a vacina por um preço 1.000% maior do que, seis meses antes, era anunciado pela própria fabricante. À Rádio Gaúcha, Cruz admitiu que a Covaxin teve o custo mais caro dentre todos os imunizantes negociados pelo Brasil, mas garante que nenhum valor foi desembolsado até agora pelo produto.
— O valor do contrato é público, R$ 1,6 bilhão, o que totaliza algo perto de US$ 15 por dose. De fato é o valor mais alto de todos os contratos celebrados. Estão sendo estudadas pelo Ministério da Saúde as condições desse contrato. Mas é importante dizer que, até agora, nenhum recurso foi despendido para adquirir a vacina Covaxin. (...) Quando se diz que nenhuma dose foi comprada, é porque o contrato condiciona a compra ou o pagamento à aprovação pela Anvisa, e isso não aconteceu. Então não houve nenhum dispêndio de recurso público para pagamento dessas doses.
O secretário-executivo explicou ainda que é necessário que o governo negocie com CNPJs brasileiros para compra de vacinas, o que acontece com a Pfizer e com a Janssen — no caso da Sinovac (CoronaVac) e AstraZeneca (vacina de Oxford), as compras são feitas via Instituto Butantan e Fiocruz, respectivamente. Por isso, foi necessária a intermediação com a Precisa Medicamentos na negociação pelo imunizante indiano.
— A gente tem essa necessidade de mais vacinas, mas, ao mesmo tempo, precisa ter garantia de que há correção no contrato, pelo zelo da coisa pública que todo servidor deve ter. Como a gente ainda não despendeu nenhum recurso público para aquisição do imunizante, a gente quer ter toda a certeza de que esta indo no caminho correto antes de tomar alguma decisão.
Conforme a procuradora Luciana Loureiro, há indícios de favorecimento aos sócios da empresa Precisa Medicamentos e também de irregularidades percebidas logo na origem do contrato, além de relatos de uma "pressão anormal" para que fosse firmado.
Ouça a entrevista com Rodrigo Cruz:
Mais doses da Janssen
Na entrevista, Rodrigo Cruz também falou sobre a chegada das vacinas da Janssen, as primeiras de dose única aplicadas no Brasil. O país está distribuindo 1,5 milhão de doses e recebe, nesta quinta, mais 300 mil.
Além disso, conforme o secretário-executivo, mais 3 milhões estão previstas para esta sexta-feira (25), fruto de doação do governo norte-americano. Assim, o Brasil terá recebido, ao fim desta semana, um total de 4,8 milhões de doses do imunizante.
— A gente tem conversado semanalmente com os laboratórios e sempre coloca esse pleito da antecipação das doses. É pleito recorrente do ministério.
Segundo ele, o mês de junho vai terminar com 40 milhões de doses recebidas, e o de julho, com 41 milhões. Já os meses de agosto e setembro têm previsão de um volume superior a 60 milhões cada.
O fato de outros países estarem avançando na imunização de suas populações permite ao Brasil ter mais clareza no seu próprio cronograma:
— Antes tinha uma dificuldade ou escassez de doses. A gente ainda tem isso, mas o desafio de outros países que têm a produção em seus laboratórios era imunizar a população. À medida em que esses países conseguem avançar na imunização dos seus habitantes, a gente pode ter um pouco mais de clareza, de certeza, no cumprimento do cronograma.
Segundo Cruz, o governo também estuda a inclusão de adolescentes com comorbidades nos grupos prioritários e espera ter uma reposta "em breve". Cerca de 2,5 milhões de pessoas estão incluídas nesse grupo.