O rumo da pandemia no Rio Grande do Sul, onde cinco regiões já receberam alertas do governo estadual por tendências de agravamento da covid-19 nesta semana, é visto com preocupação também pelo que está ocorrendo em Estados e países próximos.
Argentina, Uruguai e Paraná registram aumento expressivo de novas contaminações principalmente nas últimas duas semanas — a situação mais complicada é a dos paranaenses, onde o acumulado semanal de casos disparou 52% nesse período.
A evolução da doença nessas áreas foi um dos pontos abordados pelo governador Eduardo Leite em uma transmissão realizada via internet na terça-feira (18), quando detalhou as razões que motivaram a emissão de alertas a cinco regiões gaúchas como crescimento de novos casos e hospitalizações. Leite também comentou o risco de o Estado enfrentar um novo ciclo de avanço generalizado do coronavírus.
O temor é de que a escalada de contaminações no sul do continente, praticamente “cercando” o território gaúcho, prejudique a luta do Rio Grande do Sul contra o vírus. A pandemia passou a dar sinais de estabilidade após semanas de declínio e, neste mês, o vírus já começa a circular com mais força outra vez em municípios como os das regiões de Santo Ângelo, Cruz Alta, Ijuí, Cachoeira do Sul e Passo Fundo.
— Um dos fatores de preocupação é sempre o aumento simultâneo (de casos) em mais regiões. Quando isso acontece, significa que há muitas pessoas infectadas ao mesmo tempo em muitos locais. Quando são teus vizinhos, liga ainda mais a luz de alerta — analisa o cientista de dados e coordenador da Rede Análise Covid-19, Isaac Schrarstzhaupt.
Os dados mais recentes disponíveis até essa quarta-feira (19) indicam uma subida íngreme de novas contaminações na vizinhança do Rio Grande do Sul. No Paraná, entre os dias 4 e 18 de maio, o acumulado semanal de casos por 100 mil habitantes disparou de 228 para 346 — 52% a mais. O salto foi de 27% em solo argentino e de 20% no Uruguai.
Embora os uruguaios tenham registrado o menor crescimento nesse intervalo, apresentam o maior número semanal de novas infecções por 100 mil — 580, contra 399 na Argentina, 346 no Paraná e 215 no Rio Grande do Sul, que apontou queda de 19% nesse intervalo (veja mais informações no gráfico abaixo).
Embora as viagens internacionais estejam restritas, como lembrou o governador na terça, sempre há alguma circulação entre os países por razões como transporte de mercadorias, além dos contatos em municípios com fronteira seca.
— O Rio Grande do Sul não é uma ilha — enfatizou Leite.
O andamento da vacinação, até o momento, é mais intenso entre os uruguaios. Mesmo assim, os 27% de população com esquema de imunização completo ainda são insuficientes para promover uma barreira coletiva contra a circulação da doença. Para isso, é necessário algo ao redor de 70% das pessoas atendidas.
Alta circulação amplia risco de chegada de mais variantes
Além do risco de novo aumento na transmissão da doença, a alta circulação do coronavírus às portas do Estado aumenta o perigo de chegarem novas variantes. A mais recente onda da doença em solo gaúcho foi agravada, além da falta de cuidados preventivos, pela eclosão da chamada P.1.
— Hoje, diferentemente de outras epidemias do passado, que ficavam muito mais restritas, toda região de fronteira preocupa muito. Um dos riscos é a entrada de outras variantes — lembra o epidemiologista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Paulo Petry.
Dia 13 de maio, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) recebeu um comunicado do Ministério da Saúde com a confirmação de dois casos detectados na Argentina envolvendo infecção com a nova cepa indiana do coronavírus — considerada mais infecciosa e perigosa.
Conhecida pela sigla B.1.617, essa variação do vírus é apontada pela Organização Mundial da Saúde como uma das possíveis razões para o grande crescimento de casos e óbitos verificado na Índia neste ano. A SES informou que “mantém a preocupação e a vigilância nas fronteiras” e realiza análises periódicas para identificar as cepas em circulação no Rio Grande do Sul.
— Não podemos descartar o risco de (a alta circulação do vírus em locais próximos) trazer variantes novas, como essa indiana detectada na Argentina. Daqui a pouco, pela alta transmissibilidade, não é impossível que chegue aqui — alerta Petry.
O cientista de dados Isaac Schrarstzhaupt lembra ainda que a intensificação do frio, que favorece a contaminação de doenças respiratórias, é mais um fator agravante em comum no atual cenário no Cone Sul.