O medo de que uma terceira onda do coronavírus assole o continente europeu fez com que os mandatários de países como a Alemanha, a França e a Áustria passassem recentemente a exigir o uso de máscaras profissionais pela população. Agora, nessas localidades, é preciso utilizar as proteções de padrão FFP2 ou N95 em locais públicos, como em lojas e transporte. Isso porque elas oferecem uma proteção mais robusta contra as pequenas partículas do vírus que ficam suspensas no ar.
Apesar de no Brasil não haver exigência do uso destes tipos específicos pela população, especialistas ouvidos por GZH afirmam que a máscara médica também deveria ser a usada pelos brasileiros. Isso porque ela apresenta nível de proteção mais alto, contudo, eles reconhecem que a aquisição deste equipamento é inviável para a maioria das pessoas.
Um dos principais impeditivos está relacionado ao preço e até mesmo à disponibilidade. A reportagem contatou quatro redes de farmácias nesta segunda-feira (8) e somente uma tinha a proteção em estoque pelo valor de R$ 13,90. A durabilidade desta máscara é de até sete dias.
Para Paulo Petry, professor de Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o novo protocolo adotado pelos países europeus diz respeito ao medo em relação à nova cepa do coronavírus que circula no continente e que é apontada como mais transmissível.
— Daí surgiu essa recomendação de uso de EPIs mais eficazes e que apresentem o cumprimento de padrões técnicos de qualidade. As máscaras do tipo N95 ou PFF2 filtram 95% das partículas, se adaptam melhor ao rosto, evitando que o ar entre ou saia sem ser filtrado. Além disso, a máscara em si tem uma vedação muito boa junto à face e a trama de tecido cria uma barreira mecânica frente às partículas grandes. Já os aerossóis (partículas pequenas que ficam suspensas no ar), ficam presos nas fibras com carga elétrica. É o que chamamos de barreira eletroestática — pontua.
Entretanto, Petry reconhece que a adoção desta proteção pelos brasileiros é praticamente inviável:
— Se a N95 ou FFP2 se tornar o padrão de uso na rua ainda teremos EPI para os profissionais de saúde que atuam na linha de frente no combate à pandemia? Eu acredito que isso aumentaria o custo do produto, logo, a capacidade de oferta. Quem tiver condições de adquiri-la, pode utilizá-la em situações extremas de aglomeração, como no transporte público, porque ela é a melhor que temos. Nas demais situações, usar a máscara de pano.
Aliada a outras medidas, máscara de tecido auxilia no enfrentamento à pandemia
Apesar das ressalvas, essa é a mesma linha de raciocínio de Cláudia Bica, professora de Biossegurança da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Ela afirma que a N95 é bem mais eficaz e que ela pode ser adotada por quem tiver condições financeiras de arcar com esse investimento. Porém, a especialista pontua que usar uma máscara de pano corretamente é melhor do que ignorar a importância deste item.
— Não há nenhum estudo científico que comprove a eficácia das proteções de tecido. Não existe um padrão de fabricação para elas nem uma aferição de qualidade. Esse tipo de máscara não é considerado um EPI, ela ajuda a proteger outras pessoas das partículas emitidas por um infectado, mas não filtra o ar inspirado. É preciso reforçar que o uso das máscaras caseiras precisa estar alinhado com o distanciamento de 1,5 metro e a lavagem constante das mãos — afirma.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) não recomenda uso das de tecido entre o público para o controle da covid-19. No entanto, para áreas de transmissão generalizada, com capacidade limitada para implementar medidas de controle e especialmente em locais onde o distanciamento físico de pelo menos 1 metro não é possível, a entidade aconselha os governos a incentivarem a população em geral a usar máscaras de tecido.
Em função disso, em junho passado, a entidade deu diretrizes de como deve ser a máscara caseira ideal. A máscara precisa ter três camadas. Cada uma delas cumpre uma função diferente: a interna deve ser confeccionada com um tecido absorvente, como o algodão; a externa precisa ser feita com um tecido resistente à água, como o poliéster. Por fim, a do meio funcionará como um filtro. Nela você pode usar polipropileno, ou uma camada de algodão.
Cláudia ressalta que as máscaras de pano atuam como barreiras físicas, reduzindo a propagação do vírus e, consequentemente, a exposição e o risco de infecções. Mas que, diferentemente das profissionais, essas máscaras comuns não possuem um elemento filtrante. A professora da UFCSPA recapitula os cuidados necessários com as proteções de tecido:
— Se ela estiver úmida é porque chegou a hora de trocar. A máscara, quando úmida, perde sua capacidade de criar uma barreira física em relação às partículas. Na hora de lavar, use água, sabão e água sanitária. Vale lembrar que a Anvisa e a OMS recomendam seu uso quando não há outra alternativa, mas aqui no Brasil, ela se tornou a regra, não a exceção.
Questionada pela reportagem, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou que “as máscaras para a população em geral não estão sujeitas à regulação da Anvisa. A agência regula somente máscaras para uso por profissionais da saúde”. As orientações de fabricação seguem os mesmos moldes da OMS. GZH também procurou o Ministério da Saúde para saber se há algum movimento de mudança nos protocolos brasileiros, mas não obteve resposta até o fechamento da reportagem.