Há um ano lutando contra atrofia muscular espinhal (AME), a bebê Júlia Cardoso Torres, a Juju, ganhou uma nova esperança. A menina, de um ano e sete meses e que corre contra o tempo para combater a síndrome até os dois anos de vida – idade limite para a eficácia do tratamento – foi sorteada para integrar o estudo que concederá, gratuitamente, medicação exclusiva que pode reverter a falha genética. O Zolgensma, remédio mais caro do mundo, custa US$ 2,1 milhões (no câmbio atual, cerca de R$ 11 milhões).
A etapa final para receber a aplicação, em dose única, inicia-se nesta quinta-feira (17), com a realização de exames de sangue em Santa Cruz do Sul, onde ela vive com os pais. Os testes serão enviados aos Estados Unidos. Se aprovada como compatível, a terapia com a medicação ocorrerá no Brasil, na capital de Pernambuco, cidade onde o estudo é realizado.
O registro do Zolgensma no Brasil, através da farmacêutica Novartis, ocorreu há um mês, em 17 de agosto, o que desobriga a família do Vale do Rio Pardo a viajar para a América do Norte. Gera, ainda, a esperança de o tratamento ser oferecido inclusive pelo Sistema Único de Saúde (SUS), no futuro.
Mãe de Juju, a médica Silviane Bica Cardoso diz estar com o coração pulando mais do que o normal desde que foi avisada sobre a seleção da filha, ocorrida no início desta semana. Ouça o depoimento de Silviane:
Segundo a médica, ela é a primeira gaúcha a ser contemplada com a iniciativa. Há outras duas crianças brasileiras recebendo a medicação sem custos, pelo mesmo programa da Novartis.
Juju foi inscrita para concorrer ao tratamento gratuito em janeiro, porém a família não deixou de buscar recursos para salvar a vida da bebê. Pedágios em semáforos, vaquinhas virtuais e até uma rifa, que premiará o sorteado com um terreno em um condomínio de alto padrão, foram realizados. O valor atual, informado pelo site amejuju.com.br é de R$ 3,5 milhões, campanha que não será interrompida.
— Se ela conseguir o tratamento gratuito, esse valor será revertido a outras crianças com AME — informa Silviane.
Voluntária nas iniciativas para buscar os R$ 12 milhões, a Susi Bica, prima de Juju, chorou ao saber da boa notícia.
— Estou louca pra pular e comemorar, mas a campanha é nossa única certeza. Temos só que esperar um pouquinho mais, com fé — diz a consultora de moda.
Os exames que Juju faz nesta quinta-feira são para apontar que a menina não tem imunidade para o adenovírus-9, o AV-9. Também são realizados exames de fígado e nos músculos.
A doença, que afeta um a cada 10 mil recém-nascidos, já foi tratada com o medicamento em outra gaúcha, da mesma região: a pequena Lívia Teles, de um ano e 10 meses, recebeu em agosto passado a dose de Zolgensma. Moradora de Teutônia, a família viajou para Boston no final de julho. O valor milionário foi bancado também através de mobilizações de solidariedade, uma campanha que durou um ano, e teve doadores até do Exterior.
Segundo estudos científicos avaliados pelo Instituto Nacional de Atrofia Muscular Espinhal (Iname), a síndrome é a principal causa de morte de bebês por questão genética. Com baixos níveis de SMN, proteína que possibilita os movimentos, as crianças com AME têm fraqueza progressiva dos músculos e atrofia, o que pode levar à morte por falência respiratória.
Saiba mais sobre a doença
- A atrofia muscular espinhal (AME) é uma doença genética e hereditária que resulta em fraqueza progressiva dos músculos e atrofia, podendo levar à morte por falência respiratória.
- Ela é causada por mutações em um gene, o SMN1. Pessoas com apenas uma única cópia alterada do gene não terão sintomas da doença, mas são portadoras. Caso tenham filhos com outra pessoa que também tem uma cópia mutada, há 25% de chance dos filhos manifestarem a Ame.
- É classificada com base na idade de início:
TIPO 1 – Forma severa que pode se manifestar no bebê ainda no útero da mãe.
TIPO 2 – Forma intermediária que se manifesta entre 3 e 15 meses de idade.
TIPO 3 – Forma menos severa, a partir dos 2 anos até a vida adulta.
- Sem uma cura definitiva, o tratamento exige fisioterapia e aparelhos ortopédicos. O único medicamento no mundo disponível até agora, o Spinraza, atua para impedir que a degeneração progrida, sendo de uso contínuo. É necessária internação e anestesia geral para que o medicamento seja injetado.
- O Zolgensma é aplicado diretamente na corrente sanguínea, sem necessidade de internação ou aparato mais complexo. Ele tem a capacidade de corrigir o DNA danificado que causa a doença.
- Com ambos os medicamentos, o diagnóstico precoce é fundamental. Para isso, é necessário o chamado teste do pezinho expandido, que atualmente não é oferecido pelo SUS e custa aproximadamente R$ 80 a mais do que o teste tradicional.