Uma plataforma gratuita para diagnóstico da covid-19 por meio da inteligência artificial, que consegue identificar precocemente indícios da infecção mesmo na ausência de testes laboratoriais, não tem conseguido atrair hospitais públicos.
Das 35 instituições de 12 Estados cadastradas até o momento, apenas um terço (32%) é do SUS. A ferramenta foi desenvolvida pelo Instituto de Radiologia (InRad) da USP com apoio de vários parceiros, entre eles o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e está no ar desde maio.
Entre os serviços de saúde que já fazem parte da plataforma estão o Hospital das Clínicas de São Paulo, o Sírio-Libanês e a rede Fleury.
Conforme a reportagem apurou com gestores de hospitais, os entraves que estão impedindo a adesão de mais hospitais públicos são vários. Desde o desconhecimento sobre a plataforma, medo de invasão de hackers no sistema de informações até receio de parte dos radiologistas de que a tecnologia "tire" o emprego deles.
A plataforma, chamada RadVid-19, utiliza imagens de raios-X e tomografias de tórax de pacientes e, a partir delas, faz uma análise online com base nos algoritmos de inteligência artificial.
Segundo a médica Claudia Leite, professora do departamento de radiologia do HC, há um esforço conjunto para atrair mais instituições públicas para o projeto, uma vez que muitas ainda não têm acesso rápido aos testes diagnósticos:
—É uma ferramenta que pode ajudar muito.
Dos 9.200 exames analisados até a última sexta-feira (17), cerca de 70% deram resultado compatível com infecção pelo novo coronavírus.
O acesso à plataforma é fácil, não precisa de nenhum programa adicional. O médico entra no site, faz um upload do exame de imagem e já tem o resultado da probabilidade da covid-19 a partir de dois algoritmos: um da empresa Huawei, testado na China, e outro da Siemens, da Alemanha.
O diagnóstico é realizado por meio da identificação de padrões comuns da doença verificados nas imagens armazenados no banco de dados.
A ferramenta também indica o grau de comprometimento pulmonar, o que pode ajudar a equipe médica a definir a conduta mesmo antes do resultado do teste.
Uma outra situação que a plataforma tem sido muito útil, segundo Claudia Leite, é nos casos de testes com resultado falso negativo.
— É uma situação frequente testes laboratoriais com resultados negativos e o pulmão já estar comprometido. Quanto mais acometido, mais chance de o quadro piorar muito rapidamente.
Foi o que aconteceu com Priscila Ribeiro, 35, em maio último. Com sintomas de sinusite e perda de olfato, ela fez um teste sorológico, que deu negativo. Mas em seguida uma tomografia apontou que 25% do pulmão estava comprometido, com lesões características da covid-19.
Com o resultado do exame de imagem, ela começou o tratamento com antibióticos e corticoides, antes mesmo de o teste RT-PCR ficar pronto, confirmando o diagnóstico.
— Não tinha febre ou falta de ar. Só doía um pouco quando eu respirava — disse.
Dias depois, desenvolveu embolia pulmonar e ficou oito dias e internada.
Segundo Leite, a plataforma também permite que médicos radiologistas em plantão online possam esclarecer dúvidas, uma espécie de segunda opinião.