O número de casos ativos de coronavírus no Rio Grande do Sul é bem maior do que o indicado no painel mantido pela Secretaria Estadual da Saúde (SES) e abastecido com informações repassadas pelas prefeituras. Esse é um dos critérios levados em consideração para a definição das bandeiras no modelo de distanciamento controlado atualmente em vigor.
Dados das administrações municipais das 10 cidades com maior número de pacientes em acompanhamento (excluídos recuperados e mortos), conforme ranking baseado nos dados consolidados pela SES, informam 154% mais casos do que aparece no site oficial dedicado a monitorar o avanço da pandemia.
Enquanto essas cidades somavam 931 casos na planilha oficial até a tarde de quinta-feira (11), os dados atualizados pelas prefeituras no mesmo período indicavam a existência de 2.363 pessoas com o coronavírus ativo. Apenas a soma dessa dezena de municípios já representa mais do que o total atribuído ao Rio Grande do Sul inteiro no painel — 2.140 ocorrências. Algumas gestões divulgam uma cifra inferior à contabilizada pelo Piratini, como Lajeado e Garibaldi (veja tabela abaixo), mas situações como as de Porto Alegre, Passo Fundo, Erechim e Santa Maria fazem disparar a contabilidade local em comparação à estadual.
O indicador de doentes ativos é importante porque sugere a potencial sobrecarga provocada pela pandemia sobre a rede de atendimento. Se uma localidade tem muitos casos acumulados, mas poucos deles ainda ativos, há pequena pressão sobre os postos de saúde e hospitais. Se há muitos, o risco aumenta na mesma proporção. Além disso, é um dos quesitos incluídos na fórmula do modelo de distanciamento controlado que define as bandeiras de alerta de cada região gaúcha.
Como uma das possíveis razões para a divergência entre os dados das prefeituras e do Estado é a demora na correta notificação das ocorrências por parte dos gestores locais, nesta quinta-feira, o governo estadual modificou a forma de cálculo para tentar reduzir o impacto desse descompasso na definição das bandeiras. Em vez de considerar o número de doentes ativos apenas no dia anterior, será contabilizada a cifra da semana inteira.
— Há um problema na data de inclusão (de novos casos), o que gera uma distorção. Vamos usar os casos ativos da última semana (e não do último dia) para corrigir esse problema de defasagem – afirmou a coordenadora do comitê de dados vinculado ao distanciamento controlado, Leany Lemos, durante transmissão via rede social em que foram apresentadas mudanças nas regras do sistema.
O atraso na notificação, pelo menos, sugere que o coronavírus pode não ser tão letal quanto indicam as estatísticas oficiais. Como elas são calculadas comparando-se o número de mortos sobre o total de exames positivos, um número de contaminados maior do que o registrado resultaria em uma taxa menor. Hoje, ela é de 2,3% no Rio Grande do Sul.
Capital identifica 700% mais casos ativos
Há situações em que nem a ampliação no número de dias considerados para contabilizar as pessoas com o vírus ativo no organismo corrigiria completamente as divergências entre as informações oficiais das prefeituras e do que chega para o Piratini.
Porto Alegre, por exemplo, aparece com apenas 148 pacientes em acompanhamento na planilha estadual. O mais recente boletim epidemiológico da prefeitura até então informava 1.850 casos acumulados, dos quais 619 pessoas se recuperaram e 50 morreram — o que resulta em 1.181 ainda convalescendo, ou quase 700% a mais.
Persiste uma grande defasagem nas notificações da Capital para o Estado. Até quinta-feira, faltavam entrar 605 registros do município no sistema utilizado pela SES e pelo Ministério da Saúde. Mas, mesmo se todas essas ocorrências fossem consideradas, e todas fossem de doentes ainda em recuperação, somariam no máximo 753 pessoas.
— Há vários fatores que podem levar a essas divergências. Muitas prefeituras demoram a encerrar corretamente o processo de notificação. Nesse caso, quando a notificação é feita, a pessoa pode já ser considerada curada. Também pode variar o critério pelo qual cada município contabiliza os seus casos ativos — afirma o coordenador do Centro de Operações de Emergências da Vigilância em Saúde da SES, Marcelo Vallandro.
A SES utiliza como critério para determinar que um paciente está ativo quando faz menos de 14 dias desde o início dos sintomas — período de desenvolvimento da doença, já que seria inviável acompanhar um a um. Mas isso não leva em conta possíveis complicações que façam um paciente ficar internado por mais tempo, por exemplo.
Segundo a assessoria de comunicação da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) da Capital, o município monitora a evolução de cada doente ao cadastrá-lo e acompanhá-lo por meio de um sistema chamado Gercon. Em casos de variação nos critérios empregados, as divergências nas estatísticas podem ocorrer para mais ou para menos entre os níveis de governo.