Preocupado com a demora na entrega de respiradores encomendados pelo Grupo Hospitalar Conceição (GHC), o médico Márcio Pasa acionou, em março, dois técnicos em eletrônica de sua equipe. Pediu que Lúcio da Rosa e Marcelo Barbosa recuperassem uma remessa de equipamentos antigos que estavam armazenados em um depósito para serem doados para universidades.
Rosa e Barbosa se enfurnaram durante semanas em uma sala do segundo andar do Hospital Cristo Redentor, que foi transformada em uma oficina de respiradores. Em dois meses, recuperaram 12 dos 14 aparelhos da década de 1990 que seriam descartados e que, agora, podem salvar vidas de pacientes de covid-19.
— A ideia foi minha, mas, a execução, toda deles. São doutores de eletrônicos — diz Pasa, que é gerente de internação do Cristo Redentor.
Fundamentais no tratamento de doentes graves de coronavírus, os itens reparados passaram a equipar parte dos 18 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) destinados à pandemia no Cristo Redentor. Por enquanto, as camas estão desocupadas, funcionando como uma retaguarda caso os contaminados lotem o Hospital Conceição.
A um quilômetro do Cristo Redentor, o Conceição, que também pertence ao GHC, é um dos hospitais referência no tratamento de covid-19 em Porto Alegre. Nesta segunda-feira (25), 20 dos 29 leitos disponíveis para coronavírus na instituição estavam ocupados – 13 por pacientes suspeitos de infecção pela doença e sete por casos confirmados. Pelos cálculos de Pasa, o Cristo Redentor deve ser requisitado a partir do final de junho, quando a pandemia pode se alastrar pelo Estado, influenciada pelo clima frio.
Quando vi que o mundo inteiro estava em busca de respiradores, eu disse: 'Vamos consertar os que temos'. Não adianta, não há respiradores suficientes no mundo para a compra, mesmo se você tiver muito dinheiro disponível. É impossível fabricar tantos em tão pouco tempo
MÁRCIO PASA
Gerente de internação do Hospital Cristo Redentor
O GHC, vinculado ao Ministério da Saúde, comprou, para o atendimento de pacientes de covid-19, 36 respiradores da marca Philips, por valores entre R$ 49 mil e R$ 168 mil a unidade. No total, o investimento foi de R$ 2,8 milhões. Mas, devido ao incremento da demanda internacional pelo equipamento e a consequente escassez do item no mercado, apenas 17 foram entregues, até o momento.
— Quando vi que o mundo inteiro estava em busca de respiradores, eu disse: "Vamos consertar os que temos". Não adianta, não há respiradores suficientes no mundo para a compra, mesmo se você tiver muito dinheiro disponível. É impossível fabricar tantos em tão pouco tempo — comenta Pasa.
Na maioria dos casos, os técnicos tiveram de remendar a chamada parte pneumática do aparelho, responsável pelo processo de ventilação dos gases. Trata-se de um trabalho essencial, uma vez que o equipamento simula o trabalho dos pulmões, ajudando os pacientes a respirarem quando eles não conseguem fazê-lo sozinhos.
— O pessoal fala em médicos e enfermeiros, mas tem toda uma turma por trás, que também está na linha de frente da pandemia — diz Rosa.
Em uma oficina semelhante localizada no Conceição, técnicos em eletrônica também atuam no conserto e na manutenção das máquinas em ritmo acelerado. Uma equipe de 17 trabalhadores se debruçou sobre 85 respiradores desde que o coronavírus desembarcou na Capital – em tempos pré-pandêmicos, o normal seria o "atendimento" a 40 ventiladores.
— São aparelhos bem antigos, muitos estavam com tubinhos secos, que tendem a rasgar. Às vezes, pegamos a peça de um e juntamos em outro, para conseguir liberar o mais rápido — relata um dos técnicos, Lucas Viegas.
Instalado em um setor nos fundos do hospital, o grupo ainda restaurou 10 equipamentos transferidos do Hospital Parque Belém, em Porto Alegre, que estavam inativos e, portanto, precisavam de reparos antes de serem usados para transportar oxigênio para os pulmões de doentes.
— Em tudo o que conseguimos resolver aqui dentro, com a nossa equipe, ganhamos tempo e reduzimos custos. O hospital é uma engrenagem que precisa dessa parte de manutenção para funcionar bem — afirma Juliano Kafer, coordenação de manutenção do GHC.