O registro de mortes e de internações por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) disparou no Rio Grande do Sul, neste ano, em um patamar muito superior ao de casos confirmados de covid-19.
Dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES) indicam que os óbitos provocados por problemas no sistema respiratório cresceram 602% e saltaram de 37 no ano passado para 260 neste ano, até 18 de abril. Oficialmente, a covid-19 respondia até aquele momento por 25 dessas ocorrências, o equivalente a 9,6%. A SES atribui a explosão na quantidade de mortes ligadas à SRAG a um maior nível de notificação das síndromes respiratórias em geral em razão do alerta provocado pela pandemia na rede de atendimento e descarta a possibilidade de que a diferença corresponda a uma subnotificação de coronavírus.
Excluídos os óbitos provocados de forma comprovada pela covid-19, restam 235 vítimas a mais em 2020 em relação ao ano passado. Uma das hipóteses para explicar essa diferença poderia ser um avanço maior do que o divulgado oficialmente nos casos de covid-19 no Estado, mas a SES descarta o risco de uma subnotificação tão grande. Por meio de nota, a secretaria informou que trabalha com duas hipóteses: aumento na "sensibilidade" das notificações e um crescimento conjunto na circulação de outros vírus como o Influenza.
Diz o texto da SES: "Situações de surtos e pandemias como essa têm por característica o aumento na percepção das suspeitas dessas doenças na rede de saúde. Como o assunto ganha uma maior visibilidade, os profissionais ficam mais atentos para a identificação de possíveis casos, que em outros momentos não receberiam essa classificação".
Um dado concreto ajuda a sustentar essa interpretação: das 260 mortes tabuladas até meados de abril, 223 tiveram exame descartado para coronavírus, e apenas 12 seguiam em análise até a publicação do boletim referente à 16ª semana epidemiológica. Pelo dado oficial, portanto, não haveria margem para uma subnotificação significativa.
Outra hipótese, de maior incidência de outros vírus também responsáveis por síndromes respiratórias agudas, ainda faltam evidências mais claras. Em razão da emergência de saúde pública provocada pela pandemia, segundo a SES, foram "momentaneamente represadas" as investigações para outros vírus que podem causar o mesmo quadro clínico (como Influenza A e B, parainfluenza ou sincial respiratório).
O infectologista do Hospital de Clínicas Luciano Goldani avalia que seria pouco provável ocorrer uma subnotificação tão grande de covid-19 no Estado.
— Acho difícil não estarem fazendo os exames para detectar o coronavírus (entre as ocorrências de óbito). O que pode estar havendo é uma maior notificação de todos os casos de SRAG e uma maior circulação dos outros vírus, mas faltam dados mais detalhados até o momento para comprovar essa possibilidade — analisa Goldani.
Outra hipótese seria os exames não estarem detectando adequadamente a presença do coronavírus. O mais recente boletim epidemiológico informa que novos testes foram realizados em uma amostra de mortos que testaram negativo para a covid-19 para verificar possível erro. O relatório indica que os resultados iniciais foram confirmados. A SES ainda não dispõe dos números consolidados sobre mortalidade em geral no Estado para permitir comparações envolvendo o período de incidência do novo vírus.
Número de hospitalizações cresceu oito vezes
Não foram apenas as notificações de mortes por Síndromes Respiratórias Agudas Graves (SRAG) que explodiram no Rio Grande do Sul. O número de hospitalizações em razão desse tipo de problema também cresceu vertiginosamente: os dados oficiais indicam aumento de oito vezes nas internações, que passaram de 311 no ano passado para 2.542 de janeiro a 18 de abril. Desse universo, 300 casos tiveram exame positivo para covid-19.
Da mesma forma que as ocorrências envolvendo as mortes por SRAG, ainda não há como afirmar com certeza em que grau houve um aumento real na quantidade de internados com dificuldade para respirar ou se, além das novas ocorrências por coronavírus, houve apenas uma maior formalização no registro dessas pessoas como pacientes de SRAG.
Das três centenas de internações oficialmente vinculadas à pandemia, 42% dos doentes haviam recebido alta, 50% ainda estavam em internação e 8% morreram. Quando se contabilizam apenas as 94 pessoas que precisaram ser socorridas em UTIs, 22% haviam morrido até aquele momento. Outras 17% tiveram alta, e 61% não tinham ainda sua situação alterada nos registros da Secretaria Estadual da Saúde.
Santa Catarina registra um cenário bastante semelhante ao gaúcho em relação aos casos de morte ou internação por SRAG. No Estado vizinho, a secretaria estadual contabilizou um salto de 605% no número de mortes por SRAG e de 552% nas internações pela mesma razão. O governo catarinense também alegou que poderia estar havendo uma maior "sensibilização" dos profissionais da saúde para fazer as notificações, além de uma maior procura dos doentes por atendimento hospitalar.
Observação
Os dados dizem respeito às primeiras 16 semanas epidemiológicas de cada ano. As semanas epidemiológicas são uma convenção internacional para monitorar o avanço de doenças por períodos de sete dias que começam sempre em um domingo e terminam em um sábado. Por isso, o início ou o término nem sempre coincidem com um mesmo dia do mês em diferentes anos. Em 2019, por exemplo, a 16ª semana epidemiológica terminou em 20 de abril. Neste ano, dia 18 de abril.