O juiz Hong Kou Hen, da Justiça Federal de São Paulo, suspendeu na terça-feira (17) trechos de uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que permitia que as gestantes brasileiras fossem obrigadas a passar por intervenções médicas com as quais não concordassem. A ação pública é autoria do Ministério Público Federal (MPF).
A Resolução 2.232/2019 do CFM, publicada em setembro, determinava que o médico não deve aceitar que o paciente recuse a intervenção sugerida quando essa recusa caracterizar "abuso de direito". Apontava, então, que a "recusa terapêutica manifestada por gestante deve ser analisada na perspectiva do binômio mãe/feto, podendo o ato de vontade da mãe caracterizar abuso de direito dela em relação ao feto".
Na denúncia, o MPF defende os artigos da norma, da forma como estão redigidos, permitem que o médico não aceite a recusa da gestante em se submeter a determinadas intervenções e que o profissional adote medidas para coagir a paciente a receber tratamentos que não deseja, inclusive com a possibilidade de internações compulsórias ilegais.
Em sua decisão, o magistrado informou não ter encontrado "nenhum permissivo legal" que ampare esse trecho da resolução, e que a norma, "mesmo que indiretamente, resulta na ilegal restrição da liberdade de escolha terapêutica da gestante em relação ao parto". O juiz pontua, ainda, que o termo "abuso de direito" torna amplo o rol de situações nas quais o médico pode obrigar a gestante a passar por uma intervenção, já que não limita a imposição a situações de risco à vida dela própria ou do feto.
Kou Hen destaca, na sentença, que "a liberdade de escolha terapêutica conta com expressa proteção legal" e é violada pela resolução do CFM, que inclui entre as possibilidade de prevalência da escolha de intervenção do médico em situações que não se caracterizam como de risco à saúde ou à vida. O magistrado suspendeu parcialmente a eficácia da norma e determinou "ampla divulgação" da decisão à classe médica e publicação da informação na página oficial do conselho federal e dos regionais, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.