Uma pesquisa feita pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) a pedido da prefeitura de Santa Maria e do governo do Estado aponta, mais uma vez, a água como possível causa do surto de toxoplasmose no município. A análise foi feita durante seis semanas em 10 porcos que ingeriram água esterilizada ou amostras coletadas em caixas d’água de residências e em reservatórios da rede de abastecimento de Santa Maria.
Da amostragem verificada, dois animais ingeriram água esterilizada por autoclave — que elimina qualquer possibilidade de contaminação. O restante tomou amostras coletadas por técnicos do município e do Estado em residências de diferentes bairros de Santa Maria e também nos reservatórios da Corsan. Os oito suínos que receberam as amostras tanto de residências quanto dos reservatórios apresentaram anticorpos positivos para a doença. Ainda assim, explica a professora do Laboratório de Doenças Parasitárias da UFSM Fernanda Silveira Flores, responsável pela pesquisa, ainda é cedo para uma resposta definitiva:
— Esses dados são parciais. Ou seja, ainda não temos conclusão de nada. O que podemos garantir é que os animais que beberam essas águas (das caixas d'água individuais e dos reservatórios) se tornaram anticorpo positivo, que indica que eles se infectaram. A conclusão que temos reforça a água como possível fonte de infecção para qualquer indivíduo. Contudo, não podemos dizer que foi a causa do surto porque ainda não investigamos. Falta toda a genotipagem do toxoplasma, para saber se é o mesmo do surto.
Agora, em um prazo de cerca de 40 dias, conforme a pesquisadora, será feita a análise do DNA do toxoplasma, que poderá indicar se há relação ou não com o surto da doença no município.
— Não tenho a garantia de que vou isolar o toxoplasma. Pode ser que os resultados acabem no que temos agora. Ou seja, que os animais se infectaram e não se consiga identificar muito mais do que isso. Assim como eu também posso fazer o isolamento desse toxoplasma, a caracterização molecular. Se eu achar o toxoplasma igual ao do surto, aí, teremos um indicativo a mais que reafirma que a água é a fonte de infecção — projeta.
O diretor de Operações da Corsan, Eduardo Carvalho, disse a GaúchaZH, na manhã desta quarta-feira (10), que a companhia soube recentemente da pesquisa e que já solicitou mais detalhamentos à universidade sobre a forma como foram feitas as análises. Carvalho afirma ainda que, no mesmo período em que foi realizada a limpeza dos 29 reservatórios de água do município, foram coletadas amostras que foram enviadas para análise na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Segundo ele, as amostras tiveram resultado negativo para a presença do toxoplasma gondii:
— Não participamos, mas soubemos que esses estudos estão utilizando de águas da Corsan coletadas durante as manutenções e limpezas que fizemos. Amostras dessas mesmas águas também foram enviadas para o laboratório da UEL, e todas tiveram resultado negativo para presença do toxoplasma gondii. Agora, sobre a qualidade da água dos reservatórios individuais, dos filtros das casas, a Corsan não pode se posicionar.
Posições
A prefeitura de Santa Maria informou, por meio de nota, que a pesquisa teve “acompanhamento dos servidores de Vigilância em Saúde do município e que os resultados ainda não são conclusivos nem definitivos”. A administração também destaca que "por contaminação pela água" deve-se entender que essa é a natureza do protozoário encontrado, uma vez que ainda há variáveis a serem consideradas, tais como a forma de abastecimento e armazenamento da água.
A Secretaria Estadual de Saúde informou que a pesquisa realizada pela UFSM “não chega a trazer uma novidade sobre o assunto, pois a Secretaria Estadual já vinha trabalhando com foco na questão da água como a possível causa do surto na cidade, mesmo que a investigação não tenha identificado a fonte do agravo”.
Já o Ministério da Saúde informou que não tem conhecimento do referido estudo e que "é imprescindível ter acesso detalhado à metodologia e resultados da pesquisa para que possamos ter alguma posição acerca do seu significado e potenciais consequências para as ações de prevenção e controle já recomendadas."
As medidas de prevenção à doença, como tomar apenas água mineral ou fervida, lavar bem os alimentos e realizar periodicamente a limpeza das caixas d'água das residências, devem ser mantidas.
Investigações
Em uma coletiva de imprensa em 26 de junho em Santa Maria, o Ministério da Saúde já havia apontado a água e as hortaliças como possíveis fontes de contaminação.
No dia 6 de julho, Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público Estadual, Secretaria Municipal de Saúde e infectologistas de Santa Maria anunciaram que o laboratório da Universidade Estadual de Londrina, no Paraná, confirmou a presença do protozoário Toxoplasma gondii em uma das amostras enviadas para análise. Contudo, até hoje, ainda não foi confirmado que a amostra tem relação com o surto da toxoplasmose na cidade, já que não foi comprovada a relação genética entre o protozoário e os pacientes diagnosticados.
Casos
Santa Maria já contabiliza 777 casos de toxoplasmose. Destes, 105 casos envolvem gestantes — 10 causaram abortos, três levaram os fetos à morte e 20 são de toxoplasmose congênita, aquela que aparece em bebês entre 25 dias e 61 dias após o nascimento.