Pesquisadores transformaram células de tecido em células da pele para ajudar a curar ferimentos graves, uma técnica que pode revolucionar o atendimento a vítimas de queimaduras. A pesquisa chega após uma década de trabalho e é promissora para uma variedade de pacientes, incluindo os que têm queimaduras graves ou pacientes idosos com escaras e outras lesões recorrentes.
O estudo, publicado na revista Nature, envolve uma tecnologia chamada "reprogramação celular", na qual genes são inseridos em células para fazê-las mudar de forma.
— Esta é a primeira descrição da reprogramação de células de tecido para células de pele. Estou muito animado com os resultados — disse o autor do trabalho, Masakazu Kurita.
Kurita, cirurgião plástico e professor da Universidade de Tóquio, começou a trabalhar na técnica há 10 anos. Tem sido um processo trabalhoso e meticuloso desde então. A primeira etapa envolveu a identificação de genes presentes nas células da pele, mas não nas células dos tecidos, que poderiam ser isolados e depois inseridos nas células de tecido para transformá-las.
— Nós escolhemos cerca de 80 genes candidatos em células da pele, então tentamos combinações — explica Kurita.
Seu grande avanço veio em 2014, quando reprogramou com sucesso as células de tecido em células da pele em laboratório usando uma combinação de 28 genes. Em 2015, mudou-se para o Instituto Salk de Estudos Biológicos, na Califórnia, para colaborar com uma equipe de especialistas de todo o mundo.
Ele e seus colegas realizaram cerca de 2 mil testes com diferentes combinações de genes, procurando a maneira mais eficiente de transformar as células. Eventualmente, encontraram uma combinação de quatro genes e começaram a testá-la em feridas em camundongos.
Eles selaram as feridas da pele ao redor para replicar as condições difíceis no centro de uma grande queimadura ou lesão semelhante, sem pele adjacente para promover a cicatrização. Usando a tecnologia, juntamente com os tratamentos com drogas existentes, eles conseguiram curar uma lesão com um centímetro de diâmetro em cerca de duas semanas.
"Um caminho para sobreviver"
— Nossos dados sugerem a viabilidade de uma terapia completamente nova que poderia ser usada para o fechamento de feridas de várias causas — disse Kurita.
A aplicação mais óbvia seria em queimaduras graves que cobrem grandes partes do corpo, que geralmente são tratadas com enxertos de pele, acrescentou:
— Quando as áreas envolvidas em queimaduras são extremamente amplas e nenhuma pele está disponível para os pacientes, ninguém pode oferecer ao paciente uma maneira de sobreviver... nossa técnica poderia oferecer um caminho.
Quando as áreas envolvidas em queimaduras são extremamente amplas e nenhuma pele está disponível para os pacientes, ninguém pode oferecer ao paciente uma maneira de sobreviver... nossa técnica poderia oferecer um caminho.
MASAKAZU KURITA
Autor do estudo
Mas Kurita observou que a pesquisa ainda está longe de estar disponível para os pacientes, e que talvez mais uma década de trabalho seja necessária antes disso. Ele espera que haja uma pesquisa sobre melhores maneiras de fornecer a combinação de quatro genes que transformam o tecido em pele.
Para o estudo, os pesquisadores empregaram um vírus que foi usado em outro trabalho, transformando células como o sistema de entrega para a combinação de quatro genes. Mas pesquisas futuras poderiam desenvolver um sistema de entrega potencialmente mais eficiente, projetado especificamente para sua técnica. Segundo Kurita, mais trabalho poderia ser feito sobre os tipos de drogas usadas para ajudar na cura.
Este estudo usou combinações de drogas existentes, mas "se pudéssemos fazer outras combinações, outras drogas, tudo seria otimizado exclusivamente para o nosso propósito".
— Provavelmente, a eficiência poderia ser muito melhor e encurtar o período de tempo para a cura.
Existem também riscos a serem considerados. O estudo monitorou as recém-transformadas células da pele em ratos por oito meses e descobriu que elas permaneceram intactas em sua nova forma durante todo esse período. Mas um monitoramento mais longo seria necessário para garantir que a transformação seja permanente. Além disso, qualquer processo de transformação de células com genes acarreta o risco de mutações, incluindo a formação de câncer.
— Não encontramos nenhum desses sinais até agora, mas isso foi no curto prazo — disse Kurita. — Para o futuro, temos que trabalhar com a maior cautela para eliminar esse tipo de efeitos colaterais.