– Parecia que eu estava ganhando o ouro olímpico em uma modalidade que o Brasil não tinha muita tradição.
Foi com essa comparação que Christian Kieling, professor do Departamento de Psiquiatria da UFRGS, definiu o sentimento de ficar em primeiro lugar em uma disputa promovida pela MQ, organização britânica que promove pesquisas em saúde mental. Com o pódio, ele e o grupo de mais seis pesquisadores receberam 1 milhão de libras – equivalente a mais de R$ 4,3 milhões – para desenvolver um estudo que busca identificar adolescentes que têm risco de ter depressão, e deixaram para trás nomes das respeitadas Harvard, Cambrige e Yale.
A ideia surgiu durante o evento da MQ que ocorreu em março deste ano em um hotel na região metropolitana de Londres. Kieling, que também é coordenador do Programa de Depressão na Infância e Adolescência do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, passou pela primeira seleção e viajou para a capital do Reino Unido, onde integrou um seleto grupo de 30 pesquisadores. Confinados por três dias no hotel, em uma espécie de reality show acadêmico, eles assistiram palestras e foram instigados montar grupos para desenvolver uma pesquisa.
– No jantar, sentei ao lado da Valeria Mondelli, do King's College, de Londres. Trocamos uma ideia e falei de um projeto que já tinha iniciado aqui em parceria com a Universidade Federal de Pelotas que tem como objetivo identificar quem vai ter depressão no fim da adolescência. Disse que, a partir dos resultados, planejávamos uma segunda fase em Porto Alegre, mas com uma verba pequena do CNPQ – relembra.
Depois, conversando com outros especialistas, o professor e seu grupo desenvolveram o esboço do plano final. Para surpresa do pesquisador, que iniciou a pesquisa em depressão há pouco tempo, o projeto foi contemplado com o valor milionário.
Ao lado de mais seis pesquisadores, Kieling começa, em abril de 2018, a coletar dados de adolescentes de escolas públicas de Porto Alegre. A intenção é recrutar 35 pessoas com alta predisposição a depressão, 35 com baixo risco e outras 35 que já tenham a doença.
– Queremos ver quem são os indivíduos que, apesar de estressores ambientais, têm uma resiliência maior para indicar os fatores que os protegem. Com essa identificação, vamos ajudar os vulneráveis.
Também serão usados dados já coletados de pesquisas feitas na Nigéria, Nepal e Reino Unido. Para chegar aos resultados, o grupo vai lançar mão de avaliações clínicas e de neuroimagem, coleta de material biológico e análise de fatores inflamatórios e outros marcadores que podem se relacionar à doença.
Os pesquisadores entregaram o projeto final na última semana e fazem a primeira reunião em março de 2018. A verba estará disponível para utilização em dois anos.